terça-feira, 31 de maio de 2022

O Carrasco Fortunato

 



Nota nossa: biografia de um real e últimos carrascos da História do Brasil.

Era um homem jovial, o verdadeiro typo d'esses bons tropeiros dos sertões de Minas, que á noite, nos pousos, divertem os camaradas rasgando uma chorada chula, na viola, emquanto ao longe pasta a boiada.

Quem não conhecesse a terrivel historia d'aquelle homem, ao vel-o risonho, de bentinhos e patuás no petio, sempre a fallar em Deus e Nossa Senhora, estaria longe de julgar que era elle o celebre carrasco, terror da provincia de Minas Geraes.

O crime não deixara n'aquelle rosto as estrias do remorso. O sangue que elle derramava por conta da injustiça não lhe produzia no espirito impressão alguma.

Fizera-se carrasco como quem se faz sapateiro. Enforcar um homem, era para elle como se deitasse umas tombas.

Usava de uma phrase especial para dizer que havia justiçado um criminoso:

- Mandei-o embora.

A vida para elle era cousa somenos. E se o quizessem vêr alegre, era dizer-lhe que se preparasse para ir enforcar um réu.

Nas vesperas da execução mostrava-se Fortunato de uma expansibilidade extraordinaria. Ria, fallava comsigo mesmo, gesticulava, e punha-se até a cantarolar.

Para o criminoso a quem tinha de mandar embora, era elle de uma ternura quasi paternal. Tinha então extremos de delicadeza, e, fallando-lhe, uma doçura verdadeiramente feminil, na voz.

No momento, porém, em que deitava a corda ao pescoço do miseravel, dilatavam-se-lhe os olhos e brincava-lhe no rosto uma alegria feroz.

Os gestos eram então sacudidos e nervosos. Rapido como um relampago, cumpria o seu degradante e infame dever, recuperando logo depois a calma e a tranquilidade de um justo.

Dormia aquelle homem como póde dormir quem nunca teve um mau pensamento, nem praticou uma acção indigna. Tinha amor ao officio, e exercia-o com prazer.

Era um typo digno de estudo, o carrasco Fortunato; e, graças á obsequiosidade de pessoa que o conheceu, podemos hoje offerecer aos leitores alguns dados sobre a vida d'esse sinistro personagem, que figurou em tantas tragedias judiciarias.

✤✤✤✤✤

Fortunato nascera em 1811, em Lavras, na provincia de Minas Geraes. Era filho de Jeronymo e Engracia, escravos, como elle, de Antonio Carlos Garcia.

Era negro e tinhas bastos bigodes. As barbas, em carapinha, emmolduravam-lhe o rosto cheio e arredondado. O olhar era vivo e scintillante. As orelhas apresentavam tamanho fóra do natural, e como que se moviam, quando elle fallava com animação.

No abdomen, volumoso e crescido, bem como nas costas, notavam-se duas grandes cicatrizes.

Tinha 62 pollegadas de altura, era analphabeto, e apresentava um aleijão na mão esquerda.

Fortunato era estimado na fazenda pelo seu humor folgazão, e porque sabia entreter os seus miseros companheiros de captiveiro, por meio de historias que elle contava com certa graça.

Um dia, porém, revoltado por ter sido castigado, premeditou um assassinato, e o executou com a maior calma.

Foi victima do miseravel uma infeliz mulher, sua senhora, de nome Anna Custodia de Souza, esposa do fazendeiro Garcia.

Recolhido á prisão, e transferido depois para a cadeia de Ouro Preto, foi elle condemnado a galés perpetuas, como incurso no grau maximo do art. 192 do codigo criminal, em virtude do art. 194 do codigo do processo, por sentença datado de 13 de novembro de 1868, tendo havido appelação, que não foi decidida.

Tinha elle 24 annos de idade, em 1835, quando fez a sua estréa, como carrasco. Estava preso, mas não tinha sido ainda comdemnado.

É esta a longa serie de seus sinistros trabalhos:

No dia 20 de março de 1835 seguiu de Ouro Preto para Itabira, onde enforcou um criminoso, voltando a 2 de junho de 1840 para a sua prisão.

Foi uma estréa auspiciosa, Fortunato mostrou-se orgulhoso, ao ver que n'esse dia era alvo dos olhares da multidão, e trabalhou limpamente. Se elle nascera para aquillo!

A 26 de setembro de 1840 seguiu para Caethé, onde foi cumprir o seu fatal dever, recolhendo-se a 1 de outubro de 1843.

A 21 d'este ultimo mez seguiu para Piranga, onde executou o réu Antonio Cobra, voltando a 30 do mesmo mez.

A 6 de Novembro seguiu para Itabira, recolhendo-se a 20 do mesmo mez.

