quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

A Seca de 1877 no Rio Grande do Sul

 



É penosissima a situação do interior da provincia do Rio Grande do Sul. Consultada as camaras municipaes pela commissão central nomeada pelo presidente da provincia para inquerir dos effeitos da secca, são ellas unanimes em declarar que graves prejuisos tem soffrido a agricultura e a industria pastorial, e que, se não forem de prompto pelo governo tomadas medidas no sentido de serem soccorridas as familias pobres, dentro em pouco a fome com o seu cortejo de miserias e de crimes alçará o collo em todos os pontos da provincia.

A de Caçapava declara:

Que são grandes os males causados pela secca nos campos assolados pelo incendio, que reduzia a cinzas cercados, mangueiras e até algumas casas;

Que o gado e mais animaes depois de devorarem a plantação que escapava ao incendio, abria-se das fazendas em demanda de alimento, ficando reduzidos á metade pelo extravio, furto e magreza;

Que a classe pobre já esmola o sustento, e que esta miseria crescerá de ponto, na época em que acabarem-se os mantimentos da ultima colheita, que não serão substituidos pela d'este anno, que inutilisou a secca.

E conclue pedindo, por intermedio, o auxilio do governo para que sejam remettidos áquelle municipio, não dinheiro, mas generos alimenticios como farinha, milho e feijão, e bem assim sementes de outros cereaes para nova plantação.

A camara de Taquary abunda nas mesmas considerações e, municipio agricola, occupa-se particularmente dos prejuisos causados á lavoura pela secca.

Conclue, como a camara antecedente, julgando imprescindivel a acção do governo em favor da classe pobre.

A camara de S. João Baptista de Camaquam responde:

Que os males causados pela secca no municipio são incalculaveis relativamente á agricultura, e bem assim quanto á destruição de hervaes e difficuldade de largarem os paus casca para cortumes, recurso de que viviam alguns proprietarios, que possuem mattos;

Que a industria pastoril tem soffrido igualmente, e virá alli a soffrer maiores prejuisos;

Que a secca já tem alli produzido fome.

E conclue igualmente opinando que o governo deve mandar soccorrer, até as proximas colheitas, com viveres mais de cincoenta familias pobres, algumas das quaes perderam os seus chefes na guerra contra o governo do Paraguay.

A de S. Gabriel, que já havia representado ao governo da província, acerca dos males causados pela falta absoluta e prolongada de chuva n'aquelle municipio, não destoa dos conceitos das outras municipalidades.

A de Rio Pardo qualifica de calamitoso o estado do municipio, onde avulta a população pobre, que tirava a subsistencia do producto de sua pequena lavoura, completamente estragada pela secca.

O fogo tem causado prejuisos incalculaveira, queimando grandes extensões de mattos e plantações, sendo o damno causado na colonia de Santa Cruz, avaliado em mais de 100:000$. O districto da costa da serra, tambem agricola, tem tido grandes prejuisos occasionados pelo incendio.

A fome, que já começa a sentir-se, tomará dentro em dous mezes proporções aterradoras, se o governo não soccorrer com comestiveis os habitantes mais pobres do municipio.

Longe iriamos nós se tentassemos fazer a resenha de todos os males, occasionados pela secca e descriptos pelas municipalidades.

As de D. Pedrito, Piratinim e S. José do Norte invocam tambem o auxilio do governo.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 23 de Março de 1877, pág. 01, col. 02-03

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