segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Barão de Arroio Grande


Trecho extraído de: KREMER, Azambuja. Benfeitores de Pelotas. IN: ETCHEVERRY, José Vieira. Coleção "Cadernos de Pelotas". Pelotas, 1996, número 26, edição datilografada, p. 62-64.

"FRANCISCO ANTUNES GOMES DA COSTA
Barão de Arroio Grande

Francisco Antunes Gomes da Costa nasceu na cidade de Pelotas, a 8 de junho de 1838. Era filho único do consórcio de Matheus Gomes Vianna com dona Maria Francisca Antunes Maciel, ambos membros de tradicionais famílias pelotenses.

Seu pai, o major Matheus Gomes Vianna, descendia de uma das mais primitivas famílias que se salientaram na fundação de Pelotas, pois era filho do tenente Balthazar Gomes Vianna e de dona Joanna Margarida da Silveira, última filha nascida do casal capitão-mór Francisco Pires Casado e dona Mariana Eufrásia da Silveira, matrimoniados aí pelo ano de 1750. A família Silveira aportou ao Rio Grande do Sul com os primeiros casais portugueses que vieram estabelecer-se neste território, no princípio do século XVIII.

Francisco, desde jovem, revelou decidido pendor para as letras e pela política, filiando-se ao Partido Liberal, que o elegeu, ainda nos alvores da mocidade, deputado da Província, cargo que voltou a exercer na situação inaugurada com a ascensão do gabinete Sinimbu, em 1878.

No desempenho desses mandatos políticos, pugnou, sempre, ardorosamente, em prol de melhoramentos importantes para esta sua estremecida cidade natal, notadamente pela 'desobstrução dos canais do São Gonçalo e da Seitia'.

Com natural inclinação e gosto pela cultura literária, já aos 17 anos de idade, coligiu em um álbum algumas de suas juvenis produções, para, carinhosamente, oferecê-las à sua veneranda mãe, precedendo-as de sentimental dedicatória, dedicatória esta que torna-se parte integrante (com méritos) do presente trabalho. Ei-la:

Mãe querida do meu coração - Desde que a razão aclarou o meu espírito, desde que o raciocínio me fez compreender algumas dessas cenas que se passam nos quadros da vida e me ensinou a avaliar quanto vos devo como filho, um desejo ardente e nobre tomou vulto em meu peito: fazer vossa felicidade por meio da minha conduta. Eis o que sempre almejei, e o quanto ambiciono.

Aos onze meses de idade meu Pai perdi, feliz idade que, toda inocência, me não deixaste avaliar quanto era grande e imensa a perda que sofrera!

Amamentado por vós desde os meus primeiros dias, me ensinastes a amar a virtude e a aborrecer os vícios, e mil e mil vezes vós me dissestes que exercendo aquele teria de atravessar um caminho de espinhos, para no fim receber uma coroa de glórias, e que entregando-me a estes, atravessaria um caminho de flores, mas encontraria ao seu termo o opróbrio e a vergonha. E vossas palavras ficaram gravadas no meu coração como sagrada relíquia.

Nosso distinto biografado, aos 19 anos, fundou e redigiu de parceria com Torres Crehuet, Machado Filho e outros o jornal, melhormente, o mensário de literatura, que se publicou nesta cidade, de 1857 e 1858, sob o título 'ARARIBÁ'.

No artigo 'programa' estampado no primeiro número, de 1o. de dezembro de 1857, diziam os seus redatores:

'Movido pelo sacro amor das letras, que quiséramos ver difundidas no nosso belo país, de maneira a fazê-lo chegar a altura das nações mais cultas e civilizadas, encetamos hoje a publicação do Araribá, modesto tributo que oferecemos nas aras da Pátria e do Progresso'.

'Redigido por noveis penas, não pode o Araribá ter o orgulho de por-se a par desses astros radiantes que iluminam o céu da literatura pátria, mas nem por isso deixa de aspirar a ter entre eles um modesto lugar, na esperança, talvez, que guiado na sua difícil carreira pela Deusa Minerva, um dia virá em que dado lhe seja cobrir-se com uma auréola de Glória'.

