História, Genealogia, Opinião, Onomástica e Curiosidades.Capão do Leão/RS. Para informações ou colaborações com o blog: joaquimdias.1980@gmail.com
Páginas
- Página inicial
- Biografias & Histórias de Vida
- Etnias & Colonização
- Lendas, Mistérios & Folclore
- Patrimônio Histórico & Lugares de Interesse
- Sobrenomes alemães
- Sobrenomes pomeranos
- Sobrenomes da Península Ibérica - Espanhóis & Portugueses
- Sobrenomes Brasileiros
- Sobrenomes Judaicos
- Sobrenomes Holandeses
- Outros Sobrenomes
- Nomes Étnicos
- História do Brasil
- Rio Grande do Sul
- Capão do Leão
- Pelotas
- Sobrenomes Alemães por ordem alfabética
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Fazenda Santo Onofre
quarta-feira, 20 de novembro de 2024
terça-feira, 19 de novembro de 2024
segunda-feira, 18 de novembro de 2024
domingo, 17 de novembro de 2024
Golbery de Couto e Silva
sábado, 16 de novembro de 2024
sexta-feira, 15 de novembro de 2024
quinta-feira, 14 de novembro de 2024
quarta-feira, 13 de novembro de 2024
terça-feira, 12 de novembro de 2024
Antiga ponte rodoviária sobre o Canal São Gonçalo
segunda-feira, 11 de novembro de 2024
domingo, 10 de novembro de 2024
sábado, 9 de novembro de 2024
sexta-feira, 8 de novembro de 2024
quinta-feira, 7 de novembro de 2024
quarta-feira, 6 de novembro de 2024
terça-feira, 5 de novembro de 2024
segunda-feira, 4 de novembro de 2024
domingo, 3 de novembro de 2024
Sobrenome Kebede
Sobrenome amárico que significa "do oeste", isto é, aquele que mora no oeste ou provém do oeste. Típico da Etiópia.
sábado, 2 de novembro de 2024
sexta-feira, 1 de novembro de 2024
quinta-feira, 31 de outubro de 2024
quarta-feira, 30 de outubro de 2024
terça-feira, 29 de outubro de 2024
segunda-feira, 28 de outubro de 2024
domingo, 27 de outubro de 2024
sábado, 26 de outubro de 2024
sexta-feira, 25 de outubro de 2024
Sobrenome Johansson
Sobrenome patronímico simples escandinavo (sueco, norueguês, dinamarquês) do nome Johann (João em português). Segundo sobrenome mais comum na Suécia segundo dados de 2020.
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
Bandoleiros & Salteadores no Rio Grande do Sul 08
quarta-feira, 23 de outubro de 2024
O Folclore da Cachaça no Rio Grande do Sul
Por Carlos Galvão Krebs
A bebida popular no Brasil, de Norte a Sul, é a cachaça. O Rio Grande do Sul não escapa a isso. As três armas que o gaúcho usa, paradoxalmente, contra o calor e contra o frio, são o pala, o chimarrão e... a cachaça.
Precisamente por ser a bebida popular por excelência é que a cachaça vem despertando a atenção dos folcloristas nos últimos tempos. Desde o sociólogo Gilberto Freyre, desde o respeitabilíssimo Luiz da Câmara Cascudo até José Calazans que publicou "CACHAÇA BRANCA" na série oficial das edições do Museu do Estado da Bahia.
Seguindo a trilha, vamos alinhavar aqui o pouco que sabemos a respeito do folclore da cachaça no Rio Grande do Sul.
A SINONÍMIA
Como em tôda a parte do país, também aqui a voz mais comum para designar a aguardente é CACHAÇA. Mas se fala muito em CANINHA, CANA, e CANHA, por influência de CAÑA, forma castelhana. Às vêzes se ouve dizer BRANQUINHA. Um dos sinônimos mais curiosos que temos ouvido é RAMA. "Meter rama" é beber muito, especialmente caninha. Depois da descoberta de Fleming, como na Bahia, também se diz no Rio Grande: "Bota aí uma penicilina".
A MAIS FAMOSA
Sem dúvida alguma pelo que temos ouvido no Estado e fora dele referida por gaúchos saudosos do pago, a mais famosa cachaça do Rio Grande do Sul é a caninha azulada, de Santo Antônio da Patrulha. Sob a luz natural apresenta uma bela coloração azulada, conseguida à base de casca de bergamota segundo uns, ou de carvão vegetal segundo outros. Infelizmente, como Santo Antônio fica na rota das praias atlânticas, sua cachaça vem sendo por demais solicitada. Disto resulta uma queda de qualidade. Na própria fonte de produção nos chegamos a adquirir a AZULADA ainda morna, recém saída do alambique.
AS MARCAS DE CACHAÇA
Para ilustração desta pesquisa apresentamos ao lado uma pequena coleção de cêrca de cinqüenta rótulos. Todos de caninhas vendidas e bebidas dentro do Estado. Muitas delas produzidas aqui mesmo. Outras tantas, importadas de outras regiões do país. Com base neste material e através dos títulos, os especialistas podem realizar um belo estudo psicológico.
A coleta de rótulos para coleção exige uma técnica muito simples. Muitos rótulos são impressos em papel de pouco pêso, isto é papel muito fino. E frequentemente os produtores usam goma muito forte. Daí surgir dificuldades para a retirada dos rótulos, que se rasgam à menor tentativa. Entretanto basta deitar a garrafa horizontalmente, cobrindo o rótulo com um pano leve, sôbre o qual se derrama vagarosamente o conteúdo de uma chaleira de água fervendo. Ao final o rótulo pode ser destacado com relativa facilidade e com prejuízo mínimo para a sua integridade.
O RITUAL DOS BEBEDORES
Os bebedores da campanha do Rio Grande conservam uma bela fórmula para beber tradicionalmente sua cachaça. Velha fórmula e sempre nova, porque antiga e atual. Chega um gaúcho a uma venda qualquer. Cumprimenta todos e ordena ao bodegueiro que "bote" uma dose de cana. Sempre há pelos cantos alguns guáscas, bebericando e conversando. Servida a cana o recém chegado apanha o copo e o passa sem beber - ao que lhe está mais próximo. Êste recusa:
- "Não, senhor, está em boa mão".
- "Mas para melhor vai!"
Só então o convidado apanha o copo e bebe um trago. E passa a caninha ao seguinte da roda. Ao terminar a volta, sobra ao pagante um gole exatamente igual ao que todos beberam. Aquêle que paga - e isto é essencial à gentileza gaúcha - é sempre o último a beber.
