sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Histórias do Pavão: Criação de Ovelhas


Trecho extraído de: PAZ, Martim. Gado de Corte (contos e artigos). Pelotas: Armazém Literário, 1995.

“Meia dúzia de borregos, ademais, nem tanto assim representa, mesmo quando raros feito esses ‘caras-negras’, nascidos de pais importados. Os mais antigos hão de se recordar do tempo em que eles eram comuns nas várzeas do São Gonçalo. Não peguei essa fase. Vim a conhecê-los faz apenas vinte ou trinta anos, durante uma viagem. Mas desde então decidi que ainda haveria de cria-los. Em 65, no Uruguai, um amigo que é, por sinal, dos mais entendedores, apartou para mim uma ponta de borregas, cedidas após muita resistência por um gringo macanudo de Mercedes, que soube há pouco, com pesar, que é falecido. Foi como comecei. Adquiri em seguida, na Inglaterra, um carneiro premiado e daí para a frente continuei a cuidar o plantel do qual, para minha satisfação, até para um graúdo de Brasília negociei borregos.
Ninguém sabe como será este ano a liquidação de lã nas cooperativas. Existe algum otimismo, mas os preços em realidade não acompanham a suba de insumo, e isso talvez apresse o incipiente interesse pelas raças de carne no Rio Grande. Ponho dúvidas, no entretanto, em que acabe por vingar entre nós o que se faz na Austrália ou na Argentina, onde não são usados reprodutores desse tipo nas ovelhas especializadas em lã, depois delas gastarem o dente e com vistas a um melhor cordeiro para abate, na última parição. Vários estão experimentando. Acho difícil, porém, que a prática se espalhe de um todo. As áreas ovelheiras do Estado seguramente continuarão vivendo do Corriedale e do Merino, do Romney e do Ideal. O ganho porventura resultante dos cruzamentos não sei, com franqueza, se compensará a quem produz lã em escala.
(...)
Os preços da arroba, queira Deus, terão melhora, e a não ser para enfeitar a volta das casas ou para oferecer algo de especial às visitas de cerimônia – quer dizer, para consumo – entendo que a difusão dos ovinos de corte nos referidos campos da fronteira tende a ser limitada. Seu futuro, para mim, está no resto do Estado e, mais ainda, no resto do País. (...)
Raras vezes cheguei a apreciar a carne dos meus Hampshires. Todos os machos, praticamente, ficavam inteiros. O gosto e a própria aparência dos cortes, no entanto, faziam enorme diferença”. (p. 54-56)

“Diz-se que o melhoramento de nossa criação realmente começou com o retorno dos maragatos exilados em 93, responsáveis pela vinda dos primeiros reprodutores das raças européias aperfeiçoadas. (...)
Hoje em dia, em verdade, já se parou de simplesmente copiar os exemplos do Prado (e os de Palermo). Distancia-se a era de Elorza, o Prata passa para segundo plano. O cabanheiro gaúcho, ‘descastelhanizado’, viaja atualmente o mundo inteiro atrás de touros, de carneiros e de novos métodos de trabalho, buscando o que haja de especial em qualquer parte. E se algum mal existe em tudo isso, reside ele, em meu modesto entender, no risco de apenas querer transferir o que se vê no Canadá e alhures, esquecendo por vezes, sob influência da moda, que precisamos agarrar rumos próprios, adaptando sempre que necessário aquilo que dá resultado nos países mais adiantados, de cuja experiência, aliás, não podemos prescindir”. (p. 56-57)

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