A 10 de outubro de 1846 partiu para Tres Pontas, regressando a 18 de novembro.

A 1 de dezembro d'esse anno seguiu para Pitanguy, onde enforcou o réu Balduino, escravo de Antonio Nunes Carneiro, regressando a 20 de janeiro de 1847.

A 1 de março seguiu para Barbacena, onde executou o réu Fernando José de Araujo, regressando a 20 de junho de 1847.

A 30, ainda d'esse mez, seguiu para o Piauhy, regressando a 20 de junho de 1847.

A 23 de janeiro seguiu para Conceição do Serro, regressando a 20 de fevereiro de 1849.

A 26 de maio seguiu para Uberaba, onde fez diversas execuções, recolhendo-se a 28 de julho do mesmo anno.

A 5 de outubro seguiu para S. João Nepomuceno, regressando a 30 de novembro.

A 18 de dezembro, ainda de 1849 seguiu para o Serro, onde executou o réu José Africano, recolhendo-se a 15 de janeiro de 1850.

A 26 de fevereiro seguiu para Araxá, voltando a 28 de abril.

A 27 de setembro seguiu para o Curvello, affim de executar o réu Celestino, regressando a 17 de outubro.

A 11 de novembro seguiu para S. João d'El-Rei, para executar o réu João, escravo de Francisco José Antonio Guimarães, seguindo d'alli para Barbacena a 4 de dezembro, para executar o réu Antonio Moçambique, e recolhendo-se a 20 de janeiro de 1851.

A 30 de junho de 1852 seguiu de novo para S. João d'El-Rei, afim de executar o réu Fortunato Creoulo, recolhendo-se a 31 de julho.

A 23 de agosto seguiu para o Curvello onde enforcou o réu João Paulo Pereira, recolhendo-se a 27 de setembro.

A 7 de outubo seguiu para o Mar de Hespanha, afim de executar o réu Germano, e recolheu-se a 9 de novembro.

A 6 de maio de 1853 seguiu para o Rio Preto, afim de executar os réus Marcellino Creoulo e Antonio Navaldão, assassinos de seu senhor, Luiz José Paula, e recolheu-se a 10 de junho.

A 1 de julho seguiu para Curvello, onde executou o criminoso Casimiro Pereira da Silva, regressando a 1 de setembro.

A 7 de outubro seguiu para Barbacena, regressando a 8 de novembro.

A 16 de julho de 1854 seguiu para Curvello, recolhendo a 4 de agosto.

A 5 de setembro seguiu para o Mar de Hespanha, regressando a 10 de outubro.

A 17 de novembro seguiu de novo para o Mar de Hespanha, onde executou os réus Antonio Cambinda, Antonio Angola e Pedro Noddão, voltando a 30 de dezembro. 

A 18 de maio de 1855 seguiu para Jacuhy, recolhendo-se a 1 de junho.

A 19 do mesmo mez seguiu para Pouso Alegre, onde enforcou o réu José, escravo, regressando a 20 de julho.

A 8 de outubo seguiu para Piranga, onde executou os réus Antonio Bento Monteiro e Ignez, escrava, regressando a 21 de outubro de 1856.

A 4 de novembro seguiu para Caldas, regressando a 30 de dezembro.

A 16 de novembro de 1857 seguiu para Leopoldina, onde executou os réus David, Amancio, Vicente e Joaquim, recolhendo-se a 13 de janeiro de 1858.

A 14 d'esse mesmo mez seguiu para Marianna, onde enforcou o celebre criminoso José Joaquim Gomes da Fonseca, mais conhecido pelo appellido Tira-Couro, regressando a 20, ainda d'esse mez.

A 7 de abril seguiu para Sabará, afim de executar os réus Peregrino e Rosa, recolhendo-se a 20 de abril.

Finalmente, a 19 de julho, seguiu para Diamantina, onde enforcou o réu Archanjo, regressando a 20 de setembro d'esse mesmo anno de 1858.

Ainda exerceu elle o seu funesto officio em diversas localidades, tendo-lhe passado pelas mãos mais de 50 criminosos.

Um anno depois da sua ultima execucção, começou Fortunato a mostrar-se amodorrado, tristonho, sombrio, manifestando a cada momento a profunda saudade que tinha dos bellos tempos em que trabalhava.

- Vocês querem então que eu morra?! dizia elle muitas vezes aos guardas da prisão. Então não ha por ahi mais ninguem a quem eu tenha de mandar embora?! Já não se faz mais justiça n'esta terra?!

Pouco a pouco foi Fortunato perdendo a robustez da sua musculatura de aço, e aquella constante jovialidade que fazia d'elle um carrasco alegre.