Acreditamos que haverá muitas outras fórmulas para registrar. Entretanto não nos parece existirem no Rio Grande do Sul aquelas loas, lodaças e glosas de que fala Calazares na Bahia, seja para pedir um gole, seja para agradecer uma bicada.
ANEDOTÁRIO
Embora relutando, um gaúcho certo dia deu com os costados num consultório médico. Depois do exame o doutor lhe proibiu terminantemente a cachaça. Em casa o pobre homem deu para sentir uma dor de cabeça tremenda. Não teve dúvidas: foi à venda e mandou botar a dose que então se chamava "quatrocentão de cana". De uma só vez metia no copo três dedos: o polegar, o indicador e o médio da mão direita. Em seguida enquanto dois dedos esfregavam a cachaça na testa para passar a dor, o guásca chupava o polegar avidamente...
Também a outro pêlo duro foi proibida a cachaça. Ao voltar ao doutor êste não viu nenhuma melhora com o tratamento. Pergunta severamente:
- "O senhor não bebeu cachaça, mesmo?"
- "Não, senhor! Quando eu tava com muita gana, botava farinha de mandioca num prato, despejava cachaça em cima, mexia bem e... comia o pirão!"
A CACHAÇA NA POESIA POPULAR
O estudante Mário Vieira recolheu em 1850, na Estância do Umbú, município de Cruz Alta, uma deliciosa "décima" sôbre a cachaça. Ouviu-a do negro Adolfo, posteiro da fazenda e cantador nas horas vagas. Adolfo morreu no verão de 1953 para 1954. Não fôsse a coleta de Mário Vieira e talvez tivéssemos perdido para sempre estes saborosos versos:
"Saudade, tenho saudade
Da terra onde nasci
Saudade duma aguardente
Da cachaça que eu bebi"
"A cachaça é minha prima
O vinho meu primo, irmão
A cachaça eu bebo em copo
O vinho em garrafão"
"Eu não gosto da cachaça
E o vinho não posso ver
Quando eu pego na garrafa
Deixo os outros sem beber"
"Uma moça me pediu
Que eu deixasse de beber
Eu de beber eu não deixo
De um porre eu quero morrer"
"No fundo de um alambique
Vou fazer minha sepultura
Que mesmo depois de morto
Quero viver na fartura"
"Da garrafa eu faço a vela
Da pipa faço caixão
Do funil faço a mortalha
Me botem um copo na mão"
"Quando eu morrer ninguém chora
Quem chora são as garrafa
Eu quero que o povo diga
Morreu o pai da cachaça"
O PEJORATIVO DA CACHAÇA
Bebida barata e popular, a cachaça estigmatiza tôda uma classe social. "Negro cachaceiro!" é expressão comum no Rio Grande do Sul. Na frase feita, o NEGRO não funciona como epiderma, como raça, mas sim como CLASSE, a mais baixa, a ínfima classe social. Pelo menos essa é a intenção consciente ou inconsciente. Recordamos um fato que torna isto bem flagrante. O advogado Sylvio Faria Correia (agora falecido) foi prêso junto com Borges de Medeiros quando peleava nas coxilhas a favor dos constitucionalista de São Paulo, em 1932. Passada a revolução, publicou (no estrangeiro, é claro) um livro de memórias - "Serro Alegre". Narra que, em momentos de frio intenso, êle e seus companheiros se aqueciam com tragos de "rhum". O livro circulou clandestinamente em Pôrto Alegre. Logo um jornal governista apanhou o pião na unha e lançou um artigo ridicularizando o movimento constitucionalista, os revolucionários e o autor do livro. Título do artigo: "RHUM NÃO: CACHAÇA!" A darmos crédito ao artigo, o episódio comprova, pelo direito e pelo avêsso, aquilo que queremos demonstrar. De um lado, o revolucionário gaúcho transforma a rude e singela em "rhum" sofisticado inteiramente estranho à campanha do Rio Grande do Sul. Isto, para furtar-se ao estigma pejorativo da caninha. Do outro lado o jornal, a acentuar precisamente tal estigma. O título "Rhum não: cachaça!" nada mais queria dizer senão êste insulto, visando os revolucionários - "Negros cachaceiros!"
AS MISTURAS DE CACHAÇA
Com vistas à medicina lembramos logo a cachaça com arnica, vegetal abundante no Estado. Arnica (subentendido: em infusão na cachaça) sempre foi uma verdadeira panacéia. Servia para tudo, desde a simples luxação até o ferimento grave.
Mas foi para a bebida que a cana teve e tem maior utilidade. Não houve uma senhora, mulher de estancieiro que não tivesse feito seus licôres à base de caninha. Dentre êles sobressai o universal licor de butiá. O butiázeiro é uma palmeira típica do Sul do país. Seus "coquinhos" com cêrca de uma polegada de diâmetro são gordos e saborosos. Cachaça, butiás, açúcar, mais algum tempinho para descançar, sempre deram como resultado êsse licor tradicional do Rio Grande do Sul. Hoje com o progresso, muitos estancieiras adquirem nas farmácias "da cidade" o álcool puro a tantos gráus para fazer seus licores.
Em Pôrto Alegre, mesmo o gaúcho citadino encontra em qualquer bar (e não é fôrça de expressão, é a pura verdade) as mais variadas misturas de caninha.
Por exemplo:
Caninha com "bagos de zimbro", ou "bagas de zimbra", também chamadas "Wacholder" em alemão. Desta vez os luso-brasileiros freqüentemente fazem uma corruptela dizendo "Bacholda" com o CH alemão. As bagas de zimbro são sementes pequenas, redondinhas, de um verde escuro, que se deitam em quantidade dentro de um recipiente cheio de cachaça. Dão um gôsto especial à caninha. Sua finalidade é estomacal, segundo se afirma. Tal mistura há tempo vem sendo explorada industrialmente por uma emprêsa da Capital do Estado.
Caninha com mastruço, erva do gênero das crucíferas medicinais.
Caninha com losna, outro vegetal com qualidade estomacais, conforme a crença popular.
Caninha com cabriúva (casca) que deve ser cortadinha para poder entrar pelo gargalo da garrafa. A cabriúva, que é árvore transmite à cachaça um perfume delicado e especial, como se lhe tivessem adicionado gôtas de perfume nobre.
E ficamos aqui.
Sabemos, melhor do que ninguém, que isto não esgota o tema. Ao contrário constitui apenas uma lembrete aos folcloristas e tradicionalistas gaúchos que poderão registrar muito mais coisa do que nós.
