quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Histórias de Vida IV


Entrevista com o Sr. Osmar Müller
Realizada pelo autor e por Luiz Teixeira em 13-05-2006
Referência: Antiga Subprefeitura do Capão do Leão

            “Informado do projeto de intervenção no prédio da antiga subprefeitura, o Sr. Osmar informa que com a emancipação os documentos daquela repartição pública foram transferidos ao Arquivo Público Municipal de Pelotas.
            Iniciada a entrevista, o Sr. Osmar relata que veio para Capão do Leão em 1954, tendo trabalhado 15 anos e quatro meses na Usina Elétrica do distrito. Narra que o fornecimento de energia, na época, ia das 18hs às 24hs. Em dias de baile nos salões, a energia era mantida a noite toda. Relata também que sempre duas pessoas trabalhavam na Usina Elétrica, tendo ele permanecido sempre nesta função. Outro funcionário que durante certa época trabalhou ali foi o Sr. Ataíde Moura. O Sr. Osmar reconhece que é uma pessoa que não teve oportunidade de ir à escola, pois morava no Passo do Descanso (zona rural). Por isso, aprendeu a ler com jornais que vinham para a Usina Elétrica.
            Indagado sobre o entorno do prédio da antiga subprefeitura, o Sr. Osmar responde que havia um galpão grande onde cabiam uma caçamba, um jipe e uma ambulância. Havia também um galpão menor, tipo ‘uma casinha’, construído pelo Sr. Hugo Albuquerque. Outra informação é a existência de uma caixa-d’água que trazia água potável da Pedreira Municipal. Sobre o Sr. Hugo Albuquerque, também há a informação de que este foi morador da casa antes do Sr. Osmar Müller. O Sr. Osmar foi morar na casa em 1974, a convite do subprefeito Rui Victória. O Sr. Osmar e família permaneceram ali até 1983. Trabalhava como motorista da ambulância e afirma que não tinha problema algum com qualquer tipo de serviço, por esta razão, executando também outras coisas.
            Fala, adiante, que trabalhou com o Sr. João Viegas, subprefeito. Enumera, a seguir, os subprefeitos com quem trabalhou a partir de 1954: Vílson Castro, Poty Reis, Vasconcelos (inspetor de polícia em Pelotas), Armando Brião, Cabo Jardim, Brião (de novo), Osmar Pereira Alves e João Viegas. Quanto ao que tinha a subprefeitura, o Sr. Osmar observa que além da caçamba e do jipe, havia uma máquina de debulhar, um ‘tratorzinho’, uma turma para manutenção de estradas bem como escavação de cascalho.
            Voltando a Usina Elétrica, chega-se a informação de que esta era uma extensão da subprefeitura. Outro aspecto importante lembrado é o fato do cargo de subprefeito estar vinculado ao cargo de subdelegado. ‘Cargos juntos’ – como comenta o Sr. Osmar. Ele exemplifica o caso do Sr. João Viegas.
            Perguntamos, então, sobre os prédios da Rua Professor Agostinho. Ele define a fábrica de café como um ‘fabriqueta’. O dono da fábrica era um Traverssi e a marca produzida era o Café Índio. Explicitou também o funcionamento do Cinema Guarani, relatando que, além das exibições cinematográficas, ocorriam também bailes. Exalta o cine: ‘era um cinema muito lindo, havia arquibancadas altas, camarotes com cadeiras... Nós assistíamos filmes do Mazzaropi, Gordo e Magro, Noivo da Girafa’. Inquirido sobre o teatro, ele resume que ‘não é do seu tempo’. Isto é, não tem lembranças de seu funcionamento.
            Passando à questão dos funcionários da subprefeitura, o Sr. Osmar coloca que se fazia troça sobre ‘os amanuenses do subprefeito’. Cita, contudo, alguns:
- Leopoldo Martins da Luz, pai do Jadir, do Frio. Aquele era escriturário, bem antigo na repartição;
- Júlio Emílio Knopp, ‘velho alemão de Pelotas’. Escriturário também destacava notas, cuidava de empréstimos de sementes e implementos agrícolas;
- Hugo Albuquerque, também escriturário;
- Paulo Ribeiro, motorista;
- Selmar Ribeiro, motorista;
- João Luís Villar, motorista.
Este último dividiu a casa quando o Sr. Osmar habitou o prédio da antiga subprefeitura, digo, habitou conjuntamente. O Sr. Osmar relata o telefone no ‘meio da porta’ que dividia seus aposentos com os do Sr. João Luís Villar. ‘Telefone antigo, de manivela’ – completa. O telefone servia para os dois.