A definhar lentamente, chegou Fortunato até á idade de 72 annos, e falleceu a 9 de julho de 1883, deixando de si tristissima recordação na provincia de Minas Geraes.

D'elle se póde dizer que foi um homem que soube exercer limpamente o seu miseravel officio, pois o fazia como se não houvesse nascido para outra cousa.

Em Minas Geraes tornou-se lendario o sinistro nome d'esse carrasco, de quem damos hoje o retrato.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 02 de Novembro de 1889, pág. 01, col. 04-05


segunda-feira, 30 de maio de 2022

domingo, 29 de maio de 2022

Um esconjuro brasileiro contra bruxas do século XIX

 



Pelo caminho ia rezando uma reza que a minha santa avósinha, que Deus haja, me ensinou quando eu era pequenito, p'ra exconjurar bruxas.

A reza que ia a rezar é assim:

Ó bruxa da mão furada,

Das unhas escarrapachadas, 

Toda a casa tem quatro cantos,

Cada canto tem seu santo,

Padre, Filho e Espírito Santo.

Fé tinha eu na resa da minha avó, porque, a fallar a verdade, nunca o filho de meu pai tinha visto bruxas, trasgos, nem aventesmas!

(Tio João).

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 09 de Outubro de 1889, pág. 01, col. 08

sábado, 28 de maio de 2022

A Baiana da Rua Barão de Mesquita



ALMAS DO OUTRO MUNDO

NOVAS MANIFESTAÇÕES

NA 

RUA DO BARÃO DE MESQUITA

(...)

O que vamos narrar não é producto da fantasia. É a pura verdade. Áquelles que duvidarem, aconselhamos que procurem as praças de policia que, ante-hontem rondaram a rua do Barão de Mesquita, e que lhes perguntem o que viram e o que ouviram.

Passemos ao facto, que é interessante, mysterioso, singular e extraordinario.

Ás 10 horas da noite de ante-hontem começou a patrulha a fazer a sua ronda pela citada rua.

Os soldados estavam despreoccupadamente a fazer o seu serviço, com aquelle authomatismo de quem se habitua a um certo trabalho que não demanda de nenhum esforço de intelligencia, e que o faz dia a dia com a monotona regularidade de um relogio.

Isto tudo vem para dizer que não pensavel elles em almas do outro mundo, ou cousas de igual jaez, quando ouviram as doze pancadas da meia noite.

E com as doze pancadas da meia noite ouviram tambem agudissimos assovios, que partiam das proximidades da rua de S. Francisco Xavier, esquina da do Barão de Mesquita.

Intrigados com aquillo, e suppondo que fossem signaes convencionados por gatunos, occultaram-se em um capinzal, e puzeram-se a imitar os assovios, contando que os gatunos se approximassem.

Era plano d'elles attrahir por essa fórma os que assoviavem e prendel-os.

Vendo, porém, que ninguem apparecia, e que os assovios continuavam, dirigiram-se para o ponto d'onde partiam os mysteriosos signaes.

Apenas chegaram á rua de S. Francisco Xavier notaram, com grande espanto, que já os assovios não partiam d'alli, mas do ponto em que elles, soldados, tinham estado occultos.

De novo voltou a patrulha áquelle ponto, e d'ahi ouviu logo em seguida os mesmos assovios, partindo da rua de S. Francisco Xavier.

Cada vez mais intrigados com aquelle singularissimo phenomeno, procuraram os dous soldados descobrir a causa d'aquillo, para o que não achavam explicação plausivel.

Percorreram então a rua do Barão de Mesquita, de um ponto a outro, com a maior velocidade, notando com grande estupefacção que os assovios partiam sempre do ponto opposto áquelle em que se achavam!

Um dos solados propôz que ficassem ambos á espreita, porém cada um d'elles em ponto extremo.

Executado este novo plano, ouviram então repetido trilar de apitos que partiam do centro dos terrenos do hospital militar, sem que pudessem descobrir pessoa alguma.

Acto continuo ouviram tropel de animal.

Acreditando ser o official rondante que viesse a cavallo, como é de costume, dirigiram-se os dous soldados para o vulto que viram ao longe.

Subito, porém, cessou o tropel do animal, e cavallo e cavalleiro desappareceram como por encanto!

Pouco depois tomaram os soldados um bond do Andarahy Grande que passava, e um d'elles, dirigindo-se ao conductor perguntou-lhe:

- Que diabo de lambança é esta que se está passando aqui na rua do Barão de Mesquita?

É singular o que narram alguns capineiros, a proposito das mysteriosas manifestações n'aquella rua.

Dizem elles, e affirmam com a maior convicção, já terem visto fóra de horas uma mulher extremamente alta, magra, de trunfa á cabeça e vestida de preto. Essa mulher, a quem denominam a bahiana, anda apressadamente, e ás vezes com velocidade incrivel.