Fonte: A HORA (Porto Alegre/RS), 21 de Fevereiro de 1959, sem indicação de página
terça-feira, 22 de outubro de 2024
segunda-feira, 21 de outubro de 2024
Sobrenome Wetere
Sobrenome maori que significa filho de Wetere. Wetere é a transliteração maori para o nome inglês Wesley. Mais comum na Nova Zelândia.
domingo, 20 de outubro de 2024
Os antigos bailes e bochinchos do Rio Grande do Sul
Fernan Silva Valdez me fez recordar, com seus estudos folclóricos sôbre "Bailes e Bailongos" uma época da minha vida que ascende ao primeiro quartel deste século quando, menino ainda, comparecia aos bailes e bochinchos das solitárias campanhas de Itaqui. Os bailes realizavam-se nas fazendas, naqueles salões assoalhados, revestidos de cadeiras com assentos de palha e pernas torneadas colocadas ao correr das paredes; pequenas mesas de canto, em cada quadrante; enfeitadas de vasos antigos e de bisquits com figuras românticas do século XVIII e, às vêzes, flores de papel e cascas de ovos de avestruz pintadas e atravessadas por uma linha ou fita, pendentes das paredes. Nestas, ainda uma folhinha da casa comercial mais próxima e duas ou três reproduções fotográficas, a crayon, emolduradas em caixilhos de um mau gosto incrível.
À porta de entradas, abrigados pela meia fôlha aberta o gaiteiro, o violeiro e o italiano da rabeca. Do teto, pendente, um lampeão à gás e, às vêzes, outros, sôbre as cantoneiras altas.
Quando as donas de casa erram jovens e românticas, costumavam perfumar a sala queimando raminhos de alecrim.
A música obedeceu a dois ciclos, perfeitamente definidos. Nos primeiros tempos, por influência dos vizinhos do outro lado do Uruguai, dançava-se o pericon, de mistura com as quadrilhas e lanceiros. A chimarrita e a tirana eram referidas apenas pelos velhos avós. Depois, nos tempos a que me transponho, isto é, ao ano de 1920, dançavam-se a mazurca, a polca de relação, a habanera, o chotes e a valsas, todos de marcado cunho europeu.
O bochincho, tanto quando chamavam de meio-pêlo, contavam apenas com uma sala de rancho, de chão batido, poucos os bailes que os platinos colocavam cadeiras guenzas, de pau, bancos compridos e cêpos duros. Ao oitão, um candieiro, de flandres, de forma cônica, com um pavio de lã torcida. De baixo, sob a luz nervosa que projetava sombras inquietas nas paredes, o gaiteiro, de botas, de bombachas e chapéu tombado sôbre as costas, preso ao pescoço pelo barbicacho. Dançava-se arrastando os pés e, do chão, de terra batida, erguia-se a polvadeira que enruivava os cílios e as sobrancelhas. Quando as moças começavam a tossir, o bastoneiro, o mestre de sala, mandava parar a gaita e fazia a assistência sair para a noite aberta. Entrava a piona, com uma bacia de água e um raminho de guanxuma, salpicando o chão, tratando de não fazer barro. Depois, a festa recomaçava, mais animada. A canha, corrida no gargalo da garrafa, despertava o entusiasmo da gauchada, o mate passeava de mão em mão e, na roda das mulheres, o licor de araçá e potes de sequilhos, queijadas e pés-de-muleque.
Tanto nos bailes de categoria como nos bailes de meio-pêlo, e principalmente nos bochinchos onde as liberdades eram mais amplas, podiam ocorrer rivalidades amorosas que degenerassem em conflito. Os incidentes eram raros nos bailes das fazendas, para onde acorriam gente rica, autoridades distritais e comerciantes da região, cujas famílias chegavam em carretas, carretilhas e jardineiras. Mas nos bailes de meio-pêlo e nos bochinchos, nestes sobretudo, era raro que uma desconfiança ou um ciúme violento não terminassem em peleia. Em peleia, onde o candieiro voasse num tapa e a gaita fosse partida pelo meio, num habilíssimo golpe de facão.
Às vêzes, algum gaiato esparramava na sala de chão puro um punhado de pimenta do reino moída, que subia, de mistura com o pó, até os brônquios e pituitárias... E o resultado era sempre o mesmo das cenas de ciúme ou desconfiança: "quem atirou pimenta no baile?" acompanhado de um gesto de desafio, de chapéu tapeado para a nuca, e mão no cabo da adaga.
Lembro de um baile de meio-pêlo, realizado no Curuçu, região naqueles tempos, muito primitiva, nas campanhas de Itaqui. O rancho era de Siá Domingas, mulata de respeito que criava meia dúzia de filhas, que traziam inquietos os olhos e os corações de todos os gaúchos de, pelo menos meia légua de redondeza. Proximo, residia um tal Jacinto, castelhano pachola, casado com uma alemã côr de garopa - a Honoria, cabelo seco. O castelhano andava seduzido pela beleza de uma das filhas de Siá Domingas. E foi nessa noite de baile, que eu vi, na sala banhada por uma névoa pastosa e negra de picumã, o correntino atravessar a sala e convidar a chinoca de Siá Domingas para uma habanera arrastada e longa. A chinoca olhou para o chão, depois correu os olhos pela assistência, encontrou o olhar fuzilante da velha e negou-se a sair. O correntino não teve dúvidas:
- "No es la primera égua que me nega el estribo!"
E o rolo foi imediato. Ali, por perto, andava uma pretendente da chinoca, E os facões se cruzaram para resolver o agravo e decidir o premio... O castelhano Justino levou levou, pelo menos, cinco costuras na cara.
De outra feita, o baile seguia animado, polvorente, sala azul-negra de fumaça e picumã. Dançava-se, como sempre, de bombachas, de botas e de esporas. De repente, um gaúcho enroscou a roseta da chilena no babado de rendas da saia de sua chinoca. E um outro gritou - provocante e irônico:
"Pára o baile! que se mancou uma égua!"
A simples frase picaresca, dita por gosto e maldade, aumentou de mais um volume a pilha de autos criminais que no Juiz da Comarca levantava sôbre a escrivaninha da sua casa na cidade.
Os homens, nos bailes de categoria, usavam trajos da cidade. Nos comêços do século, levavam, em pessuelos, de léguas distantes, os croises e as sobre-casacas dos tempos imperiais. As mulheres, ostentavam, durante a noite, diversos vestidos, de variadas côres e feitios, cada qual com seus adereços apropriados, hábito que verifiquei estar ligado a uma tradição que Eduardo Dias acusou nas festas semelhantes de diversas regiões da Arábia.
