"Ainda não tinha sido fundada a Colônia do Sacramento quando Manuel Jordão da Silva, afervorado súdito português residente no Rio de Janeiro, que devia possuir, além do ânimo de aventura, muitos haveres e não menos prestígio, se abalançou a ir até à Corte a fim de oferecer-se 'para na barra do Rio Grande ou no Prata fazer uma povoação' à custa de sua própria fazenda. Isto foi em 1679. Por carta de 1698, passados quase vinte anos, ele se dirige ao Regente D. Pedro relatando por miúdo os embaraços e as trágicas circunstâncias que levaram seu projeto a total desbarato. Mas, sem se dar por vencido, embora tenha perdido embarcações, armas e quase todos os homens que recrutara, uns tragados pelo mar, outros nas mãos do gentio, ele insiste na realização de seu plano, desta vez restrito à costa do Rio Grande. Vale a pena ouvi-lo: 'Agora, meu Senhor, digo que, suposto sou bisavô de 8 bisnetos, avô de 55 netos, pai de 25 filhos, me ofereço a V. Majestade para ir povoar o Rio Grande de São Pedro, que, se há Terra da Promissão no mundo é aquela, e nele fazer a Cidade de São Pedro, e no Rio de Tramandaí, que está perto para a parte do norte, fazer uma vila, por muito abundante de ouro'. Tudo leva a crer que Jordão da Silva conhecia estas terras e suas promessas desde muito. Sim ou não, o certo é que se deve a ele a primeira tentativa de povoamento do litoral rio-grandense.
Poucos anos depois, presumivelmente antes de 1704, outra representação é feita no mesmo sentido. Subscreve-a quem tinha grande experiência destes confins, o Sargento-Mór Francisco Ribeiro, que aportara à Colônia do Sacramento em 1690, ali permanecendo até fins de 1703 ou começos de 1704. No documento em referência, já se encarece a necessidade de levantar uma povoação fortificada no Rio Grande, além de outras que tornassem 'fácil a comunicação com o Brasil por todas as partes'. Como se vê, é a importância estratégica da barra que desde então começa a impressionar os prepostos de Portugal.
Depois dessa representação, outras e outras foram sendo encaminhadas, cada qual mais insistente, clamando também pelo povoamento do enorme espaço virgem que se desdobrava entre Laguna e Sacramento. Em 1714, é a Câmara Municipal da vila de São Francisco, na costa de Santa Catarina, que pondera ao governo da Capitania Geral do Rio de Janeiro: 'O Rio Grande é que seria muito conveniente a Sua Majestade o se povoar, em razão dos castelhanos se não adiantem'. Perante o mesmo governo, ao qual estavam subordinados os distritos do sul, o sargento-mór de Santos, Manuel Gonçalves de Aguiar, depõe, em 1721, sobre o que ouvira cinco anos antes, dos moradores de Laguna, e informa que alguns deles foram às campanhas do sul a fim de 'resgatar' gado, e que o patriarca Domingos de Brito Peixoto, capitão-mór da vila, indo com os seus homens até à Serra de Botucaraí em procura de prata, tivera que retroceder devido à hostilidade dos índios missioneiros que punham guarda à Vacaria dos Pinhais."
Fonte: VELLINHO, Moysés. Fronteira. Porto Alegre/RS: Livraria do Globo, 1973, pág. 11-13.
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