GAÚCHO NÃO DENUNCIA
Na minha ultima tarrafada apanhei um exemplo da nobreza do santo, que foi D. Pedro II, em comparação com o procedimento dos republiqueiros de hoje.
Republiqueiros, digo bem, porque se sapateiro vive de sapatos, o carvoeiro do carvão, o leiteiro do leite, o republiqueiro vive da republica.
Depois que escrevi a ultima 'Tarrafada', optimista como sou, procurei descobrir ao menos um caso de nobreza, praticado em nossos dias.
Encontrei-o e afinal.
Eu estava em Pelotas, a rica e prospera cidade gaúcha, passeava pelo seu encantador jardim, quando encontrei com o dr. X, distinto gaúcho, juiz no Estado do Rio Grande, ali a passeio.
- Você, que conhece meio mundo em S. Paulo, sabe me dizer quem é Orlando Campos, que se diz amigo de um meu irmão que lá reside?
- Orlando Campos... - pensei, e respondi que deixara em S. Paulo, preso e operado, o meu amigo revolucionario tenente Orlando Leite Ribeiro, mais uma victima da propalada magnanimidade do sr. Washington Luis e da sanha do Supremo da Revista, que esperou a volta dos ingenuos para lhes augmentar a pena, uma das novas jurisprudencias do collendissimo.
Sahi em prós do meu mysterioso coestadano e lá fui topar, no hotel de um allemão, com o meu amigo Orlando Leite Ribeiro, ainda convalescente da séria operação a que se sujeitara.
Abracei satisfeito o meu amigo e sahi, afflicto, em procura do dr. X.
Encontrei-o e fui franco.
- Doutor, encontrei a pessoa de quem me falou: é o revolucionario tenente Orlando, que teve a imprudencia de procurar conhecel-o, sabendo-o irmão de um seu amigo.
Apello para o seu cavalheirismo, não denunciando o rapaz, pois só amanhã ou depois elle alcançará a fronteira, em busca da hospitalidade uruguaya.
E o dr. X respondeu-me:
- Vê-se logo que o senhor não conhece os rio-grandenses; gaúcho peleja em luta franca, e não é capaz de denunciar quem quer que seja!
- Aqui é commum procurar o vencido acoitar-se em casa de adversario, até que a situação se normalize... Póde ficar socegado: o papel não se rebaixa ao papel de delator.
Sahi com o meu coração duplamente satisfeito: confiante na salvação de um amigo e confortado pelo procedimento nobre de um patricio gaúcho.
FIDELIS LEAL"
Fonte: DIARIO NACIONAL: A DEMOCRACIA EM MARCHA (SP), 07 de Setembro de 1928, pág. 06, col. 01-02
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