Nos bailes de meio-pêlo e nos bochinchos, o gaúcho trajava sua vestimenta ordinária, e chiripá, nos tempos idos, e, depois a bombacha, botas, o chapéu de abas largas e as esporas choronas. As mulheres, o vestido de chita colorida. Dêsses bailes, nasciam os casamentos. E muitas vêzes, o baile começado ao cair da tarde, prolongava-se ao sair do sol do dia seguinte. Se a casa era rica, a sala era grande e os convivas de bôa cepa, recolhiam-se as moças para o interior da casa de largo espaço e os homens a sombra das figueiras e dos umbus, ou pelas tarimbas dos galpões e dormia-se a farta, pela manhã e a tarde e, ao cair da noite, o baile recomeçava. Fechavam-se as portas e as janelas, ao amanhecer, para que os convivas não fossem surpreendidos pela luz do sol. E os lampiões, na sala fechada, continuavam a dar a impressão de noite grande.
Depois, a festa terminava, deixando alguns casamentos apalavrados. As famílias retiravam-se nas suas carretilhas, jardineiras ou carretas e os moços guapos, no lombo de seus cavalos para um troteada de 10 ou 20 léguas, campo fóra...
Fonte: DIÁRIO DE NOTÍCIAS (Porto Alegre/RS), 20 de Setembro de 1955, 2o. Caderno, pág. 01; 04
sábado, 19 de outubro de 2024
Sobrenome Wrublewsky
Sobrenome Claudino
Sobrenome italiano patronímico, mais comum nas regiões setentrionais da Itália, sendo uma variação do nome Claudiano e uma derivação do nome Claudio.
Os antigos vendedores ambulantes do Rio de Janeiro
Vendedores ambulantes: uma tradição que desaparece da Cidade Maravilhosa. Substituídos pelos sofisticados "camelôs", os vendedores ambulantes, tôda uma gama de tipos populares, estão cada dia se afastando mais do centro da cidade, expulsos que são pelo progresso. Nos subúrbios e, mesmo em alguns bairros, êstes vendedores ainda nos fazem recordar com seus pregões, o nosso tempo de calças curtas.
Vassoureiro, garrafeiro, sorveteiro, funileiro, o homem do periquito e tantos outros, faziam e ainda fazem de sua profissão a alegria de muita gente. Seus pregões, suas melodias de vendas, eram e são tão simples como êles, mas seu efeito publicitário persiste por muito: quem não sente desejo de comprar sorvete, ao ouvir um dos remanescentes sorveteiros, a anunciar em versos de pé quebrado, o "geladinho" de côco e de abacaxi?
Até o final da última guerra, os vendedores ambulantes dominavam a Cidade Maravilhosa.
Era o homem que comprava garrafas e jornais, o que vendia vassouras, o que consertava panelas, o que, com seu periquito verde, vendia a sorte para as mocinhas desejosas de encontrar príncipes encantados. Havia sempre quem fôsse a sua porta para vender ou comprar alguma coisa. Mas os tempos passaram-se. O progresso caminhou mais rápido que a tradição, e foi aos poucos expulsando êstes tipos. Muitos se retiraram para os bairros e subúrbios mais longínquos, onde até hoje se pode ouvir os seus pregões; outros, preferiram se estabelecer.
NACIONALIDADES
A nacionalidade, também influi na especialidade. Peixeiro, por exemplo, só italiano; garrafeiro, só portuguêses; sorveteiro um nacional, um baiano que saiba bem preparar um sorvete de côco.
É interessante observar como ainda hoje se mantém certas tradições de nacionalidade entre os vendedores ambulantes. O amolador de facas, que empurra o cavalete com a pedra de amolar, é sempre um italiano; o jornaleiro, também. Os portuguêses preferem atividades como vender frutas e legumes, gêlo, flôres e plantas.
Os judeus dão sua preferência ao comércio de venda e compra de roupas. Quem ainda não ouviu o clássico pregão do homem que compra tudo. Êste ramo pertence, sem dúvida alguma, aos judeus. E ninguém tenta roubar-lhes o campo. Mesmo porque não saberia esta difícil arte de comprar sapatos velhos para depois vendê-los.
Mas também ninguém, que não fôsse brasileiro, teria a ousadia de vender quitutes baianos ou sorvetes ou amendoim torrado.
Portanto, nesta questão de comércio ambulante, não há perigo de concorrência. Há o lugar para todos, desde que o "rapa" permita.
PREGÕES
Os pregões dos vendedores ambulantes é uma outra faceta desta tradição. Mesmo sem conhecer o português, muitos foram os vendedores ambulantes que nos legaram belíssimos pregões que fariam inveja a muito criadores de "jingles". Quem não se lembra dos vendedores de laranjas, quando se vendia a fruta ao cento por cinco ou dez mil reis. O caminhão transbordando de laranjas, parava numa esquina. O vendedor, em plenos pulmões, anunciava a sua presença: "Olha a laranja, dona Teresa. Traga a sacola pois vou embora". Na verdade, não havia rima, entretanto, sabia musicar os seus "jingles".
NAS MÚSICAS DE CARNAVAL
Os vendedores ambulantes também já serviram de temas a muitas músicas de Carnaval. Por volta de 1937 ou 1938, Dircinha Batista gravou uma marchinha que foi grande sucesso: "O Periquitinho Verde". Não há dúvida que era uma homenagem ao homem do realejo que depois de tocar alguma velha música, abria a gaiola do periquito (algumes vêzes papagaio), sob a qual havia uma gaveta com papéis dobrados. Em troca de um pagamento, o homem do realejo batia com o dedo na cabeça do pássaro e êste, mais do que rápido, tirava a sorte. Era o homem que vendia um pouco de sonho. Hoje ainda existem alguns, espalhados por êste grande Rio de Janeiro.
O PROGRESSO
Mas o progresso é, realmente, o grande inimigo dos vendedores ambulantes, pior ainda do que a fiscalização (o "rapa"). O geleiro, por exemplo, que antes passeava pela cidade com a sua bicicleta, já não tem muito o que fazer; as geladeiras elétricas estão lhe tirando o pão de cada dia. Os sorveteiros não podem concorrer com os das carrocinhas. A matéria plástica suplantou o artezanato de flôres de papel crepon e os seus vendedores não mais encontram com facilidade, compradores para as suas mercadorias. E assim, aos poucos, vão cedendo o seu lugar. Mas para quem os ouviu e viu, ficou a grata lembrança de seu tipo, de seu pregão.
