sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Histórias Curiosas LXII

O saudoso Barão de Itararé afirmava em sua acidez humorística que a televisão é "a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana". Talvez, com o passar dos anos, sua frase tenha perdido o sentido crítico que procurava despertar, visto que, atualmente, a internet (e principalmente os telefones celulares) suplantou o poder de influência e capacidade de concentração do ser humano que a televisão outrora possuiu. Todavia, não há como negar que, nas últimas três décadas do século XX, a televisão foi o instrumento de mídia mais amplo e eficaz no processo de influência da opinião pública. Isto se manifestou em desdobramentos da própria ficção televisiva na vida real das pessoas. Quem não lembra o sucesso das novelas globais nas décadas passadas. As pessoas já tinham aquele compromisso à noite: assistir novela. E muitas delas, de fato, marcaram época.

Eis um pequeno apanhado de algumas histórias curiosas envolvendo a televisão, que reproduzimos aqui em tom de nostalgia.

1 - O ano é 1986 e a novela global "Selva de Pedra" bombava, atraindo grande audiência. Um dos personagens de destaque da novela é "Miro", interpretado pelo ator Miguel Falabella. O personagem acaba morrendo na trama e, pelo menos, aqui em Capão do Leão, seu destino trágico é sentido. Tanto que, um conhecido morador dos nossos pagos, na época ainda adolescente, após ter assistido a cena na tv de casa, se dirige à mãe que fazia outra coisa e muito choroso, berrava estridente: "O Miro morreu, mãe! O Miro morreu!" Quem presenciou a inusitada reação, diz que o rapazote teve que ser acalmado com um chá de camomila, tamanha e sincera era a sua comoção.

2 - Havia no bairro Jardim América, município de Capão do Leão, pouquíssimas casas com televisão lá pelos idos de 1978. Entretanto, isso não impedia que o interesse em assistir televisão crescesse consideravelmente. As novelas da Globo e Tupi despertavam sempre uma certa audiência à noite. Pois bem, havia um conhecido comércio no lugar, em que se reunia um bom número de trabalhadores no fim de tarde/início da noite, que ali iam para beber uma pinga e conversar. Como no interior do comércio existia uma pequena televisão P & B e o vendeiro ficava com o estabelecimento aberto até um pouco mais tarde (observação nossa: pois é... os tempos eram outros), a peonada de um jeito ou outro acabava assistindo tv por tabela. E o interesse foi aumentando, a ponto de, no momento em que era exibida a novela global "O Astro", o salão do armazém praticamente silenciava, embora estivesse cheio. A novela foi rumando ao seu final e chega o dia do último capítulo. Um bando de homens, todos ansiosos, aguardam o desenrolar da trama na telinha. Nisso, um carroceiro, não muito simpático à tv, fazia na porta do estabelecimento uma algazarra, conversando com outras pessoas, sem se importar muito com o público vidrado ali dentro. Educadamente, dois "noveleiros" de plantão pedem ao carroceiro que diminuísse um pouco o falatório ou então que se retirasse para a parte externa do bar. O carroceiro ofendeu-se e passou a fazer mais barulho ainda, desconsiderando categoricamente os pedidos de moderação. Infeliz decisão do coitado. Foi posto para fora a chutes e safanões, tão rapidamente a ponto do pessoal ainda se reunir de volta dentro do armazém para não perder nenhuma cena do último capítulo da novela.

3 - Quem matou Odete Roitman? O mistério da trama global "Vale Tudo" rendeu grande expectativa na virada do ano de 1988 para 1989. Tanto que havia um concurso patrocinado na tv para premiar o telespectador que acertasse o culpado. Em Capão do Leão, não foi diferente. Criaram até um bolão entre os funcionários da prefeitura. Ironicamente, ninguém que apostou no bolão palpitou a personagem Leila (Cássia Kiss). Como não havia, então, acertador ou acertadores, um dos participantes do bolão propôs que o dinheiro fosse entregue "à aposta que mais se aproximou". Não deu certo! Como saber quem mais se aproximou, se ninguém havia acertado na mosca? Deu briga entre os participantes e, para evitar mais discussão, cada parte foi devidamente devolvida a cada um.

4 - Essa aconteceu no bairro Guabiroba, em Pelotas, por meados da década de 90. Não sabemos que novela passava na tv, mas o fato é que, numa sexta-feira, iria ser apresentado o último capítulo da novela das nove. Entretanto, pouco antes de iniciar o "Jornal Nacional" na Globo, ocorre um apagão em parte de algumas ruas, para desespero das donas-de-casa ansiosas para acompanhar o desfecho da novela. Os minutos se passaram e nada de voltar a energia elétrica. Ninguém queria esperar, entretanto, o sábado para assistir a reprise. De um lado e de outro da rua, só se observava aquela mulherada descendo a rua em direção à uma das avenidas principais do bairro, em que o apagão não havia chegado. Umas foram se acomodando em casas de parentes ou amigas, mas a maioria se dirigiu a uma antiga lancheria que existia no bairro e que possuía o luxo de uma televisão a cores 20 polegadas. Rapaz! Aquela lancheria sempre com um público moderado durante a semana, encheu a ponto de não ter espaço para sentar. Como não se podia ocupar espaço no interior do estabelecimento sem consumir nada, a mulherada foi pedindo qualquer coisa, nem que fosse uma água mineral. A criançada na volta das mães aproveitou e foi pedindo toda a sorte de doces às genitoras que, hipnotizadas pela novela, somente anuíam inconscientemente às solicitações infantis. Aquele dia foi um dia feliz para o dono da lancheria! Logo a luz voltou no interior do bairro, mas quem poderia supor que aquela mulherada iria voltar para casa e perder algum momento do capítulo final. Assim foi. Também quando a novela terminou, só se ouviu aquele estrondoso arrastar de cadeiras e a mulherada muito satisfeita indo embora.

5- Essa foi bem mais recente e aconteceu durante a Copa de Mundo de Futebol no Brasil, em 2014, no fatídico 7x1 da Alemanha sobre a Seleção. Camarada nosso, ansioso por acompanhar a semi-final, estava atrasado para a partida e antes de chegar em casa, passara pelo posto de gasolina da cidade e informara-se rapidamente que o placar estava um a zero para a Alemanha. Toca rapidamente para a casa, larga a moto e diz à mulher: "Vou ali na venda pegar uma geladas rapidinho e já volto". Num intervalo de aproximadamente oito minutos, retorna e pergunta a mulher, já adentrando na porta dos fundos de casa: "Tá um a zero ainda? O Brasil já empatou?" A mulher do sujeito, meio que num ar conformado, responde da sala em direção à cozinha: "Que nada! Tá cinco para os alemães!" O sujeito imaginando que a esposa fizesse troça dele, responde asperamente: "Vá à m..., mulher! O cara chega cansado e atrasado para ver o jogo e tu vens com essas gracinhas!" A mulher num tom mais sarcástico, retruca: "Se tiver mesmo cinco a zero, eu tomo essas cervejas que tu trouxestes sozinha, pode ser?" O sujeito abre os olhos, se admira, e vai ver o resultado na tv. Nem no pior prognóstico poderia imaginar o vexatório placar ainda no primeiro tempo. No fim das contas, pede desculpas à esposa e reparte as cervejas com a mulher, já que não tinham nada mais o que fazer de importante naquela tarde.


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