quinta-feira, 9 de maio de 2019

Comemorações de Carnaval no Rio Grande do Sul - 1881


"Aproximam-se os trez dias mais foliões dos nossos 365 annuaes, pondo de parte o bissexto, que não passa de <<um boi corneta>> na familia. Dizem que o Carnaval é o tempo da loucura; seja. Eu por mim quero ser louco, ao menos uma vez por anno, principalmente tendo um diabinho que me tente, uma nympha, uma nayade, uma ondina que mergulhe commigo no mar delicioso dos prazeres de Mômo.

Enquanto espera-se pela festinha predilecta, joga-se entrudo, bisnaga-se as moças. Aqui é que está o melhor.

Segue-se ao esguicho uns gritosinhos, uns risinhos, umas corridinhas, uns apertinhos e até, devo dizel-o? uns beijinhos furtivos, rapidos, que abrigam a gente a deixar-se molhar deliciosamente. Ó bisnaga divina, ego te baptiso com os nomes mais doces que possas encontrar no diccionario de Cupido."

Fonte: O LÁBARO (Porto Alegre/RS), 20 de Fevereiro de 1881, pág. 04, col. 02

"NOTAS CARNAVALESCAS

Mortus est! - O promettido é... - Confronto - É o que pensamos - Passeio de gala - A Cesar o que é de Cesar - Baile da Esmeralda - Saudações.

Foi-se o carnaval! A cidade voltou novamente á sua habitual indolencia, como a cocotte preguiçosa e descuidada, que folheia as paginas de um livro de poesias lyricas, adubadas com phrases picantes.

Não mais se ouve os rufos infernaes do Zé Pereira, os guizos tradiccionaes dos arlequins e tudo o mais que constitue a orchestra galhofeira do deus Mômo.

As bisnagas recolheram-se aos bastidores, como uma artista que acaba de ser pateada. Esconderam-se as mascaras de papelão; fecharam-se os boudoirs carnavalescos e o Petit Louvre e La confiance suspenderam os annuncios de <<objectos proprios para o carnaval...>>

As ruas já não se alagam com o perfumoso liquido que escorre das fontes aquaticas, na phrase do nosso digno Paciencia, que sabe vibrar terrivel e sarcasticamente o bisturi da satyra!

Felizmente tudo acabou. Bemdicta seja a santa paz que vamos gosar.

✤✤✤✤✤

Estamos empenhados n'uma descripção por demais fastidiosa, por já ter sido offerecida ao publico pelos jornaes diarios. Entretanto, para cumprir a nossa promessa, descreveremos ligeiramente as festas do ultimo carnaval, que em nada desmereceram das anteriores.

No primeiro dia appareceram as duas sociedades Esmeralda e Venezianos representando diversas criticas, entre as quaes sobresahiam a do Leiloeiro, Primor da arte, Questões phylosophicas, Artigo oitavo e Os tres engeitados. Sem fazermos côro com a Imprensa, que censura energicamente o alarde que fizeram da critica á pressão do ar, deffendendo o laborioso artista e os incautos accionistas, concordamos, entretanto em estigmatisar a parcialidade com que as duas sociedades deixaram de fazer allusão á escandalosa proposta dos esgotos.

O Zé Pereira não é candidato á Assembléa nem pretende cadeira alguma no senado. É simplesmente um typo folião e galhofeiro, que sabe rufar estrepitosamente. Portanto, fóra a politica e viva o carnaval.

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N'este dia, coube aos Esmeraldinos a victoria, não só pelo brilhante prestito que apresentaram, como tambem porque as suas criticas eram finas e jocosas. Não podemos dizer o mesmo dos Venezianos, que apresentaram criticas atrevidas e offensivas á moral publica, levando a audacia ao ponto de destribuirem avulsos manuscriptos, naturalmente porque as typographias negaram-se a imprimil-os.

No prestito da Esmeralda notavam-se diversos carros preparados com gosto e elegancia, dos quaes especialisaremos a soberba aguia em cujo dorso, sentava-se garbosamente a gentil rainha, o carro das flores, o elephante, o carangueijo, a rosa, o lyrio e o cavallo, que ia montado por um elegante cavalleiro da idade média, e o castello.

N'essa mesma noite, além de outras diversões, houve baile á phantasia no Theatro de Variedades, continuando nas duas noites seguintes.

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Na segunda-feira, o que houve de mais notavel, foram os ridiculos esguichos da indecorosa bisnaga, que em nossa opinião, devia ser prohibida pelas posturas da Camara Municipal, que não previo esta terrivel invasão. Cumpram o seu dever, senhores vereadores e não consintam, para o anno, que os nossos collarinhos sejam attacados por esse terrivel inimigo dos nossos quarenta réis.