Fonte: CORREIO DA MANHÃ (Rio de Janeiro/RJ), 20 de Janeiro de 1960, sem página definida
sexta-feira, 18 de outubro de 2024
quinta-feira, 17 de outubro de 2024
quarta-feira, 16 de outubro de 2024
O Regatão na Amazônia
O comércio de Santarém, como o de tôda a Amazonia, apresenta uma figura singular, o "regatão", comerciante que transporta suas mercadorias em batelões ou lanchas. Atualmente, é possível distinguir pelo menos três tipos de "regatões", o pequeno, o médio e o grande. O pequeno é o mascate, figura tradicional, o médio já é evoluído e procura manter transações regulares, com os habitantes do município; os grandes "regatões" estabelecem-se de preferência numa bôca de rio, dondo passam a irradiar o seu comércio, criando ali uma espécie de entreposto, mantido com caipiras próprios ou com créditos e "aviamento" feito por "aviadores" de Manaus e de Belém.
Fonte: O JORNAL (Rio de Janeiro/RJ), 08 de Março de 1959, pág. 06
terça-feira, 15 de outubro de 2024
Pelagens Bovinas
(...)
Bem. Começamos falando de boi. Tão importante como o homem. Mais velho que êste, mais educado que êste, porque docil e domesticável. Até a música do carro de bois o hipnotiza. Ele vai no abôio, ao ritmo e na melódica do berrante, ou do carreiro.
Por isso é que abistelado tem estrêlas ou manchas brancas; albardado, não malhado, nem sardo, mas tendo no lombo mazela de côr diferente da do resto do pêlo; almarado, que tem em volta dos olhos uma circunferência de côr diversa da do resto da cabeça; alvação, branco, sem manchas; araçá (bras.), amarelo mascarado, ou matizado de prêto; barroso (bras.) de pêlo branco-amarelado; bisco, que tem uma haste mais baixa que a outra; bocalvo, com focinho branco em cabeça escura; borralho, côr de cinza; botineiro, cujo pêlo das pernas difere do resto do côrpo; brasino, de pêlo avermelhado com listras pretas ou muito escuras; braúna (bras.) ou caraúno (bras.) muito prêto; broco, que tem um ou os chifres pequenos e cheios de rugas; cabano, que tem os galhos inclinados para baixo; caldeiro, de chifres um tantos baixos e menos unidos que os das gaiolas; cambraia (bras.), inteiramente branco; camurça, pardo-vermelho; capirote, de cabeça e pescoço da mesma côr e pintas diferentes no corpo; capuchinho, que desde a fronte à parte superior do pescoço, tem côr diferente da do resto do corpo; cardim, branco e preto; chita, branco e vermelho; chamurro, novilho castrado, que fica tendo a dupla aparência de boi e touro; chumbado, branco, vermelho ou castanho chumbado de prêto; churriado (bras.) que tem extensas listras brancas sôbre o pelame prêto ou vermelho; cornalão, de chifres muito grandes; cornicurto, de cornos curtos; cornífero ou cornígero, que tem cornos; cornilargo, de pontas muito afastadas uma da outra; cornudo, que tem cornos; corombó, de chifres pequenos ou quebrados; cubeto, que possui hastes muito caídas ou quase juntas das pontas; cumbuco (bras.) de chifres curvos, com as pontas voltadas uma para a outra; ensabanado, de pêlo todo branco; escardado, designativo dos chifres, quando se desfiam, batendo de encontro a objetos resistentes; espácio, de chifres muitos abertos; estorninho, zaino, com pequenas manchas brancas; fubá (bras.), de pêlo branco puxando a azul; fumaça (bras.) de pêlo vermelho tirante a prêto; fusco, de pêlo escuro, prêto; gaiola, de chifres em forma de meia lua, e muito próximos nas pontas; gravito, que tem armas direitas e quase verticais; hosco, de côr escura, com o lombo testado; jaguané (bras.), que tem branco o fio do lombo, prêto ou vermelho o lado das costelas e de ordinário branca a barriga; laranjo, de côr de laranja; listão o que tem no dorso uma listra de côr diferente da do resto do corpo; lobuno, de pêlo escuro e um tanto acinzentado como o do lôbo; lombardo ou lompardo, negro com o lombo acastanhado; machacá (bras.), mal castrado; malacara (bras.), de testa branca com listra branca do focinho ao alto da cabeça; mal-armado, de chifres defeituosos; malesso, que tem mau sangue; malhado ou lavrado, listrado, betado de prêto e branco, ou manchado ou raiado de castanho claro e escuro; mascarado, de cara branca, ou que tem uma grande malha na cara; meano, que tem branco o pêlo dos órgãos reprodutores; meirinho, diz-se do gado que no verão pasta nas montanhas, e no inverno, nas planícies; melanuro, que tem cauda preta; mocho, sem chifres; mogão, de chifres sem ponta; moico (reg.) privado de um dos chifres ou de ambos; moreno, menos avermelhado que retinto; mouro, prêto salpicado de pintinhas brancas; nambigu (bras.), o que tem orelhas fulvas ou amarelas; nevado, que algumas manchas brancas; nilo (bras.) com a cabeça metade dela branca e o resto do corpo de outra côr; oveiro, de malhas no corpo; pampa, de cara branca, ou malhado, no corpo inteiro; parrado, de orelhas caídas; pinheiro, de chifres direitos; pintarroxo, pintado de castanho-claro; pombo, branco ou camurça, com olhos brancos; punaré (bras.) amarelado; rabicho, sem pêlo na extremidade da cauda; retinto, que tem côr carregada ou pêlo semelhante ao dos cavalos castanhos; rosado, branco, mesclado de amarelo, vermelho ou prêto; rouxinol, da côr do pássaro de igual nome; salino, com o corpo salpicado de pintas brancas, pretas ou vermelhas; salmilhado (bras.), salpicado de branco e amarelo; silveiro, com malha branca na testa, tendo escura a cabeça; torrado, que têm o pêlo negro do meio para baixo; taruno, mal castrado e que ainda procura as vacas; troncho, a que falta uma orelha; vareiro, que tem o corpo mais comprido do que é vulgar; vinagre, de pêlo castanho claro, tirante a rubro.
JOÃO CHIARINI
Fonte: JORNAL DE PIRACICABA (Piracicaba/SP), 01 de Outubro de 1964, 1o. Caderno, pág. 01
segunda-feira, 14 de outubro de 2024
A Lenda do Boi Santo
(...)