A 8 de abril de 1865, nosso biografado consorciou-se em Pelotas com sua prima-irmã Flora Felisbina Antunes Maciel, filha do coronel Aníbal Antunes Maciel, que aqui exercia sua atividade como fazendeiro e charqueador.

LIBERTADADE PARA ESCRAVOS - Posteriormente foi galardoado, por serviços políticos e patrióticos com a sua nomeação para o cargo de vice-presidente da Província, por ato de 15 de julho de 1879 e agraciado com o título de Barão de Arroio Grande, a 5 de julho de 1884, por haver concedido liberdade para 46 de seus escravos, quatro anos antes da Abolição da Escravatura. Esta foi, sem dúvida alguma, um de seus grandes feitos e que muito contribuiu para torná-lo uma grande pessoa humana, e também um dos destacados 'Benfeitores de Pelotas'.

O Barão de Arroio Grande em política foi sempre monarquista leal e convicto.

CHARQUEADOR - Como industrialista, explorou a criação de gados, em fazendas que possuía neste Estado e no Uruguai, porém a sua operosa e profícua atividade foi mais especial e diretamente consagrada à indústria de charqueada, a qual com afinco dedicou-se, dispensou-lhe, por longo tempo, permanente assistência pessoal. Na continuidade da exploração desta indústria, teve ele como sócios, alternadamente, os senhores Cipriano Rodrigues Barcellos, João Theodozio Gonçalves, Manoela Rafael Vieira da Cunha, João Antonio Neto, Pedro Luís da Rocha Osório, ao seu lado, iniciando-se este para o largo frutuoso de sua triunfal carreira, em dilatado tempo consagrada a importante industria rio-grandense (1876-1926).

O Barão de Arroio Grande sempre promoveu e elevou o prestígio e grandeza da estremecida gleba que lhe fora berço, e onde sempre viveu, tendo tomado parte saliente na organização e direção de diversas sociedades, companhias, instituições beneficentes locais, entre as quais a de Desobstrução da Foz do São Gonçalo. Carris Urbanos, Cia. Hidráulica Pelotense, Cia. de Seguros, Cia. Telefônica, Cia. Fiação e Tecidos, Santa Casa de Misericórdia, Asilo de Mendigos, Associação Comercial, Clube Comercial e Banco Pelotense.

SANTA CASA - De vários desses institutos foi prestimoso presidente, porém, nos que mais relevantes e assinalados serviços lhe coube prestar a comunhão social, contam-se a Santa Casa de Misericórdia, sendo dela escrivão e posteriormente provedor, durante cerca de dez anos, e foi agraciado como seu grande benfeitor; e o Banco Pelotense, em cuja organização sua atuação eficiente culminou como um de seus mais influentes fundadores e como abalizado membro de suas primeiras direções.

Na vida doméstica, foi o bem definido paradigma do gênio verdadeiramente patriarcal, com constante e nobre abnegação, consagrado ao lar-templo augusto onde soube exercer seu superior apostolado, animado sempre de indefectível dedicação, quer como chefe austero, previdente e solícito, quer como esposo amoroso e leal, quer como pai extremoso e tutelar.

PASSAMENTO - No mês e ano em que se comemorava entusiasticamente o Centenário da fundação de Pelotas (obra de João Simões Lopes Neto), em um lar na cidade de Pelotas desenrolava-se um cenário de muitos lágrimas e de momentos dolorosos. O Barão de Arroio Grande tinha falecido, tendo esta grande perda para Pelotas ocorrido no dia 13 de julho de 1912, encerrando-se o luminoso ciclo de sua edificante vida objetiva, confortada pela carinhosa assistência da desvelada esposa, a veneranda Baronesa de Arroio Grande, que sobreviveu-lhe por alguns anos.

O Barão do Arroio Grande participou dos grandes investimentos em prol do progresso de nossa terra sem jamais deixar de participar e de ajudar financeiramente nossas entidades pias, e deu liberdade a seus escravos por livre e espontânea vontade, concedendo cartas de alforria, e o seu nome e também destacado como Benfeitor de Pelotas!"




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