Quando alguem tenta approximar-se ella desapparece, sem que se saiba como, sem  que se saiba como, sem que se possa encontrar nenhum vestigio da sua passagem, nenhum logar onde pudesse occultar-se, nada, absolutamente nada.

Essa mysteriosa mulher, a bahiana, como já a tratam, apparece muitas vezes, segundo dizem os capineiros.

É provavel que amanhã possamos dar novas informações acerca d'esses singularissimos phenomenos, que se reproduzem na rua do Barão de Mesquita.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 04 de Outubro de 1889, pág. 01, col. 04


sexta-feira, 27 de maio de 2022

San Francisco e as minas da Califórnia

 



Exterior.

CALIFORNIA. - Nada mais curioso de que o extraordinario desenvolvimento dado em meia duzia de annos á cidade de S. Francisco, que, antes de descobertas as minas da California, contava apenas umas 5 a 6,000 almas, contando as almas santas das esquinas. Hoje, quereis saber o que alli ha?

Ha 31 escolas publicas, com 70 mestres e 5,000 discipulos; despendem-se com ellas 137,000 pesos fortes, desses que valem ahi no Brasil, si bem me lembro, coisa dos seus 2$000.

Ha quatro associações scientificas com as suas competentes bibliothecas.

Ha quarenta livrarias publicas.

Ha doze periodicos diarios, entre os quaes dous francezes e dous allemães, tres semanaes, um italiano, um francez, e um hespanhol; dez semanaes, dos quaes um é chinez. Ao todo vinte e cinco periodicos.

Ha dezoito typographias, e sete lithographias.

Ha quatro hospitaes para enfermos pobres; um delles é sustentado pelo governo federal, que a isso applica 60,000 pesos.

Ha 136 medicos e 65 boticarios, apezar de ser limitado o numero de obitos, pois em 50 habitantes morre um por anno, emquanto nas cidades de Nova-York e Philadelphia morre um em 32 - e em Boston, um em 37. - Em 1,233 obitos que houve este anno ultimo, figurão 48 pessoas affogadas e 58 crianças nascidas mortas.

Ha 275 advogados, e 18 escrivães (Santa Barbara!).

Para objectos de beneficencia ha 8 sociedades de estrangeiros = duas de senhoras, duas hebraicas, duas allemãs, uma italiana e 1 franceza.

São representados por 18 consules os estados estrangeiros.

Ha uma companhia de gaz, que tem enterrado tubos para elle na extensão de treze milhas, e acende todas as noite 482 lampeões.

Ha seis theatros, dos quaes um é allemão, outro francez e outro chinez.

Ha tres salas para concertos.

Ha sete lojas maçonicas, quatorze clubs, quatro barracas para exercicios gynasticos.

Ha 12 moinhos de vapor.

Ha 63,000 habitantes.

E ha, que é o melhor de tudo, dinheiro em barra para todos, uma vez que queirão trabalhar.

Fonte: CORREIO OFFICIAL DE MINAS (Ouro Preto/MG), 23 de Abril de 1857, pág. 04, col. 01

quinta-feira, 26 de maio de 2022

Um relato sobre o tráfico transatlântico de africanos no século XIX

 



 - O TRAFICO DE AFRICANOS. - Encontra-se no Ausland o curioso depoimento feito perante os tribunaes da America por um marinheiro que pertenceu á equipagem do Mary E Smith: diz elle - 

"Depois de navegar tres annos na pesca da balêa, voltei a Boston, tendo gasto quanto ajuntei, o que nos succede sempre a nós marinheiros, fui obrigado a procurar trabalho e contractei-me como marinheiro a bordo do Mary E Smith.

Disse-me o capitão que deviamos ir para Montevidéo. Mas, logo que estivemos no alto mar, percebi que era falsa aquella asserção. Em vez de tomar para a America, o barco dirigia-se para a costa d'Africa.

Havia a bordo outro marinheiro enganado como eu.

Disserão-nos então, para nos applacarem, que nos darião uma boa paga, isto é 600 dollars a cada um pela viagem da costa d'Africa até Cuba, passagem gratis para nossa patria e dous negros. O que fazer no alto mar? Calamo-nos.

Na travessia preparou-se tudo para a recepção dos negros. Evitava-se qualquer encontro com outros navios.

Chegados á costa, tomou-se o carregamento. Nós dous aproveitamos do momento para desertar, e fomos ter a uma feitoria ou barracão. Foi uma fortuna o termos desertado, porque soubemos depois que o Mary E Smith tinha sido apresado por um navio brasileiro.