O carater sagrado domina a base psicologica da "Lenda do Boi Santo", tal qual é contada pelo povo de Campos de Jordão e conforme o texto da autoria de João de Sá. ("Pequena monografia de Campos do Jordão", sem editor e sem data).
✤✤✤✤✤
Um monge esmoler que andava em peregrinação, colhendo donativos para a construção de uma igreja - que deveria ser edificada em Pindamonhangaba - bateu na porta de um rico fazendeiro, que vivia no alto da Serra da Mantiqueira, e que possuía centenas de cabeças de gado, e pediu-lhe um óbolo. Negou-o o fazendeiro e ainda ameaçou o religioso, expulsando-o de suas terras. Continuando na sua peregrinação, notou o monge, ao entrar nas matas, que vinha sendo seguido. Temeroso, porque havia naquele muitas onças, recomendou-se a Deus e esperou a Sua Misericordia. Parando junto a uma fonte, viu que era seguido por um boi muito bonito, que se aproximou dele e lambeu-lhe as mãos. Tranquilo, o monge continuou a sua caminhada, sempre seguido pelo animal e, assim, entrou na cidade. A cena despertou a curiosidade popular e inumeras pessoas acompanharam o religioso. Este, por mais que enxotasse o boi, não conseguia demovê-lo do seu proposito, que era acercar-se sempre do monge. O povo achou que o boi era movido por uma força divina, para ser vendido em benefício da igreja, compensando desse modo, o mau tratamento que o fazendeiro dispensara ao sacerdote, quando este lhe pediu um auxilio. Posto o boi em leilão, o primeiro arrematador deu-o à igreja para novo leilão, o mesmo fazendo o segundo e o terceiro e, assim, sucessivamente, até que o boi santo, muito velho, morreu, tendo dado, porem, antes disso, dinheiro mais que suficiente para construção da igreja.
Fonte: DIÁRIO DE SÃO PAULO (São Paulo/SP), 08 de novembro de 1959, pág. 09
domingo, 13 de outubro de 2024
A cabeça da jiboia
A cabeça da jiboia para atrair mulher
(Crendice ouvida no Amazonas e Pará)
ALBERTO CANELAS FILHO
A jiboia (Constrictor constrictor), grande serpente espalhada de São Paulo para cima, e muito abundante no Norte, é um reptil que na Amazonia é estimado. Os especimes de 6 metros não são muito raros e falam que já encontraram destes ofidios de 8 metros de comprimento. A jiboia como a sucuri, não possui veneno, mata a vitima enrolando-se-lhe no corpo e moendo-lhe os ossos, para depois degluti-la.
Chega a engulir animais do tamanho da jaguatirica e não ataca o homem. É lerda, habita na floresta, e durante o dia, quase só descança ou dorme. O povo diz que o seu "bafo" produz feridas terríveis, e tambem que quando este reptil fica velho, atingindo proporções enormes, ele passa a viver quase que somente na agua.
A respeito da jiboia, na Amazonia há diversas lendas interessantes. Aliás, sobre cobra há muita crença, pois ela representa a perfídia e a traição. O fato da Bíblia contar o caso de Adão e Eva, motivado pela serpente, os povos com religião fundamentada nesse livro, têm todas as cobras, mesmo as não venenosas, como a maldade personificada. Mas respeitam-nas porém, devido a astucia e poderes sobrenaturais que lhes atribuem, como tambem repelem-nas pela sua forma horripilante. Todos nós sabemos, que a grande fealdade causa admiração, respeito e medo.
Contaram-me no Amazonas e Pará, que a jiboia fica de emboscada na florestas; passando ainda que longe, um animal de vulto medio ou mesmo o homem, sente uma força que o atrai para um determinado ponto, tenta ir embora, mas qual, fica meio desnorteado até ir parar direitinho onde a cobra está. Tambem me contaram, que para se atrair mulher, basta levar no bolso uma cabeça embalsamada de jiboia. É tiro e queda, mulher daí sobra...Liguei uma crença à outra: nas duas há o fascínio da jiboia. A forma falica do reptil, talvez tenha induzido o caboclo a formular e aceitar a segunda crendice. Coibido pelo sentimento de pudor e pelos preconceitos morais, religiosos e sociais - que se orientam pelo super égo - de mostrar-se nas partes pudicas às mulheres, então o inconsciente do homem simples da mata, ou mesmo da cidade, fez esse impulso se exteriorizar transformado.
Como toda cobra pelo seu olhar fixo e aspecto repugnante, causa terror, principalmente as grandes, a vítima fica apalermada de medo, como se estivesse magnetizada, provindo disto que a jiboia atrai a presa mesmo de longe. A primeira crença se entrosa na segunda, que procuramos explicar pelo fenomeno psicanalítico da transferencia.
Vi um amansador de jiboia no cais de Belem do Pará; domesticava em pouco tempo, os filhotes já grandinhos (com cerca de 1,5 m) para vende-los depois, É costume no Norte todo, usarem este ofídio nas casa, para a exterminação de ratos, prestando assim um bom serviço ao homem. Apesar da jiboia ser muito mansa, quando ela vai atingindo seus 4 metros, soltam-na no mato. Lá perto do famoso "Ver-o-Peso", vendiam cabeças preparadas de filhotes de jiboia, (sendo menores são mais faceis de se carrega-las no bolso) para quem quisesse se por à "D. Juan". O caboclo e o morador inculto e mediocremente culto da cidade, acreditam nessas crendices.
Conheci um pratico dos rios Madeira e Amazonas, que me mostrou uma cabeça de jiboia, que ele trazia consigo e que dizia lhe dar muita sorte com o belo sexo; pois, se não me engano, já era casado quatro vezes...
Fonte: O PAULISTA (São Paulo/SP), 03 de Março de 1959, pág. 06
sábado, 12 de outubro de 2024
Gado Bagual
Como na maior parte das regiões de população escassa e abundantes pastagens naturais, a criação de gado em Mato Grosso é quase que totalmente extensiva.
Os campos são enormes e nem sempre limpos. Há zonas de cerrado e cerradão onde, com a falta de costeiro, o gado torna-se arisco, ligeiro, e por fim bagual ou alçado.
Bagual é o nome que se dá ao gado bravio, que já não obedece mais ao homem - não dá rodeio. Cria-se à lei da natureza. O sal, encontra-se nos barreiros. Procuramos nestas linhas descrever uma batida de gado bagual, como é feita "em baixo da serra", região variadíssima, que compreende os contra-fortes e fraldas das serras de Amambahy e dos Baús, até se perderem nos Pantanais. Nesse serviço o peão matogrossense, quase desconhecido, exibe toda a sua perícia de campeiro.
