Cavaletes: acessórios de propaganda eleitoral comuns até 2014 foram abolidos em 2016 |
A primeira eleição que vagamente me recordo foi a eleição municipal de Pelotas de 1988. Eu morava em uma rua mais ou menos importante do bairro Simões Lopes e pelo menos três candidatos a prefeito, acompanhados de seus séquitos de militantes e candidatos a vereador passaram pela dita rua naquele ano. Sinceramente, mesmo sem entender direito o que estava acontecendo e, ora motivado pelo buzinaço de um, ou pelo caminhão de som de outro, naquela época, para quem era criança, eleição era uma festa.
Camisetas brancas com logotipos feitos toscamente a atacado, chaveirinhos, bottoms, réguas, canetas, bonés e até umas canecas plásticas feias e de qualidade inferior eram itens distribuídos indiscriminadamente pelos candidatos. Não vou citar as outras "doações" que aconteciam, pois não as presenciei e também não tinha discernimento para perceber coisas assim. Mas, para a piazada eleição era uma acontecimento, pois os guris da minha rua literalmente assaltavam os candidatos atrás dos famosos brindes. Lembro de um candidato a vereador da coligação do Irajá Andara Rodrigues que puxou do porta-malas do carro uma caixa de papelão repleta de camisetas de campanha e a gurizada ia puxando os pacotes, antes mesmo dele conseguir colocar a caixa no capô do carro. Irritado, ele ia xingando e distribuindo uns safanões nos mais afoitos. Todavia, era assim mesmo que acontecia. Eu mesmo acumulei réguas e canetas que os cabos eleitorais distribuíam pela rua a luz do dia, além de colecionar santinhos de papel que sujavam as mãos graças aquela tinta preta vagabunda da impressão. Se for falar dos muros e paredes pintados com propaganda então...
Iniciei com este relato nostálgico para rememorar um pouco como eram as campanhas eleitorais de outrora. Com o tempo, muitas restrições vieram para moralizar a propaganda nas eleições. Na década de 90, foi a vez das placas em postes de luz que passaram a imperar, sendo que, embora muros e paredes de casas estivessem a salvo das propagandas, qualquer cidade ficava tomada delas, mesmo após o fim do pleito. Mais tarde, proibiu-se as placas em postes e veio a era dos cavaletes e placas de madeira nas residências. Na calada da noite, cavaletes de um candidato eram vandalizados por membros da facção política adversária e ficava aquele monteiro de papel, plástico e madeira acumulado nas calçadas e esquinas.
A propaganda com as placas nas residências, por sua vez, serviu para catapultar muitas candidaturas principalmente perto do fim da campanha, sobretudo aqui em Capão do Leão. Em uma eleição passada, houve um candidato que para demonstrar sua força eleitoral (e no fim acabou sendo eleito, mesmo), pôs plaquinhas num enorme número de casas entre o Casabom e a Vila Municipal. O fato é que, quem passasse por um certo roteiro das ruas naquela região, tinha a nítida impressão que o dito candidato possuía um apoio incontestável. Em outras palavras, o efeito visual valia muito e conquistava muitos indecisos e eleitores pragmáticos que votam naqueles que irão vencer. Para bom entendedor, um bom investimento financeiro era uma das chaves para ganhar uma eleição. Quanto mais propaganda espalhada pela cidade, mais se pintava a impressão que um concorrente é (ou está) mais forte que os outros.
Daí chego ao ponto que pretendo demonstrar sobre a eleição de 2016 e as regras de campanha que a nortearam. Indubitavelmente, com as proibições das plaquinhas em residências e dos famosos cavaletes, além da limitação do tamanho das propagandas adesivas, não há cidadão que não chegue à conclusão que as cidades ficaram mais limpas. E justamente neste aspecto, a campanha eleitoral em 2016 assumiu um caráter muito mais pessoal e direto. Se em outras épocas, um bom impacto visual importava muito, favorecendo aqueles que podiam investir pesado em propaganda, agora, o contato direto com o eleitor tornou-se uma necessidade. E foi a tônica das campanhas municipais. Em pequenos municípios como o nosso, que não dispõe do decisivo impacto da mídia televisiva (um instrumento que ainda é crucial em campanhas eleitorais de grandes centros urbanos), bater perna por aí foi o caminho para todo e qualquer candidato. O contato olho no olho, o confronto de opiniões entre o aspirante ao cargo político e o eleitor, a exposição do candidato diante das mais inusitadas situações foram marcas deste ano eleitoral. Não que isso não acontecesse em outras eleições, mas o momento em particular propiciou que essas práticas tivessem uma importância muito maior. Todos esses novos fatos que desprenderam à campanha eleitoral da propaganda massiva constituíram um sopro de democracia na disputa política. A busca do voto foi feita tête-à-tête.
Além disso, a campanha eleitoral de 2016 foi também uma campanha da discrição. Com o descrédito geral da classe política em todo o Brasil, o eleitor comum (nem ativista, nem militante) é mais prudente em assumir posições de forma pública. Quem sabe coloca um adesivo no carro, participa de um encontro, recebe o candidato em casa de forma cordial, comenta suas preferências e opiniões com familiares e amigos próximos. Porém, de modo geral, permanece tranquilo, nem covarde, nem expansivo demais. Guarda sua convicção independente das tendências que lhe apontam. Embora, é verdade, que ainda existe e existirá aquele eleitor que votará segundo a concepção oportunista de votar naquele que vai vencer ou vai me favorecer (não sejamos totalmente inocentes).
De todo modo, o aspecto mais positivo e satisfatório da eleição municipal de 2016 foi a mudança de paradigma nas campanhas. Quem ganha com tudo isso é a sociedade civil que pode experimentar uma democracia mais autêntica e plena, menos dependente de efeitos visuais da propaganda massiva. Que bom!
Para saber mais sobre as regras prescritas pelo Tribunal Superior Eleitoral para as eleições deste ano, segue o link:http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2016/Maio/eleicoes-2016-propaganda-eleitoral-de-candidatos-deve-respeitar-restricoes-da-legislacao
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