Perdõem-nos as mocinhas nervosas e provocadoras, se tentamos tornar vulneravel o seu Achylles de chumbo!

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Chegamos ao bom, ao magnifico, ao surprehendente. Façamos isto no estyllo das phantasias choramigas dos bardos sentimentaes. Attenção, sóbe o panno.

Eram quatro horas da tarde de 1o. de Março do corrente anno de Christo. Um sol abrasador cahia perpendicularmente sobre a cabeça da immensa multidão que se aglomerava nas ruas e nas praças, ornadas magestosamente, como para receber o nosso perpetuo e real deffensor.

Os phantaziados das duas sociedades crusavam as ruas em direcção aos respectivos pontos de reunião. O primeiro prestito que vimos foi o da Esmeralda, em que figuravam, além dos carros em que já fallamos, mais dois dignos de menção, o throno em que sentavam-se uma linda jovem e tres elegantes moços, vestidos com muito gosto e o chalet, que conduzia tres fidalgos do reinado dos Luizes em França.

Seguia-se uma fila de mais de vinte carros, ornados com gosto, conduzindo gentis donzellas e elegantes mancebos, em trajes de phantasia, que disputavam-se a primasia dos lindos costumes de epochas remotas.

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Entre os Venezianos notavam-se igualmente bellos phantasiados e um numero maior de carros, devido ao concurso da sociedade Ensaios de Dansa e um esquadrão, que na maior totalidade, compunha-se de phosporos.

D'este modo não admira não admira o triumpho. Entretanto, merecem especial menção a linda gondola, o carro da gentil rainha, o camello e o vulcão, que produziam um bonito effeito, principalmente os dois primeiros, que foram classificados os melhores do passado carnaval.

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Na noite dessa dia, a Esmeralda effectuou o seu baile de gala, com a pompa e brilhantismo dos annos anteriores.

A decoração do salão, se não rivalisava em riqueza com a dos Venezianos era ao menos digna de ser vista, pelo bom gosto e elegancia com que foi feita, no curto espaço de dois dias.

Não cabe aqui uma descripção minuciosa desta festa, onde reinou sempre o maior enthusiasmo e animação; apenas diremos que o numero de phantasiados subiu a duzentos.

No sabbado seguinte, realisou-se o baile que a mesma sociedade costume offerecer á rainha, procedendo-se antes á eleição da directoria que tem de servir no anno de 1882.

Pedem-nos para felicitar a linda jovem de cabellos louros, clara, olhos azues, que vestia de côr de havana, pelo brilhante sequito de abelhas que zumbiam aos seus ouvidos palavrinhas de mel. V. Exa. é esmeraldina enthusiasta e é por isso que o propheta Daniel entrou na furna dos leões, para dar-lhe uma prova da sua coragem.

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Aguardando o ultimo baile dos Venezianos, do qual em tempo nos occuparemos, finalisamos esta resenha, saudando as duas sociedades carnavalescas, pelas festas brilhantes que offereceram ao povo, sempre apreciador das coisinhas bôas e deleitosas e fazemos votos pela extinção das bisnagas, com licença das leitotas que gostam daquelle terrivel esguicho.

Mephistopheles."

Fonte: O LÁBARO (Porto Alegre/RS), 13 de Março de 1881, pág. 04, col. 01-03


Comemorações de Carnaval no Rio Grande do Sul - década de 1870


"SEMANA

CARISSIMAS LEITORAS

Trá... lá... lá... lá... lá... ló... tri... li... li..., etc.

Perdão, minhas benevolas leitoras, se não vos saudei com o devido respeito: sim: quero dizer, isto é, com consideração: porque ainda parece-me que viajo pelo espaço, dentro do meu incomparavel balão, apreciando lá de cima as grandes folias carnavalescas: trago a cabeça em enthusiastica dança, e só estou a ouvir a musica do Zé Pereira.

Abençoado fandango!!!...

Vamos passar um rapido golpe de vista pela resenha dos festejos carnavalescos, que tenho na minha carteira, e mencionarei o que houver de melhor cá para mim.

As taludas gazetas da terra, já declararam alto e bom som urbe et orbi, que o carnaval este anno esteve excellente; por isso é tedioso repetir a mesma cousa; porém como só fallaram n'aquillo que mais encheu o olho, isto é, que todos viram pelas esquinas, beccos, ruas e praças, eu agora vou contar, como tinha promettido as couzinhas boas, que occorreram n'esta santa cidade, durante os tres dias de folia.