A feitoria onde me refugiei era dirigida por um residente, e tive occasião de observar como se faz ainda hoje o trafico. A feitoria estava situada em um ponto que não se podia descubrir, olhando-se do mar, precaução necessaria por causa dos crusadores britanicos e americanos. Compunha-se de dous edificios, um para os negros, outros para as negras e crianças.

O systema para obter negros é o seguinte: Educão-se neste mister pessoas cuja occupação unica é attrahil-os. Trazem-nos ás feitorias, onde lhes dão botões de metal, espingardas velhas, anneis e pulseiras de cobre. O preço regular de um negro bem constituido, nessas occasiões, é de 16$000, e o das negras e crianças, de 6$ a 8$000, pagaveis em mercadorias.

Tal é a paixão destes povos pelos ornatos e pela aguardente, que ás vezes os pais vendem os filhos e os maridos as mulheres.

Emquanto se demorão nos barracões, os negros andão encorrentados em lotes de 8 a 12. Logo que entrão alli, são marcados. Cada feitoria tem o seu signal particular e um lugar especial onde o applica. Ora é n'um braço, ora é nas costas, ora nas pernas, etc. O lugar mais ordinario é o lado direito do peito. O instrumento é sempre o mesmo: um ferro em brasa.

Depois de dous mezes e meio de estar eu naquella localidade, apareceu um barco negreiro, o Altivie de New-York, que comprou quatrocentos negros, pelo preço de 120$000 por cada homem, e de 60$ a 80$000 por cada mulher. Embarquei-me nelle para voltar para a patria.

Durante a viagem, morrêrão no Altivie cem negros, por falta de ar e de alimentação regular. Ao cabo de quarenta dias, desembarcou-se o contrabando em uma ilha perto de Cuba, vendendo-se os negros mais vigorosos a 1:600$000."

Depois disto, incendiarão o Altivie. O marinheiro pôde tomar passagem para New-York, onde fez a sua communicação á autoridade.

Fonte: CORREIO OFFICIAL DE MINAS (Ouro Preto/MG), 26 de Janeiro de 1857, pág. 03, col. 02-03

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Enchente em Pelotas em 1889

 



A ENCHENTE EM PELOTAS

As grandes chuvas que cahiram nos dias 9 e 10 do corrente nas proximidades da cidade de Pelotas fizeram transbordar as aguas do rio S. Gonçalo de uma maneira como não ha exemplo ha muitos annos.

O rio, sahindo do leito, inundou consideravelmente as margens, ficando todos os estabelecimentos da margem esquerda debaixo d'agua.

No porto, a agua cobriu a linha dos bonds e chegou, ás 4 horas da tarde, até a bacia do chafariz da praça S. Domingos.

Toda a rua do Conde de Porto Alegre, ficou transformada em um grande rio.

Na margem direita, os estragos são medonhos.

As casas ficaram com 3 e 4 palmos d'agua e alguns moradores tiveram de dormir em cima das mesas e no forro dos predios para não ficarem de môlho..

O gado que existia na margem direita de S. Gonçalo foi colhido pela agua, e consideravel numero de rezes pereceram afogadas.

Nas margens do Santa Barbara ficaram com agua da altura de tres ou quatro palmos todos os edificios, inclusive as fabricas de farinhas, ratoeiras e barracas.

Ás 3 horas da madrugada do dia 12, o Sr. Pio Rosa, morador nas Larangeiras com sua familia, teve de mudar-se ás pressas, porque a agua entrava aos borbotões na habitação.

Todos os campos e casas marginaes do S. Gonçalo até Santa Isabel foram invadidos pelas aguas.

Um horror!

Os estragos causados pela enchente na fabrica do gaz são importantissimos. Segundo os melhores calculos nem em 15 dias haverá n'aquella cidade illuminação a gaz.

A agua chegou á altura de 1m,30 dentro do estabelecimento, alagando fornalhas, retortas, deposito de carvão, etc.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 20 de Junho de 1889, pág. 01, col. 03

terça-feira, 24 de maio de 2022

Incidente na Cabeça de Porco

 



AINDA A CABEÇA DE PORCO

A afamada estalagem da rua do Barão de S. Feliz, a muito conhecida Cabeça de Porco, foi ante-hontem theatro de uma grande desordem. A 1 hora da madrugada, mais ou menos, estavam em lucta renhida, n'uma troca de murros e pontapés, João Browns, Avelina de Araujo Santos, Maria Florinda Machado, Marcellina Rosa de Aguiar e Alzira Maria da Conceição. Na occasião em que eram presos, oppoz-se tenazmente a essa prisão o musico do 23o. batalhão de infantaria, que, com os outros, foi detido, ficando á disposição do ajudante-general. A prisão do musico foi effectuada por um sargento do 25o. batalhão.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 01 de Abril de 1889, pág. 01, col. 04

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Barão de Alagoas

 



Victima de uma congestão pulmonar, falleceu hontem ás 7 horas da manhã o barão de Alagôas, marechal de campo Severiano Martins da Fonseca, ajudante-general do exercito.

