sexta-feira, 12 de outubro de 2018

A Colônia Maciel


"A Colônia Maciel encontra-se localizada na porção elevada do município (nota nossa: Pelotas), em terreno acidentado. Foi ocupada e colonizada por imigrantes italianos que se dedicaram, quase que em sua totalidade, à agricultura familiar.

A formação da Colônia se deu por volta de 1883, quando o antigo proprietário do local, chamado Maciel, dividiu em três colônias da qual uma delas recebeu o nome do mesmo. O processo de colonização nesta colônia não foi propriamente oficial, apesar do governo ter dado o apoio inicial para a construção do barracão, que serviu de abrigo para os imigrantes recém-chegados da Itália, como também a alimentação, os instrumentos e sementes necessários para que eles implantassem suas lavouras e construíssem suas casas. Ela foi considerada privada no sentido de que as terras já possuíam dono, sendo então divididas em lotes e vendidas aos imigrantes.

Um dos lotes foi dividido em quatro partes, sendo que em uma das partes foi construído o barracão, a segunda ficou destinada à construção da igreja, uma terceira para o cemitério e uma quarta, sem ocupação definida naquele período.

Por volta de 1884 a 1886, vieram os primeiros imigrantes italianos para se instalar na Colônia, procedentes da região do Vêneto na Itália, em sua grande maioria da Província de Treviso. Ficaram instalados no barracão, enquanto desbravavam a mata para construir suas casas e instalar suas lavouras. Os primeiros cultivos foram a batata, o milho, a abóbora e a uva, cujo registro se encontra no Livro Tombo da Paróquia de Sant'Ana, localizada na sede da Colônia.

Depois dos colonos instalados em suas próprias casas, o barracão serviu por muito tempo como capela. Somente em 1930 foi construída a Matriz de Sant'Ana, que permanece até hoje com as mesmas características da época de sua construção. Ela possui uma torre com altura de 21 metros; já a altura interna da igreja é de 8 metros, com uma largura de 9 metros. Foi construída com 115.000 tijolos, a partir do serviço voluntário dos colonos.

(...)

A realidade vivida pela população local do local pesquisado, atualmente, é bem diferente daquela dos recém-chegados imigrantes italianos. Segundo relatos de alguns entrevistados, descendentes de italianos e que cultivam na memória a herança cultural deixada pelos seus antepassados, foi possível perceber a dificuldade e, ao mesmo tempo, a adaptação e persistência em busca da sobrevivência, por parte daquelas famílias vindas da Itália.

Quando os primeiros imigrantes chegaram, encontraram apenas a mata virgem, a qual tiveram que desbravar. As primeiras casas foram bastante simples, geralmente de madeira e bem pequenas, simplesmente para abrigá-los enquanto trabalhavam na preparação das lavouras. Segundo um dos entrevistados, que tem muito prazer em relatar o que seus antepassados contavam,

(...) tinha muito mato quando os primeiros chegaram, só tinha um roçadinho, onde armaram a barraca aí e ficaram. A minha avó contava que eles olhavam para cima era o céu e para baixo era a terra, não via mais nada, puro e puro mato. E aí eles foram derrubando. Veio a ordem do governo para eles ir limpando. O governo fornecia muito material para eles, alimentação e tudo, e eles foram trabalhando. (ENTREVISTADO B)

No começo, eles não podiam comer a polenta, alimentação tão comum dos italianos, porque não havia moinho para moer o milho. Então, eles quebravam o milho no pilão e cozinhavam essa canjica com sal e comiam. Depois, então, começou a surgir os primeiros moinhos, simplificando o trabalho para a fabricação da farinha.

Outro fator a ser superado foi a língua, não propriamente a língua portuguesa, mas a usada pelos diversos grupos que chegavam ao Brasil, pois na Itália se falavam diversos dialetos e como as famílias vinham de lugares diferentes, não se entendiam entre si. O entrevistado B, quando questionado sobre esse assunto, diz que:

Era dialetos. Aqui os meus avós vieram de Vêneto, os Aldrigues eram de Montana, os Potenza vieram de Nápoles, mas tinha mais lugares. Tinha dificuldade na comunicação. O que meu pai falava, tinha palavra que a minha mãe não entendia. Então, depois que casaram, passaram a falar italiano. (ENTREVISTADO B)

Os colonos levavam uma vida bastante simples, dedicada, quase que exclusivamente, ao trabalho. Não existiam escolas para as crianças, que desde pequenos ajudavam seus pais nas tarefas diárias. As primeiras tentativas de alfabetização surgiram por parte de alguns moradores que tinham mais acesso ao centro urbano e adquiriram conhecimento, passando a dar aulas em suas próprias casas, para aqueles que tivessem interesse. Nesse sentido, o mesmo entrevistado afirma que: 

Nada, nada de escola aqui, as primeiras aulas que apareceram aqui, foi na casa do Otilho. Naquele tempo era o mais poderoso que tinha. Ele tinha comércio. Ele pegava levava o milho em Pelotas e lá ele estudava. Aí ele veio aqui, começou a dar aula. O meu avô mesmo pagou umas aulas para meu pai, mas tinha bem pouco aluno. (ENTREVISTADO B)

As dificuldades também existiam na comercialização dos produtos. O transporte dos produtos era bastante dispendioso. No começo, eram levados de carroça ou carretas puxadas a boi até Pelotas. Às vezes, pelos próprios colonos ou, então, entregavam seus produtos aos 'Carreteiros' que faziam frete.

Os produtos que mais comercializaram naquela época, eram o milho, a batata, a alfafa, o feijão, o vinho. Também vendiam galinhas e palha de vassoura, sendo tudo enviado a Pelotas. A diversidade de produtos comercializados aumentou quando começou a surgir o transporte motorizado - os caminhões - o que facilitou o transporte, incentivando a produção. Com isso, novos produtos foram agregados à agricultura familiar, principalmente o cultivo da cebola, da ervilha e do pêssego, destinado às agroindústrias que já se instalavam no município.

Um dos fatores que auxiliou os colonos a superarem as adversidades era a fervorosa fé católica. Frequentavam a missa sempre que possível, quando não faziam todos os domingos, além de ser o momento de encontro com os vizinhos e parentes. Comemoravam os dias santos como o Natal, Ano Novo, Páscoa, Semana Santa, Santo Antônio, São Pedro, Santa Terezinha. Desde pequenas, as crianças recebiam dos pais a orientação religiosa, praticando as orações todos os dias. Conforme afirma o Entrevistado B: 'Todos dias ela (a mãe) fazia nós se ajoelhar antes de dormir, e aí que ensinava o Pai Nosso, a Ave-Maria.'

A religiosidade era algo realmente importante para os colonos."

Fonte: CASARIN, Margarete Cristina. Imigração Italiana no município de Pelotas: Uma análise sobre a Colônia Maciel - Distrito do Rincão da Cruz - Pelotas - RS. Monografia, Licenciatura Plena em Geografia, Instituto de Ciências Humanas/UFPel, março de 2003, pág. 51-56.


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