Os anos de 1880 a 1940 presenciaram a saída de centenas de milhares de libaneses em direção às terras da América, da África, do Oriente Médio e da Austrália. O movimento iniciou-se com os conflitos comunais de 1850-60, ganhando intensidade a partir dos anos 1880 até atingir seu pico nos anos 1910, para então recuar e manter-se num volume constante e significativo até o início da Segunda Guerra Mundial. Tal período, por sua vez, pode ser dividido em duas fases de características distintas quanto aos motivos e sujeitos da emigração, tendo como marco divisor o ano de 1920 – significativo por marcar a mudança do domínio turco-otomano para o domínio francês.
Dados estatísticos dispersos recolhidos por Charles Issawi indicam que em 1858, 5.000 camponeses deixaram as aldeias maronitas em decorrência dos conflitos comunais – o que deve ter continuado a ocorrer nos anos seguintes devido à intensidade dos combates entre drusos e maronitas. Em 1900, 120.000 pessoas deixaram a grande Síria – principalmente o Líbano – em direção aos Estados Unidos, Brasil e outros países latino-americanos; em 1914, registrava-se no Monte Líbano a emigração de 15.000 a 20.000 pessoas por ano, e estima-se que ¼ de toda a população libanesa tenha deixado o país entre os anos de 1900 e 1914.
Do ponto de vista da imigração para o Brasil, segundo dados apresentados por Oswaldo Truzzi, o movimento iniciou-se pouco a pouco nos anos 1880, tomou fôlego em 1895, crescendo continuamente de 1903 a 1913. Neste ano, houve a entrada de 11.101 imigrantes sírio-libaneses pelo Porto de Santos. Nos anos 1920, a taxa manteve-se na média de 5.000 entradas por ano, diminuindo ao longo dos anos 30 com a implantação de medidas restritivas por parte do governo central. De 1908 a 1941, os sírio-libaneses representaram a sexta nacionalidade com o maior número de entradas em São Paulo.
(...)
A questão inicial que se coloca é: por que este grande grupo imigratório dirigiu-se para o Brasil, sendo que outras opções se ofereciam? – como os países produtores de petróleo do Golfo Pérsico, os países de população islâmica da África, os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e outros países latino-americanos como a Argentina, a Venezuela e o México, que ao longo do século XX também foram fonte de atração de imigrantes em menor ou maior grau. O Brasil, porém, superou todas as expectativas que poderiam ter os libaneses descontentes quanto a ser um bom país de recepção, e hoje cálculos realizados pelas entidades internacionais de imigrantes libaneses indicam o Brasil como o país com o maior número de imigrantes e descendentes de libaneses em todo o mundo.
Entre os fatores especificamente brasileiros para a atração de imigrantes entre os anos 1880 e 1930 e a partir de 1945, discutirei neste capítulo:
·
A
requisição de mão-de-obra imigrante para a substituição do braço escravo no
trabalho agrícola, nas duas últimas décadas do século XIX e três primeiras
décadas do século XX, especialmente na província/estado de São Paulo;
·
A
requisição de mão-de-obra especializada para suprir as necessidades da
industrialização e urbanização iniciadas nos anos 1930 e acentuadas nos anos
1950;
·
A
política imigratória liberal do país – apesar de alguns poucos momentos de
restrição e de discursos anti-imigratórios – acompanhada por uma política ampla
de concessão de nacionalidade;
·
A
possibilidade dos imigrantes obterem ascensão econômica devido à crescente
urbanização e desenvolvimento do país (no caso dos libaneses, através do ciclo
mascate-lojista-industrial);
· A liberdade de culto e multiplicidade étnica, que permitiu aos imigrantes não-europeus e não-cristãos serem aceitos na sociedade (especialmente os menos diferentes e após a ascensão econômica).
Fonte: GATTAZ, André. Do Líbano ao
Brasil: história oral de imigrantes. Salvador/BA: Editora Pontocom, 2ª.
Ed., 2012, pág. 24-26; 79-80.
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