Era o general Severiano um bravo militar, muitissimo querido entre os seus collegas, causando dó geral e profunda consternação em toda a classe a inesperada noticia da sua morte.

O que foi o distincto militar, quantos serviços relevantes prestou á patria, evidencia-se da sua brilhante fé de officio, documento honrosissimo, que em seguida publicamos:

O marechal Severiano Martins da Fonseca, filho de Manuel Mendes da Fonseca, nasceu na provincia das Alagoas em 1825.

A 25 de setembro de 1841 assentou praça, sendo promovido a 2a. tenente em 12 de novembro de 1842; a 1a. tenente em 27 de agosto de 1849; a capitão em 30 de abril de 1852; a major em 22 de janeiro de 1866, por antiguidade; a tenente-coronel em 1o. de junho de 1867, por actos de bravura; a coronel, em 17 de agosto de 1869, por actos de bravura; a brigadeiro em 27 de junho de 1877; e a marechal de campo em 25 de abril de 1888.

Era condecorado com o officialato do Cruzeiro, commendas de Aviz e de Christo, officialato da ordem da Rosa, e com as medalhas da campanha do Estado Oriental do Uruguay de 1865, de merito militar e da campanha do Paraguay, com o passador de outo n. 5.

Exerceu varios cargos de confiança, merecendo sempre elogios pela maneira por que os desempenhou. Assim foi elogiado: a 25 de setembro de 1851, pelo commandante das armas de Pernambuco; a 25 de agosto de 1853, pelo commandante do seu regimento; a 1 de setembro de 1854, pelo commandante da brigada de que fazia parte; a 26 de janeiro de 1858, em ordem do dia do commandante das armas da provincia de Pernambuco; a 1 de outubro do mesmo anno, pelo commandante do seu regimento; a 3 de julho de 1857, pelo commandante da fortaleza de Santa Cruz, pela maneira por que desempenhou os cargos de major da praça e commandante de bateria e destacamento da mesma fortaleza; a 4 e a 16 de maio de 1861, pelo commandante do seu regimento; a 18 de julho e a 26 de agosto de 1861, pelo presidente da provincia das Alagoas; a 14 de agosto, pelo inspector do seu batalhão; a 11 de janeiro de 1867, pelo commandante do regimento; a 16 de julho, pelo commandante do 3o. corpo do exercito; a 14 de novembro de 1869, pelo commandante em chefe das forças em operações no Paraguay; a 8 de agosto e a 28 de setembro de 1872, pelo ministerio da guerra; a 5 de março de 1873 foi elogiado pelo inspector dos corpos da guarnição da côrte; a 5 de setembro, pelo ajudante-geral; a 10 de março de 1875, pelo presidente da provincia da Parahyba; a 14 de abril do mesmo anno, pelo ministerio da guerra; a 31 de julho de 1876, pelo ministerio da guerra; a 18 de abril de 1877, pelo commandante geral de artilharia; a 30 de julho do mesmo anno, pelo ajudante-general; a 26 de junho de 1877, pela presidencia da provincia do Rio Grande do Sul; e a 29 de janeiro de 1881, pelo ministerio da guerra.

Durante muitos annos commandou com grande intelligencia a escola Militar da côrte, e tendo pedido exoneração d'esse cargo, foi-lhe ella concedida, sendo por essa occasião agraciado com o titulo de conselho pelos bons serviços que prestou no desempenho d'essa commissão.

A 28 de julho de 1877 foi nomeado quartel-mestre general, cargo que deixou por ter sido nomeado ajudante-general.

O marechal Severiano deixa algumas obras de grande merito, entre ellas um compendio sobre artilharia, adoptado para instrucção do exercito, e uma instrucção sobre toques de cornetas e clarins.

Era membro da commissão de promoções, e ultimamente fez parte da commissão encarregada da confecção do regulamento das escolas do exercito.

Fonte: GAZETA DE NOTICIAS (Rio de Janeiro/RJ), 20 de Março de 1889, pág. 01, col. 01-02

domingo, 22 de maio de 2022

Histórico da EMEF Jacob Brod, Pelotas/RS

 

Estudantes da escola em 1932



A EMEF Jacob Brod é uma escola da rede municipal de Pelotas, situada à Avenida Fernando Osório 5413, bairro Três Vendas, zona norte da cidade. Oferece ensino infantil pré-escolar e ensino fundamental completo em dois turnos. A atual diretora no ano de 2022 é a Professora Valquíria Böhm, tendo a professora Maria Auxiliadora Mandagara como vice-diretora, a professora Fernanda Zahn como coordenadora pedagógica da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental e a professora Josiani Molina como coordenadora pedagógica das séries finais do ensino fundamental.

