terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Chacrinha e o rock and roll

 



CHACRINHA DISPOSTO A TUDO:

- O que eu sou, meu caro, é contra o fanatismo e o exagêro das môças e rapazes que cultuam o rock. Não tenho nada contra quem quer que seja, mas, francamente!, alguém pode admitir que essa juventude se entregue barbaramente a êsse ritmo selvagem e até imoral?

Abelardo Barbosa tira os óculos, coça a cabeça, abre os braços (como quem define o assunto de forma arrazadora) e se explica:

- Era preciso que alguém, no rádio, tivesse coragem para condenar essa praga do rock! Eu, Chacrinha, tomei a peito essa iniciativa. E vou brigar até o fim da minha vida contra essa invasão de um ritmo doido, que estão deixando a nossa juventude meio biruta...

E mais veemente:

- Rock só tem cantores medíocres. Veja só o Elvis Presley. O que é que êle tem para ser adorado por tantas môças? E que maneira! As meninas chegam a usar o sobrenome dêle! Escrevem cartas para as emissoras, assinando-se assim: Elza Presley, Maria Presley, Joana Presley! Para variar, tem as que passam usar os nome de Nair Sedaka, Celina Anka, etc. Uma palhaçada!

Faz uma cara de nôjo e prossegue:

- Tenho cartas em que as môças se dizem "espôsas espirituais" de Elvis Presley e outros moçoilas do rock. Isso não é ridículo? Temos cantores espetaculares, músicas lindíssimas... e uma grande parte da nossa juventude prefere o rock. Música que não entendem, mas que serve para danças lascivas. A coisa é essa!...

Chacrinha está inflamado. E o seu desabafo prossegue:

- Rock é a múscia sertaneja dos Estados Unidos. Coisa superada. Lá, ninguém mais gosta do rock. Acham-no horrível. Então, por que é que nossa gente fica batendo palmas para o rock? Não é burrice?

E seríssimo:

- Cantor de rock finge que faz sucesso. O que êle consegue é chamar a atenção, por causa das suas roupas malucas, espalhafatosas, os seus bamboleios, a sua maquilagem, etc. Valor artístico, mesmo, êles não têm nenhum! Du-vi-do!!!

Mostra uma porção de cartas e argumenta:

- Tenho feito uma campanha fortíssima no meu programa, contra o rock. E sabe o que acontece? Mandam-me cartas desaforadas! Faixas feitas em rôlo de algodão e até esparadrapo para tapar-me a bôca, tá bom? Outros escrevem dizendo que eu estou velho para entender o rock. Acham até que eu devia ser prêso! É o fim do mundo!

Engole em sêco, pensa o que prudentemente não diz e reafirma:

- Vou continuar a minha campanha. Sou cem por cento pela música brasileira. E duzentos por cento contra o rock. Felizmente o Presidente JQ vai criar uma lei, proibindo que as emissoras toquem música estrangeira (o rock, principalmente!) demais. Vai ser na base de duas nacionais por um estrangeira, no mínimo. Aí é que eu vou rir!

E definitivo e implacável:

- Portanto, abaixo o rock! Chega de Elvis Presley, que ninguém é de ferro para aguentar êsse bobão!

Fonte: REVISTA DO RÁDIO (Rio de Janeiro/RJ), edição 614, ano 1961, pág. 23-24.

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