O bagual em lugares onde é perseguido, passa os dia na crôa dos cerradões e nas matas; só sai de noite para beber água e pastar nas cabeceiras. Assim, os bagualeiros escolhem as noites para trabalhar, de preferência as de luar.
A comitiva nesse serviço nunca é muito numerosa. Compõe-se geralmente de cinco a seis peões. O encarregado escolhe um retiro ou faz um rancho para centro de suas operações. O crepúsculo é a hora de sair para o campo, seguindo os peões em fila, o mais prático na frente; vão de cabeceira no passo do matungo, contra o vento e num silêncio quase fúnebre.
Avistam afinal u'a manada que está "branqueando" a cabeceira; param, consultam-se, discutem e deliberam à meia voz o que vão fazer. Aproximam-se agora no passo do animal e alerta sempre. Quando as rezes dão sinal de ter percebido qualquer coisa, levantando alto a cabeça, a peonada dá uma "arrancada dura" para logo alcançá-las. A orilha do cambuaval, impenetrável ao cavalheiro, fica às vezes a menos de 300 metros.
Daí em diante cada um trabalha para si; tem que alcançar a rez que escolheu, ou que estiver a geito, laçando-a e maneando-a, o que não se faz sem agilidade ou presteza. "É moço! Sou índio que sahio em cima de qualquer tucura, orelhano, lasso e, quando ele amontôa no estirão, boleio a perna de cima do arreio, aperto e já tô, maneando". É assim: quando a rez cai no estirão, pulam do pingo, que fica chinchando, e apertam-na antes de ter tempo de levantar. E dizer, seguram o pé que está por cima, ou o rabo passado por uma das pernas. Maneiam agora, amarrando os dois pés de encruzado, os dois pés a uma das mãos, ou ainda um pé ou u'a mão encruzados. Para isso trazem um peador na cintura, amarrado com um nó fácil. Em seguida reunem-se todos no lugar de partida, de onde ajuio o gado. Algum extraviado toca a capoeira para orientar-se. É um som que se produz assoprando com força num vazio feito com as duas mãos. Ouvindo-o os companheiros respondem, dando assim uma direção ao perdido.
Reunidos, amarram as rezes pegadas a qualquer árvore forte mais próxima - é o tambo. A operação chama-se tambear e consiste em amarrar a rez ao pau por meio de um maneador. Dão umas quatro ou cinco voltas de maneador em roda do pescoço ou chifres do bagual e outras tantas em volta do tambo, passando pelas primeiras. As voltas devem estar todas certas. Durante a noite podem dar mais de uma batida e muitos peões não se satisfazem em lassar uma rez só.
De dia uma partida de bois de carros amestrados, vai de lugar em lugar, onde estiverem tambeados os baguais, que são ajojados pelos chifres ao pescoço do boi manso. Costuma-se aparar as aspas dos baguais para que não machuquem seus condutores.
Vão assim, meio contrariados, até a fazenda ou rancho onde são carneados para o consumo ou para fazer charque. O bagual amansa dificilmente.
FREDERICO LANE
Fonte: SEMANA NACIONAL (São Paulo/SP), edição 009, março de 1956, pág. 60.
sexta-feira, 11 de outubro de 2024
Sobrenome Assefa
Sobrenome amárico que significa "do leste", isto é, aquele que mora no leste ou provém do leste. Típico da Etiópia.
quinta-feira, 10 de outubro de 2024
quarta-feira, 9 de outubro de 2024
terça-feira, 8 de outubro de 2024
Um caso de escravização indígena no Império do Brasil
De uma carta escripta do Amazonas extrahio a Folha Nova os seguintes tópicos:
"No princípio de cada enchente do rio Negro, sahem, annualmente, cerca de duzentas canôas em que os seringueiros mandam buscar escravos.
N'essas canôas vai grande quantidade de missangas, agoardente, etc.
Quando chegam acima da cachoeira negociam com os tuchauas, que, em troca, lhes entregam os prisioneiros feitos em guerra com as tribus inimigas.
É calculado de setecentos a mil o numero dos indios que, annualmente, descem o rio, amarrados nos fundos das canôas.
É uma verdadeira reproducção das scenas que antigamente se passavam na costa africana."
Fonte: A FEDERAÇÃO (Porto Alegre/RS), 18 de Junho de 1884, pág. 01, col. 03
segunda-feira, 7 de outubro de 2024
O folclore caipira agrícola da Lua
(...) Lua com til, pronuncia o nosso habitante rural, anota aquele autor. Relativamente a uma área que abrange o centro e o sul do planalto paulista, Aluisio de Almeida registra as informações que "os velhos em seu saber feito de experiencia", "zelosos guardiões da tradição", proporcionam àqueles todos que os inquirem. Para estes, "a lua nova é a conjunção mais importante". Nesta fase "começam a crescer os cornos, palavras que os antigos iletrados sabiam. Hoje dizem apenas o arco da lua". Muitas das influencias da nova são atribuídas ao quarto crescente. Por outro lado, as influencias da lua cheia assemelham-se às do minguante. A fase da lua vale durante três dias antes e três dias depois. Por nosso lado, já ouvimos, de gente muito antiga, que a "força" da nova são quatro dias antes e quatro dias depois, no que toca à influencia sobre o tempo. Nesse espaço de tempo, encontra-se sempre a maior probabilidade das perturbações. Abramos um parêntesis para registrar que as grandes chuvas que cairam sobre a Capital bandeirante em dezembro do ano (1960), causando tantas desgraças e tantos prejuízos, tiveram início na nova de dezembro, que caiu no dia 17 daquele mês. Fechemos o parêntesis. Quatro dias antes e quatro dias depois, ou três: neste período estaria a maxima influencia de qualquer das fases da lua, fosse qual fosse ela. Anota Aluisio de Almeida que o nosso homem rural prefere dizer quarto crescente e para o quarto minguante usa o verbo calar e o substantivo calação.
Na lua nova, não costumam plantar milho nem feijão, de vez que o coró, comum às duas plantas, as estragam. Como o arroz perfilha em muitos caules, esse pode ser semeado, sem perigo de prejuízo. A proposito, lembra que o coró que dá no arroz, comendo-lhe da semente o coração, é o mesmo que os índios comem. Coró de pau piuca, que a brugada mistura com mel de pau e "passa para os peitos", segundo versão de antigos sertanejos. O milho e o feijão são deixados para plantar no quarto crescente. Nesta fase da lunação são roçados os pastos e plantados o inhame, a mandioca e a batatas. O cipó não fica quebradiço e portanto é ocasião oportuna para amarrar as cercas. As galinhas devem ser postas a chocar. É na lua minguante, ou calante, que se cortam as madeiras e taquaras, para ficarem imunes ao caruncho e durarem "um século". O fruticultor possui nesta fase o melhor ensejo para enxertar suas plantas.
