sábado, 26 de dezembro de 2020

Escravizados no Rio de Janeiro em 1826

 


Importam-se anualmente no Rio de Janeiro, de 20 a 30 mil escravos, na maioria vendidos na cidade e suas cercanias. Este negócio tem tido ultimamente grande animação, porque, de acordo com as disposições do tratado entre Portugal e Brasil, concluído sob garantia da Inglaterra, por Sir Charles Stuart, a importação de negros só será permitida até 1830. Por essa mesma razão, o preço dos escravos também subiu consideravelmente. Ao tempo de minha chegada, podia-se comprar um negro bronco, entre 15 e 20 anos, por 150 mil-réis. As raparigas eram um pouco mais baratas. Um ano depois, esse mesmo negro valia já 200 mil-réis, sendo de prever que os preços, após o cumprimento do referido tratado, subirão muito mais, embora pareça improvável que jamais esse comércio possa ser estancado no hemisfério meridional. 

Os traficantes de escravos são considerados os negociantes mais ricos da cidade. Habitam quase exclusivamente as ruas do Valongo, do Aljube e algumas outras, nas proximidades do porto. Muitas de suas casas, que podem ser consideradas verdadeiros palácios, têm a mesma disposição no andar térreo: largo vestíbulo dando para pequenos pátios, onde nada se vê além de bancos baixinhos. São o chamado armazém de depósito de escravos, geralmente muito limpo, de chão varrido e lavado várias vezes por dia. A fresca brisa do mar sopra por toda a parte, de maneira que, mesmo quando cheio de negros, pouco se sente o mau cheiro que caracteriza as cadeias e casas de correção da Europa. 

(...) 

Por mais cuidado que se tenha no tratamento dos negros durante a travessia do oceano, eles chegam ao Rio de Janeiro aparentemente em petição de miséria, todos magros e quase sem exceção acometidos duma espécie de sarna, que lhes cobre a pele com escamas branquicentas e torna sua cor, preta e lustrosa, em cinzenta suja. Os alimentos a que não estavam habituados e o uso do sal, completamente desconhecido a muitas tribos africanas, devem ser as causas principais dessa enfermidade, que não tem consequências nocivas, tanto que a maioria dos escravos é vendida antes mesmo de estar completamente curada. 

Ao chegar ao porto, dá-se a cada escravo do sexo masculino ou feminino, um pano azul e um barrete vermelho, pois viajaram em trajes do Paraíso. Com essas tangas e barretes, veem-se longas filas de negros levados como rebanhos de ovelhas para os armazéns dos traficantes, onde as transações continuamente se realizam, feitas com a mesma cautela com que na Alemanha se compra um cavalo. Quando se pede um escravo de determinada nação e idade, o negociante enfileira todos os que correspondem ao pedido, escolhendo-se entre eles um ou dois para um exame mais acurado. Verificam-se, para começar, mãos e pés. Mandam-se fazer vários movimentos, para ver que não têm defeitos. Examinam-se os dentes e o tórax. Afinal, levam-no repentinamente do escuro para a claridade, a fim de provar a sua vista. Não será preciso dizer que esse exame não é feito com muita delicadeza nas escravas. Mas essa raça queimada pelo sol desconhece o pudor. Meninas e mulheres descobrem qualquer parte do corpo com a mesma ingênua naturalidade com que uma senhora europeia descalça a luva. 

(...) 

Os escravos mais forçudos trabalham nas ruas como carregadores. Andam nus com uma simples tanga amarrada à cintura, que mal cobre as coxas. Levam todas as cargas à cabeça. Às vezes, bastam seis e mesmo quatro para carregar depressa uma caixa de açúcar do peso de 2.200 libras. Esses mariolas entregam aos seus amos uma diária certa e eles próprios satisfazem as suas necessidades de vida. O mesmo se dá com as jovens pretas, que vendem frutas e outras miudezas, obrigadas a entregar de 16 a 20 vinténs ou meio táler por dia. O que ganham a mais lhes pertence. Como estas últimas praticam também outro ramo de negócio, muitas possuem elevados capitais. 

Trajam-se elegantemente. O níveo vestido amolda-se aos membros roliços dum brilhante pretume. O turbante vermelho esconde-lhes a carapinha, única coisa que numa preta acho excessivamente feio. Um ombro fica meio descoberto. Do outro cai um pano de cores variegadas. Conduzem as mercadorias à cabeça e as apregoam em voz alta, fazendo das suas até altas horas da noite, pelas ruas e praças da cidade. 

Uma lei antiga proíbe aos escravos e escravas o uso de sapatos ou qualquer outro calçado pelo qual se distinguem deles os negros livres. Excetuam-se lacaios e cocheiros dos nobres e altos funcionários do Estado, que, de meias de seda, roupa branca e chapéu de três bicos, ficam de pé na traseira das carruagens de seus amos ou, com botas enormes, conduzem, montados, as mulas que se atrelam geralmente a esses veículos. É raro encontrar cria dos brancos. Onde existem, assumem uma atitude de superioridade, que se reflete prejudicialmente sobre o resto da criadagem. 

Fonte: SCHLICH THORST, C. O Rio de Janeiro como é (1824-1826): uma vez e nunca mais: contribuições de um diário para a história atual, os costumes e especialmente a situação da tropa estrangeira na capital do Brasil. (trad. Emmy Dodt e Gustavo Barroso). Brasília/DF: Senado Federal, 2000, pág. 135-139.

População da cidade de Rio Grande em 1891


"População do Rio Grande

Encontrámos no Diario o seguinte recenseamento da população do 1o. e 2o. districtos da cidade do Rio Grande, publicado ultimamente pela imprensa local:

Homens, 8,834; mulheres, 8,456; total, 17,290.

Sabem ler e escrever, 8,723; não o sabem, 8,567.

Nacionalidades - Brasileiros, 15,092; portuguezes, 1,034; italianos, 433; allemães, 176; hespanhóes, 170; orientaes, 90; francezes, 71; inglezes, 58; hollandezes, 29; austriacos, 27; paraguayos, 27; noruegos, 19; suissos, 18; argentinos, 13; dinamarquezes, 11; belgas, 7; suecos, 4; escossezes, 4; norte-americanos, 3; russos, 3; hungaro, 1."

Fonte: A FEDERAÇÃO (Porto Alegre/RS), 16 de Abril de 1891, pág. 02, col. 02
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