quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Crime horrível e misterioso em Quaraí



 "Crime mysterioso

Mulher degollada

Sob os titulos ácima, escreve a Fronteira, de Quarahy, de 13 do mez findo:

'Conforme, em ligeira noticia de ultima hora, disseramos no numero de quarta-feira, appareceu, no matto que borda a sanga proxima, onde faz barra com a da divisa, no fundo do pequeno potreiro pertencente ao nosso amigo ser. Martinho Carvalho, ha 4 ou 5 dias, o cadaver de uma mulher de côr branca.

O singular e mysterioso facto foi descoberto por um lenhador que o trouxe ao conhecimento do capitão Pedro Porto, sub-intendente do 1o. districto, o qual, por sua vez, na ausencia do sub-delegado, o communicou ao capitão Paulino Naimayer, juiz districtal.

Este, terça-feira á tarde, acompanhado do escrivão do crime, capitão Lourenço Prunes Sobrinho, dirigu-se ao local citado e ali, com effeito, encontrou o referido cadaver, mal encoberto por algumas ramas, residuos das enchentes e um pouco de terra.

Separadas essas cousas do corpo, puderam verificar os presentes o horrivel estado da infortunada mulher.

Ella, que devia ter sido uma moça bonita, estava deitada de costas, apresentando o seu rosto, outr'ora talvez cheio de encantos, os signaes horrorosos de nefando crime.

Os olhos haviam sido arrancados, a carne do rosto tambem fôra cortada, descobrindo perfeita e bonita dentadura.

Como se vê, o rosot estava completamente descarnado, restando, apenas, pegada ao craneo, vasta cabelleira.

O cadaver, apesar de parecer que o crime deu-se ha mais de 8 dias, não estava completamente decomposto, pois o tronco e as pernas ainda apresentavam regular estado de conservação.

Devido ao mau tempo reinante, terça-feira, o juiz districtal ordenou que fosse conduzido o cadaver para o cemiterio, afim de, ali, no dia immediato, ser feita pelo dr. Menezes Pinto, a respectiva autopsia.

Quarta-feira, pois, pelas 12 horas da manhã, levado o cadaver ao cemiterio, presentes aquelle distincto facultativo, o juiz districtal, um dos nossos companheiros de trabalho e outras pessoas, foi feito o exame, assim descripto pelo referido facultativo:

A assassinada era uma mulher de côr branca, cabellos pretos com tranças, de 25 annos presumiveis, não havendo precisão na verificação por faltar todo o couro do rosto, de estatura regular, relativamente gorda, pés e mãos pequenas, vestia probremente e estava descalça.

O cadaver apresentava as seguintes lesões: do seio direito faltava o mamelão e a pelle ao redor do mesmo; no pescoço havia uma incisão transversal, que tomava as faces anterior e lateral, compreendendo todas as partes moles; na face falta todo o couro e parte dos musculos bem como os dois globulos occulares. O couro da face foi tirado por uma incisão transveral do pescoço, passava junto a ambas orelhas e pelo meio da fronte. A lingua foi arrancada. Em todo o resto do corpo não havia outra lesão.

A morte da desgraçada mulher, segundo a opinião do dr. Menezes Pinto, deve ter-se dado a 8 dias mais ou menos.

Após o exame foi o corpo dado á sepultura.

O escrivão capitão Lourenço Prunes, lavrou o auto respectivo.

- Como vêm os leitores, trata-se de um crime barbaresco, cujo movel e outras circumstancias acham-se envolvidos em densas sombras de mysterio.

Mil conjecturas diversas são feitas a respeito, sem que uma só dellas faça luz sobre o hediondo crime.

Ninguem pôde conhecer a infortunada mulher; ninguem queixou-se de seu desapparecimento; nada, absolutamente nada se sabe."

Fonte: A FEDERAÇÃO (Porto Alegre/RS), 03 de Setembro de 1904, pág. 01, col. 05

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