Até no reino mineral influi a lua nova, Não serve para determinadas obras; as pedras não ficam bem ligadas, num tanque, por exemplo; solta-se o reboco e o barro abre-se em mil e uma rachaduras. No quarto minguante o fabricante de tijolos ou ceramica utilitaria, tira o barro, deixando-o em descanço à sombra, durante muitos dias.
Estudando o assunto desde 1946, e pelo menos até 1959, o sr. Salim Simão chegou à conclusão que nenhuma influencia exerce a lua sobre as semeaduras, as chuvas, as colheitas, a conservação dos produtos, o crescimento dos vegetais, a produção e o corte das madeiras. Baseado em observações, não encontrou qualquer relação entre as fases da lua e esta ultima operação. Quanto à influencia decorrente da claridade da luz refletida por ocasião da lua cheia, lembra que essa claridade recebida pela terra é inferior à de uma vela, o que a luz do sol é meio milhão de vezes mais poderosa. Quanto a este aspecto, pois, seria descabida qualquer justificação. Quanto à influencia da lua sobre a seiva, atraindo-a e elevando-a na arvore, tambem aí nada encontra que justifique. Em uma planta de um metro de altura a ação da lua não poderia elevar a seiva mais de 0,1 de micro. Sabendo-se que o micro corresponde a um milesimo de milimetro, pode ser aquilatada da inutilidade da ação lunar. Em qualquer fase da lua a arvore derrubada pode ser atacada por insetos, ou melhor, por brocas. O que é preciso é levar em consideração a especie cortada, sua idade, a época do corte e a presença de insetos, antes de tudo atribuir à lua. Existem especies de madeira mais apreciadas pelos insetos, sendo que a parte branca da madeira - o alburno - é mais atacada que o cerne. O alburno contem amido e substancias açucaradas, enquanto o cerno possui tanino.
O mesmo autor, em outra oportunidade, teve ensejo de reproduzir as opiniões de varios tecnicos que se dedicaram à procura da verdade, no que tange à influencia ou não, das fases da lunação. A maioria contraria a aceitar a crença popular, positiva; alguns concordam em dar razão ao que povo pensa e admita. Examinaremos a opinião de dois destes ultimos. Para Kolisko é possivel a influencia da lua na oportunidade da semeadura e da germinação das sementes. Experimentando com ervilhas, couves, feijões, alfaces e tomates concluiu que melhores eram as semeaduras realizadas dois dias antes da lua cheia. O mesmo resultado foi obtido com nabos, beterrabas, cenouras.
Convenceu-se mais que a semeação feita antes da lua cheia superava em 50% a 60% as executadas em outras fases. Outro experimentador que chegou a resultados positivos foi Azzi. Ele averiguou que a alface semeada na lua minguante desenvolvia-se muito bem, ao contrario da semeada na crescente, que florescia em duas ou três semanas. Assim tambem o rabanete: semeado na crescente, floresce em quinze a vinte dias; se na minguante, esse prazo prolonga-se até cento e vinte dias. As cebolas semeadas na crescente apresentavam bifurcação e floresciam, ao passo que as da minguante produziam belos bulbos. Afirmava Azzi que "o período que vai da lua nova até a cheia age no sentido favoravel ao desenvolvimento vegetativo". Encerrando este artigo, dizia o sr. Salim Simão que voltaria a fazer referencias, "com todos os dados obtidos, no sentido de demonstrar que a ação da lua, não possui tanta influencia como querem muitos lhe atribuir". Se não possui a lua tanta influencia, é que alguma interferencia o autor admite existir.
De anos a esta parte a produção agrícola, dizem quase todos, tem caído bastante, de maneira a justificar, em parte, a grande alta do custo de vida. Por que essa queda? A varios motivos pode ser atribuida. Inclusive, por parte de alguns, como velhos lavradores da região de Cunha entendem, ao abandono, por parte dos agricultores, de certas normas de "especial cautela, quais sejam sejam aquelas de atentar à fase da lua por ocasião das semeaduras. "Os mais idosos nos tem contado que muitas, lavouras não vão para diante porque já não se observam mais essas épocas, não escolhem a lua certa". Esta explicação foi registrada pelo professor Alceu Maynard Araujo, em pesquisa que entre 1945 e 1950 levou a cabo naquela tradicional area paulista. No trabalho elaborado em decorrencia de mencionada pesquisa, premiado em primeiro lugar num concurso promovido pela prefeitura paulistana, podem ser encontradas informações outras sobre a influencia da lua na lavoura, tal como a entende o habitante rural daquela região de São Paulo. Para o lavrador cunhense, a primeira semeadura do arroz deve ser feita na nova de setembro: a do amendoim na lua cheia, porque na minguante dá chôcho; milho e feijão deve ser plantados na minguante para não caruncharem; o alho planta-se na crescente; a cana de açúcar na minguante, pois na crescente bichará; a plantação da batatinha, das aguas e da seca, sempre três dias antes da lua cheia, quando está brotada, e, caso contrario, da minguante em diante; batata doce planta-se na cheia de novembro, pois plantada na minguante só dá rama; a mandioca deve ser plantada somente na crescente; a cebola é semeada na minguante e mudada na crescente, que é lua forte.
E continuam as observações feitas em Cunha. A lua, da nova em diante é forte; planta de chão é na crescente e planta de ar, que são as que frutificam fora da terra, deve ser semeada na minguante; os frutos que se apresentam rachados, os "que não aguentam crescer", resultam de floradas abertas na lua nova; a abobora, o melão, o pepino e a melancia são plantados no minguante para não bicharem; cenoura, pimentão e tomate na crescente; alface e repolho são semeados em qualquer lua, mas o transplante é feito na minguante para fecharem bem; a couve de muda é plantada na força da lua para sair viçosa, e se o for no minguante será evitado o pulgão. Na mesma região, "até para barrear casa, observam a lua. Não se deve barreá-la na lua crescente porque o barro rachará; na minguante é bom porque o barro mingua e não se racha".
Fonte: DIÁRIO DE SÃO PAULO (São Paulo/SP), 19 de março de 1961, 2o. caderno, pág. 04