Origem da Escola

A escola foi fundada em 01 de setembro de 1928, quando foi lançada a pedra fundamental para a construção do prédio da escola, e as primeiras aulas iniciaram em 01 de fevereiro de 1929 com 24 alunos distribuídos em duas turmas. A escola surgiu da necessidade que os moradores do bairro Três Vendas tinham, em sua grande maioria agricultores de origem alemã e pomerana, de matricular seus filhos em escolas públicas que pudessem atendê-los, pois a outra única solução seria mandá-los estudar no centro da cidade e Pelotas - o que nem sempre era possível pela questão do custo de transporte e mesmo do pagamento de mensalidade em instituições privadas. Além disso, como muitos filhos de colonos não tinham ainda o domínio da língua portuguesa, uma escola mais perto de casa poderia facilitar-lhes o aprendizado do idioma nacional, visto que, a grande maioria, crescia em lares onde pais e avós comunicavam-se quase exclusivamente ou em alemão ou em pomerano.

O Nome da Escola

O nome da escola é uma homenagem ao imigrante alemão Jacob Brod, que nasceu em 08 de dezembro de 1848 na aldeia de Liesenfeld, Coblença (atualmente cidade situada no estado alemão da Renânia-Palatinado mas que, à epoca, fazia parte do Grão-Ducado do Hesse). Jacob Brod foi um dos imigrantes que vieram para a colônia de São Lourenço do Sul durante o século XIX, onde conheceu e contraiu matrimônio com a imigrante pomerana Emília Leitzke. Da união nasceram os filhos: Alberto, Martha, Ida, Guilherme, Theodoro, Bertha, Rosa, Maria, Jacob Filho, João e Emílio. O fato da escola homenagear Jacob Brod se deve ao fato do terreno doado para a construção da escola ter sido iniciativa do seu primogênito, Alberto Brod, que assim o solicitou junto à Prefeitura de Pelotas, na ocasião administrada por Augusto Simões Lopes, que foi a beneficiária da cessão. Jacob Brod já havia se transferido para o bairro Três Vendas em Pelotas no início do século XX, onde se dedicou às atividades comerciais. Foi neste local que veio a falecer em 22 de outubro de 1920.

Primeiros tempos

Apesar do entusiasmo no momento da criação da escola, os primeiros anos foram de muita luta, devido à precariedade de condições existentes. O principal responsável pela afirmação do educandário neste período penoso foi o Professor Lamartine Auget, que atendia turmas tanto pela manhã quanto pela tarde, e acumulava indiretamente as funções de supervisor, professor-regente, secretário e zelador. Com o decorrer dos anos e o aumento gradativo das matrículas, foi designada uma funcionária para limpeza e merenda, além de novos professores para atendimento dos estudantes.

O Professor Auget foi substituído anos depois pela Professora Sílvia Gusmão Costa, posteriormente passando a função de regência principal à Professora Zely C. Costa. Ainda nessa época, passaram funcionar mais duas turmas num prédio ao lado da Igreja Luterana Martinho Lutero (corresponde hoje aproximadamente onde se localiza o Hotel Coimbra). Em 1948, com elevada procura de vagas pela comunidade e apoio do governo municipal, houve ampliação do prédio da escola. Neste mesmo ano, foi empossada a 1a. diretora, a Professora Deloah Nogueira de León e o educandário recebeu a denominação oficial de Grupo Escolar Jacob Brod. 

Um dado curioso dos primeiros tempos da escola é que as meninas tinham uma aula especial de bordado, tendo esta habilidade sido oferecida até o ano de 1957 - aliás, ano também de uma nova ampliação do prédio. Personalidade marcante também dos primeiros anos foi a Dona Joana Munhoz, servente, que se imortalizou na memória de sucessivas gerações dos primeiros alunos.

Décadas de 1960 e 1970

Em 1960, assumiu a direção a Professora Maria Izabel Tillmann, sucedendo a Professora Deloah. Neste mesmo ano, para atender as dificuldades dos moradores do bairro, a escola passou a funcionar em três turnos. Logo em seguida, vieram as direções das professoras Ivone Hartleben, Ivoni Martins, Isolda Maahs de Castro, Eny Emília Fonseca Beduhn e Tania Mara Moraes de Borba. Foi um período de grande intensidade da escola, tanto no aspecto pedagógico quanto na vida social do bairro. A escola sempre participou significativamente dos desfiles cívicos municipais, bem como promovia diversos eventos que congregavam não somente os estudantes, mas igualmente pais e comunidade, como Festa da Primavera, Festa das Debutantes, concursos culturais, etc. Em 1979, foi fundado o CTG Andarengos, vinculado à escola e tendo como 1o. patrão o Sr. Gilmar Ribeiro da Silva.

