José Ramos, vulgo Bandoleiro Ramos ou simplesmente Ramos, apareceu na Vila do Capão do Leão
por volta de 1923 em razão dos acontecimentos da revolução política que assolou
o estado naquele ano. Identificado com o Partido Libertador de Assis Brasil,
Ramos teria sido um dedicado militante dos maragatos em terras leonenses, não
necessariamente um ladrão, mas um homem violento que resolvia suas rivalidades
pessoais e políticas na adaga e na bala.
Procedente do município de Piratini era concubinado
com uma mulher de nome Auta que vivia
no pé do cerro e que prestava serviços em casas de família. Tinha como ofício
declarado o de segeiro. Trazia uma amizade muito próxima com um sujeito de
apelido Lacaio (Arcângelo Lopes Penedo),
que agia como seu cúmplice direto. Ambos eram considerados pelos moradores da
vila pouco dignos de confiança. Em
1926, Ramos e Lacaio foram acusados da morte de Calvino da Rocha, trabalhador
da Pedreira. Entretanto, o inquérito foi prejudicado por intervenções
superiores, pois Ramos seria apadrinhado de importantes figuras políticas da
região.
O fato de se envolverem em balbúrdias era algo
conhecido da polícia local. Só que na noite de 06 de Agosto de 1927, aconteceu
o mais sórdido dos crimes atribuído a Ramos e seu cúmplice Lacaio. Três homens,
José Inácio da Silva, Laureano Garcez e Francisco Pio Regueira, que tinham como
profissão compra e venda de gado vacum,
desapareceram misteriosamente naquela noite do galpão que pernoitavam na
chácara do senhor João Trindade. Na
mesma data, durante a tarde, os três negociantes tiveram um quiproquó com Ramos
e Lacaio defronte ao armazém do senhor Moreira. O assunto da desavença seria o
ex-presidente (governador) do estado, Borges de Medeiros.
Inicialmente, o desaparecimento foi encarado pelo
chefe da polícia local como uma possível fuga dos três homens em razão de um
calote que teriam dado a terceiros. Contudo, os dias se sucederam sem saber-se
do paradeiro dos mesmos. Entretanto, um forte temporal aconteceu entre os dias
12 e 13 de Agosto em Capão do Leão. Com o forte volume d’água ocasionado pelas
chuvas, o arroio São Tomé transbordou em alguns trechos e a enxurrada transportou
matéria orgânica que tende a se depositar às margens e nas partes mais rasas. O
que era para ficar escondido e sepultado nas profundezas do arroio veio à tona,
literalmente.
Na manhã do dia 15 de Agosto, crianças que brincavam
às margens do arroio na propriedade do senhor Cristóvão Peres retornaram para
casa principal assustadas avisando os adultos que havia um homem boiando no córrego. Intrigado, o senhor Cristóvão
foi verificar e constatou que um corpo estava preso aos galhos de uma árvore
ribeirinha. A polícia foi acionada e a notícia se espalhou na vila. O cadáver
encontrado era o de Francisco Pio Regueira e este apresentava um profundo corte
no pescoço, indicando assim que foi degolado. Além disso, havia amarras em seu
corpo, o que evidenciava a intenção de fazer o cadáver submergir. A ação da
chuva fez com que o defunto fosse transportado a uma parte menos profunda.
Antes mesmo que a polícia se pronunciasse sobre o
fato do assassinato de Regueira, a comoção gerada pela descoberta do cadáver
fez com que se organizassem patrulhas improvisadas e desautorizadas em busca
dos dois outros corpos ao longo do curso d’água. Porém, não se sabia quem tinha
degolado Regueira e se os outros dois homens também tinham sido assassinados ou
mesmo poderiam ter sido os assassinos. A população de alguma forma interpretou
que o desaparecimento dos homens e a descoberta do primeiro cadáver
vinculavam-se ao mesmo evento. Talvez pela fama que acompanhava José Ramos e
seu companheiro Lacaio.
A desconfiança dos populares se mostrou correta num
primeiro momento, não no sentido de atribuir a morte a um mesmo autor, mas na
ideia de que os outros dois homens tiveram o mesmo fim e o mesmo “local de
desova”. No dia 17 de Agosto, foi encontrado no local conhecido como Cotovelo o
corpo de José Inácio da Silva parcialmente imerso no arroio. No dia seguinte,
não muito distante dali foi achado o cadáver de Laureano Garcez. Ambos os
corpos apresentavam características idênticas às encontradas em Regueira:
degolamento e amarras com pesos.
O caso ganhou espaço nos jornais da época e houve
certa crítica à polícia pelotense pela lentidão em que procedeu a investigação
sobre as mortes. Somente no dia 29 daquele mês, dois policiais foram intimar o
primeiro dos suspeitos para prestar informações, o cúmplice Lacaio. No entanto,
a reação do sujeito foi praticamente uma confissão de culpa. No casebre em que
morava, nas proximidades da estação ferroviária de Capão do Leão, Lacaio ao
avistar os dois homens da lei saiu correndo em direção aos fundos do terreno.
Acabou sendo rendido e conduzido à subintendência para esclarecimentos. Lá confessou
tudo o que aconteceu e incriminou o comparsa Ramos.
Segundo Lacaio, Ramos tinha uma zanga antiga com Francisco Pio Regueira que, aliás, tinha o
revelador apelido de Chico Ximango (recorde-se
que José Ramos era do Partido Libertador, por isso maragato). A discussão que
Ramos e Regueira tiveram na tarde do dia 06 de Agosto foi eivada de juras de
vingança e morte. Ramos planejara resolver a pendenga entre os dois naquela
noite, mas a princípio não queria intentar nada contra os outros dois homens.
Por isso, combinara com Lacaio agir na madrugada e de surpresa. Porém, a ação
de Ramos e Lacaio no galpão em que pernoitava Regueira despertou os outros dois
companheiros. Houve luta corporal e os três foram mortos por Ramos e Lacaio,
salientando que Regueira já se encontrava degolado quando os outros dois
reagiram. Lacaio acrescentou ainda que Garcez foi morto com uma facada no bucho, mas após, já com o
corpo inerte, Ramos fez questão de passar-lhe a faca no pescoço, como uma
espécie de assinatura daquilo que havia cometido. Os três mortos foram
amarrados em cordames com pesos distribuídos e levados à beira do arroio São
Tomé, onde foram jogados em distâncias diferentes. Lacaio ainda afirmou que
houve tempo para que fizessem tudo aquilo de forma muito calma, pois a região
todo dormia num breu pavoroso.
Com a confissão de Lacaio, Ramos foi imediatamente
procurado pela polícia, mas a imprensa da época admitiu que a demora em
resolver os assassinatos talvez tenha permitido ao bandoleiro tempo mais do que suficiente para se escafeder. O
cúmplice Lacaio é que não foi tão inteligente, mesmo com a notícia da
descoberta dos três corpos no arroio.
No fim de Setembro, apareceu a notícia que José Ramos
estaria escondido numa casa no Passo das Pedras. Uma patrulha local foi em seu
encalço e após um violento tiroteio em que foi alvejado o soldado Amadeu
Porciúncula, Ramos conseguira fugir para um local desconhecido. Assim passou
durante vários meses, permanecendo incógnito das autoridades, mas segundo
cronistas da época apadrinhado e ajudado
por causa de seu vínculo com os assissistas.
Segundo dizem, morreu muito velho na localidade do
Basílio, em Herval.
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