Sobre a cena política do Capão do Leão naquela época, o Sr. Osmar recordou que não era muito comum a visita de políticos no distrito. Quando apareciam, ofereciam ‘churrasco e cervejada’ para o povo. Lembra-se de comícios assim no ‘passinho’ que sai do Cerro das Almas. Depois, vieram a realizar os comícios em salões, no mesmo estilo.
Averiguamos também sobre a disposição das salas internas do prédio da antiga subprefeitura. O Sr. Osmar rememora que o gabinete do subprefeito ficava na sala à direita, logo após a entrada. Na sala da entrada, funcionava uma espécie de recepção – ‘salão grande’ – com um balcão que abarcava todo o comprimento da peça e que servia para delimitar as áreas de serviço e pública. Havia divisórias de madeira na casa, além das paredes de concreto. Várias mesas e escrivaninhas também. A cozinha na peça dos fundos.
Os subprefeitos, ao que parece, andavam muito em Pelotas, para pedir providências e recursos.
Dona Alvina, sua esposa, neste momento, interveio e narrou que quando moravam na casa, criavam perus, marrecos e galinhas em razão da proximidade do açude.
Com certo ressentimento, o Sr. Osmar conta como foi retirado da casa, em 1983. Foi informado pelo prefeito da época, Elberto Madruga, num memorando que lhe dava trinta dias para deixar aquele local. Reclama que sempre votara em Madruga quando este fora candidato a vereador de Pelotas.
Outro dado: informa que o almoxarifado ficava ao lado do banheiro. Além deste ponto, diz que o galpão grande ficava na entrada, ou próximo da entrada da Ivaí (firma existente hoje ao lado da área). Indagado sobre tal, comenta que o entorno da casa era ajardinado, repleto de canteiros, fechado por tela, com ‘estradinha para entrar’. ‘Lugar muito bonito!’ Relata, a seguir, que o Sr. Hugo Albuquerque fez uma chácara nos arredores, com pessegueiros, laranjeiras, etc. Plantou-se acácias também, que foram, posteriormente, cortadas para fazer lenha. Adiciona que já naquela época as pessoas já se admiravam com o prédio e sua resistência ao tempo. (Creio se tratar décadas de 1960 e 1970, NOTA PESSOAL). Havia reformas regulares no madeiramento, pois o telhado, por vezes, abaixava e surgiam goteiras. Diz que as telhas eram goivas, antigas. Aspecto interessante por ele observado é que, quando foi trabalhar na casa, recorda-se que o madeiramento do telhado era composto de uma madeira ‘falquejada a machado’. Sobre o muro frontal, não confirma que fosse abalaustrado e sim inteiriço.        
Já no momento em que nos encaminhávamos para a conclusão. Abordamos o ‘centro’ do Capão do Leão na época do Sr. Osmar Müller. Ele foi contundente: ‘bem pobrezinho, não tinha muita coisa!’ De importante ele ressaltou o salão do Manoel Selmo (que depois se tornou o restaurante do Sr. Seriaco Cantarelli). Sobre este, o define como ‘homem de bem’, trabalhador e rico. O pai de Manoel Selmo seria um exemplo: ‘homem velho trabalhador’.
O trânsito para Pedro Osório, Jaguarão e Herval passava pelo Capão do Leão, no curso da avenida (atual) Narciso Silva. O Passo do Capão do Leão era uma espécie de ‘motel natural’ dos jovens. Era um lugar pacífico, o quarto distrito, sem greves e sem agitações políticas ou sociais.
Sobre as casas da Rua Professor Agostinho (a rua tinha esta denominação desde aquela época) indica que eram propriedades do Sr. Nélson Traverssi, irmão do dono do Café Índio. Este Sr. Nélson era dono do Britador na beira dos trilhos, tinha ‘firma forte’, também era parente do Manoel Selmo. Ao que indicou-nos, as casas da Rua Professor Agostinho eram moradas dos empregados do Sr. Nélson, que cobrava aluguel mesmo assim. Relata que em 1954, as ‘casinhas pareciam ainda novas’. Com informações dispersas, encerra que os Traverssi foram ricos e importantes, chegando a levarem dois caminhões ‘cheios de gente’ para o Cerro das Almas. Manoel dos Santos também trabalhou com os Traverssi.
Observações: no local da atual pista de rodeios do CTG Tropeiros do Sul havia um arvoredo. Árvores antigas, segundo o Sr. Osmar: ‘orelhas de negro’ com quatro a cinco metros de largura de tronco. O Sr. Osmar argumenta que estas árvores apodreceram em razão das explosões que ocorriam nas pedreiras. Outro dado: no prédio, ao lado do banheiro, havia um almoxarifado e no banheiro havia uma banheira antiga.”

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