Em 1972, com a reforma nacional do ensino, o Grupo Escolar Jacob Brod foi colocado como escola tributária do Grupo Escolar Santa Terezinha - situação que durou alguns anos até o início da década de 1980, quando ocorreu nova ampliação das instalações escolares e o educandário passou a ser regido por estatuto autônomo. Em 1982, foi criado um anexo da escola junto ao bairro Jardim de Allah, no fim da Avenida Fernando Osório, para atendimento da demanda daquela comunidade. Com o tempo, o anexo foi separado da administração da escola e deu origem à atual EMEF Jardim de Allah.

Novos tempos

A escola cresceu muito até o final do século e no início do século XXI, com diversas ampliações de seu espaço físico e a construção de novos anexos. Em 2005, foi instalado o Laboratório de Informática e, anos mais tarde, erigido o novo e moderno prédio que abriga a educação infantil e as séries iniciais do ensino fundamental. Sucederam-se na direção da escola até então as professoras Vera Maria Schneider, Maria Irene Bernasconi, Maria Lúcia Schiavon, Vera Freitas, Enilda Spinola, Elna Schuschu, Marisa Dilli, Leia Raffi e Maria Auxiliadora Mandagara. 

A escola também agrega o Grupo Escoteiro Itaipu, fundado em 1981. Ao longo do ano escolar, reunindo alunos, pais, funcionários e professores, são realizados diversos eventos que congregam a comunidade, como Dia das Mães, Festa Junina, Olímpiada das Cores, etc. Tem especial interesse a cada ano, a formatura dos alunos do nono ano do ensino fundamental, temporariamente interrompida devido aos dois anos de pandemia, porém sempre marcantes para gerações sucessivas de estudantes. Vale lembrar que muitos estudantes tem sua vida escolar inteiramente consolidada no Brod, entrando bem pequenos na educação infantil, ingressando no ensino fundamental e já saindo somente para a nova etapa do ensino médio.

Integrada à comunidade local, atendendo alunos de diferentes partes do bairro Três Vendas e das vilas próximas, a escola Jacob Brod caminha rumo ao seu centenário, sempre atuante e procurando oferecer educação transformadora de qualidade e cultivando valores de solidariedade, respeito e empatia.


Atividade festiva (década de 1990)

Festa de aniversário da escola (década de 1990)

Solenidade cívica (década de 2000)

Festividade cultural (década de 1980)

Torneio de futebol (década de 1980)

Duas novas salas de aula construídas (1957)

Professora Deloah Nogueira de León, primeira diretora (década de 1950)

Sílvia Riemer Brod, aluna de uma das primeiras turmas de 1929 (foto da década de 1970)

Festa Junina (década de 1960)

Desfile de Sete de Setembro (década de 1970)

Desfile de Sete de Setembro (década de 1970)

Desfile de Sete de Setembro (década de 1970)

Homenagem aos italianos, desfile cívico (1976)

Desfile cívico (década de 1970)

Joana Munhoz, primeira servente da escola, que marcou inúmeras gerações dos primeiros tempos

Apresentação na Praça Coronel Pedro Osório (1975)

Rainha da Primavera (1976)

Festividade (1977)

Baile e valsa (final da década de 1970)

Corpo docente (1978)

Desfile cívico (final da década de 1970)

Apresentação de dança (1980)

Festividade (final da década de 1970)

Festa Junina (início da década de 1980)

Bailinho (início da década de 1980)

Anexo Jardim de Allah, Festa Natalina (1984)

Carnaval na escola (década de 1980)

Jogo de futebol (década de 1980)

Festividade (década de 1980)

Fachada da escola à Avenida Fernando Osório (foto atual)


Placa em homenagem ao Sesquicentenário de Jacob Brod, instalada em 1998

Prédio da educação infantil e séries iniciais (foto atual)

Grupo Escoteiro Itaipu



Turma de formandos do nono ano (década de 2010)

Almoço festivo (década de 2010)

Horta escolar (década de 2000)

Festividade esportiva (década de 2000)

Preparativos para o desfile de Sete de Setembro (década de 2000)

Ação educativa da Companhia Telefônica Melhoramento & Resistência (1998)

Olímpiada de Matemática (década de 1990)

Visita do Coelhinho da Páscoa (década de 1990)

Festividade (década de 1990)

Grupo de professoras (década de 2000)













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