Mascates, gaúchos, mulheres, zuavos, etc., já é mais que sabido que houverão; mas, vamos ao theatro, onde teve lugar um explendido masqué; ao qual assistiu uma immensa concorrencia.

Todos os amantes da pandega lá se acharam mascarados com mais ou menos gosto e luxo. Cleopatras e Cupidos não faltaram com seus respectivos Adonis. Emfim o pagode esteve completamente mascarado.

Varios mascaras agradaram pelo espirito de suas continuas graças: emquanto outros limitavam-se ao: - não me conhece?

Distinguir mascarados, quando actualmente a sociedade é em sua maior parte composta d'elles, é tarefa bastante difficil, por isso não massarei a paciencia de minhas leitoras, com uma longa descripção que lhes seria bastante enfadonha e sem interesse.

O ultimo baile foi o mais cheio de enthusiasmo e de numerosa concorrencia; e n'elle deram-se varios episodios, enevitaveis em certas occasiões."

Fonte: GRINALDA: PERIODICO LITTERARIO, CRITICO E RECREATICO (Porto Alegre/RS), 26 de Fevereiro de 1871, pág. 10, col. 01-02


"- O carnaval fôra esplendido, e immensamente conccorido."

Fonte: O CONSTITUCIONAL (Porto Alegre/RS), 11 de Março de 1873, pág. 02, col. 05

"As sociedades carnavalescas preparão-se para a grande batalha de Fevereiro!...

Começarão os preparativos da luta, e, segundo nos informão, o combate será renhido este anno.

Os Venezianos dizem que desejão sustentar os honrosos creditos que têm adquirido em tantos annos de labor, e a Esmeralda exclama que não póde deixar cahir por terra as sympathias com que se tem firmado na opinião publica.

E o caso é que ambas têm razão.

Ambas têm feito tudo quanto é humanamente possivel para agradar, e o esplendor e bom gosto de suas festas anteriores está a prometter-nos brilhante carnaval neste anno.

E assim seja. Eu cá já me ven de antemão preparando para o apanhamento dos importantissimos successos de então e tenho certeza de encher uma carteira de notas preciosas (notas escriptas)."

Fonte: ALBUM DE DOMINGO (Porto Alegre/RS), 12 de Janeiro de 1879, pág. 327, col. 02

"O movimento é geral...

Dir-se-ha que se trata de uma revolução. O peior, porém, é que os signaes da approximação da época carnavalesca se manifestão de modo a fazer reapparecer velhos usos e costumes, que pódem vir prejudicar o modérno systema de festejar o folieiro Momo.

O entrudo!... O entrudo é o peior inimigo das sociedades carnavalescas, que decididamente hão de vir a morrer um dia debaixo de uma alluvião de bisnagas e affogadas n'um verdadeiro mar de agua perfumosa.

Pois se atá já ha bisnagas que equivalem a um barril d'água!

É sempre assim:

No primeiro anno de Carnaval o querido Zé-Povinho, mais pela curiosidade do que por attenção ás prohibições e ordens da policia, que é velha, cansada e rheumatica matrona, com quem elle nunca se importou, despejou todas as vasilhas d'agua, deixou a cera de limões apodrecer nos armazens e tavernas, banio das casas as enormes seringas de folha, que erão um flagello, e mandou comprar flores para atirar nos bandos carnavalescos, sahindo em pessoa para ir vêr das esquinas desfilarem os prestitos.

E era bonito de vêr-se como elle, de bocca aberta e olhos arregalados, acompanhava aquelles carros e ria-se das pilherias do Doux, que fazia de Dulcamara, e atropellava-se e pisava-se para disputar a outrem um impresso que, embollado, sahia de um carro em direcção a uma janella, cahindo sem força na calçada.

Foi um carnaval cheio esse."

Fonte: ALBUM DE DOMINGO (Porto Alegre/RS), 09 de Fevereiro de 1879, pág. 358, col. 02, pág. 359, col. 01

"Todos rião... e com razão.

É justo que as decepções e tristuras da vida tenhão uma tregoa, no esquecimento, durante esses tres dias descuidosos, em que os apolvilhados chicards, os pretenciosos dominós, os desenxabidos prinsêses, os dengues pierrots, os detestaveis diabinhos e o detestabilissimo Zé-Pereira, que pelo nome não perca, todos cheios de frivoleiras e semsaborias, exceptuando alguma allusão feliz, que é um optimo emprego do proficuissimo - ridendo castigo mores - desempenhão importante papel nesta festa do Carnaval, que, a ser originado, como suppõem, das Saturnaes romanas, não é das heranças que mais se nos recommendão."

Fonte: ALBUM DE DOMINGO (Porto Alegre/RS), 09 de Março de 1879, pág. 385, col. 01




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