sábado, 29 de janeiro de 2022

A peregrinação negreira no Rio Grande do Norte



 A peregrinação negreira no Rio Grande do Norte

Por toda a parte os mesmos. Eis o que se lê no supplemento da "Liberdade", de 30 de Dezembro de 1887, jornal que se publica na cidade do Natal:

"Onze infelizes que aqui aportaram no dia 23, sem que nada os denunciasse como escravos, sem que contra elles pesasse a mais leve suspeita de autoria ou complicidade em algum crime, foram deshumana e vilmente arrastados á policia por um empregado da mesma, que já recebeu paga dessa acção negra e perversa; onde quer que este infeliz apparecia o povo, que sabe ser altivo e nobre, quando se sente ferido em seus instinctos de brio e pundonor, apupava-o, apostrophando-o de "capitão de campo".

Activou-se uma correspondencia telegraphica desta para a policia de Pernambuco, em busca de possuidores para a pobre gente, que a todo custo se queria restituir ao tronco e ao azorrague das senzallas.

A denegação de habeas corpus foi uma nodoa para os brios deste povo, a quem já hoje ninguem póde negar a honra de ser dos mais decididos proselytos da abolição.

Intentou-se de novo o recurso perante o Tribunal da Relação. Isto parece que exarcebou a perversidade da resistencia escravista. Já a policia tem o premio da sua benemerita e philantropica diligencia.

Recolhidos a cadeia publica, ainda hoje curtem as tenebrosas agrurar do carcere todas aquellas miserandas victimas, entre as quaes se conta, para requinte de crueldade, uma innocentinha de dous annos.

Uma petição de habeas corpus enderaçada ao juiz de direito e indeferida por este que obstinadamente se recusará a ouvir os detentos, mandando que permanecessem todos em custodia.

Na informação pedida pelo juiz ao chefe de policia, este, já havia certificado não se lhe ter apresentado ninguem reclamando taes individuos como escravos, que certificara igualmente nada constar na repartição que fizesse suspeitar serem elles criminosos, fez uma carga inutil e perfida áquelles infelizes, lembrando que talvez se tivessem elles evadido do poder de seus senhores, havendo commettido algum roubo ou outro crime.

Fonte: GAZETA NACIONAL: ORGÃO REPUBLICANO (Rio de Janeiro/RJ), 13 de Janeiro de 1888, pág. 02, col. 01

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