A Pedreira do Cerro do Estado pertence à União, concedida ao Estado do Rio Grande do Sul, sob administração da Superintendência do Porto de Rio Grande (SUPRG) – autarquia que veio a suceder o antigo Departamento de Portos, Rios e Canais (DEPRC). Localiza-se no município de Capão do Leão, numa elevação (cerro) que faz parte da chamada “Serra do Granito” – esta, por sua vez, integrante da Serra dos Tapes. A “Serra do Granito” comporta o 2º. maior bloco de granito basáltico do mundo e possui cerca de 4 km de extensão.O mesmo bloco se estende desde a antiga Pedreira do Sapem, nas proximidades do Cemitério Municipal Santa Tecla, e vai até o Cerro das Almas. Segundo especialistas, é um “bloco único”, como um iceberg. Isto significa que as rochas que se vem no solo são apenas parte deste monumental prodígio da Natureza. Atualmente está sendo explorada por um consórcio formado pelas empresas CBPO-Engenharia/Odebrecht, Ivaí, Carioca e Pedrasul. O objetivo da exploração é fornecer pedras para as Obras de Ampliação dos Molhes da Barra de Rio Grande.
Não por acaso, neste ano de 2010, rochas da Pedreira do Cerro do Estado estão sendo extraídas para Obras de Ampliação dos Molhes da Barra de Rio Grande. Na verdade, a exploração de agora nada mais é do que a continuidade de uma atividade de cerca de 100 anos e que está intrinsecamente ligada à história desta pedreira, do povoado que se formou ao redor dela e do próprio município de Capão do Leão. A Pedreira do Cerro do Estado (ou Pedreira do Capão do Leão, como foi muito tempo chamada)[1] surgiu em função das obras de construção dos Molhes da Barra e do Porto Novo de Rio Grande, iniciadas em 1909. Durante um século suas rochas serviram quase que exclusivamente para atender à demanda destas obras, sobretudo às ampliações e manutenções do Molhes da Barra de Rio Grande, que sempre foram necessárias e constantes através das décadas.
Rio Grande: o Porto e a Barra
O nome do Estado do Rio Grande do Sul deriva diretamente de Rio Grande – primeiro município gaúcho e que também foi o primeiro povoado português em solo rio-grandense, fundado em 1737[2]. O fato de tal primazia deve-se sobretudo ao fato de Rio Grande estar localizado no litoral e ser o único porto marítimo do estado[3]. Entretanto, seu porto não está situado diretamente junto ao Oceano Atlântico, porém naquilo denominado “Barra”. Isto é, o canal que une o Oceano à Laguna dos Patos. Esta é uma característica fundamental para entendermos o porquê da construção dos Molhes da Barra em Rio Grande.
“Molhes” (também conhecido com quebra-mar) é um tipo de construção que se assemelha a um grande “muro” de pedras que avança sobre o Oceano. Sua função é impedir que a profundidade média das águas em determinado ponto da costa seja muito pequena, o que dificultaria a navegação de embarcações de grande porte. Isso acontece porque o material arenoso derivado da Laguna dos Patos tende a depositar-se junto à foz da Barra de Rio Grande, devido à força contrária das ondas do Mar. Em consequência, formam-se bancos de areia no fundo, impedindo o acesso das embarcações ao Porto de Rio Grande, ocorrendo o risco de encalhes. Isto foi um problema histórico enfrentado por Rio Grande, desde a época da colonização.
De um texto do Engo. Paulo Medeiros Guimarães sobre a questão da Abertura da Barra de Rio Grande:
“Infelizmente, porém, o largo e profundo Canal do Norte, ao lançar-se ao mar, tinha a sua foz obstruída por uma barra (bancos de areia), através da qual situavam-se passos navegáveis, de posição variável com os ventos, com as correntes e com as vagas, e onde as profundidades oscilavam em torno de 15 (quinze) palmos. Segundo dados antigos, citados pelo engº Honório Bicalho, em seu relatório de 1883, a profundidade da barra seria provavelmente de cerca de 20 palmos (4,40m), no começo do século 19, em 1849, achava-se ela reduzida a 3,60m e, em 1883, segundo sondagens da Comissão de Melhoramento da Barra, a profundidade era apenas 2,75m. Ante a pequena profundidade e o perigo, que a travessia da barra opunha à navegação, que demandava o porto do Rio Grande e que era então, a vela...”
Desde a época do Segundo Império Brasileiro (1840-1889), não tardaram projetos de melhoria na Barra para possibilitar a navegação de embarcações de grande porte. Estudos foram feitos e alternativas foram pensadas. Entretanto, nenhuma delas se mostrou eficaz.
Foi somente no início do século XX que surgiria um grande empreendimento capaz de resolver a questão da trafegabilidade na Barra. O que possibilitaria também a construção de um novo porto em Rio Grande, dado o antigo, construído ainda no século XVIII pelos portugueses, ser dedicado somente a embarcações de pequeno porte.
Em 1905, o engenheiro norte-americano Lawrence Elmer Corthell foi incumbido pelo presidente Rodrigues Alves a dar início às obras de melhoramento da Barra do Rio Grande, o que incluía a construção dos molhes e serviços de dragagem da foz. Logo em seguida, Corthell organizou a companhia “Port of Rio Grande do Sul”, com sede em Portland, Estados Unidos. Todavia, devido à falta de capital (dinheiro), a companhia criada por Corthell não saiu do papel. Somente em 1908, em Paris, França, reunindo-se investidores norte-americanos, franceses, ingleses e belgas, foi possível obter o capital necessário à constituição de uma companhia capaz de empreender com sucesso o início das obras da Barra e do novo porto de Rio Grande[4]. Ela se chamou “Compagnie Française du Port de Rio Grande do Sul”, isto é, COMPANHIA FRANCESA DO PORTO DO RIO GRANDE DO SUL.
Mesmo assim, o Engenheiro Corthell ainda ficou como responsável contratante das obras de melhoria na Barra[5]. O presidente da companhia também era norte-americano: Percival Farquhar[6].
A Companhia Francesa contratou a execução das obras da barra e do porto com a “Société Générale de Construction”, sociedade anônima com sede em Paris, com o capital de 5.000.000 (cinco milhões) de francos, tendo como presidente o engenheiro francês Jules Quellenec, especialista em obras marítimas. Esta sociedade, por sua vez, contratou, em 21 de setembro de 1908 a execução das mesmas obras com um consórcio constituído pelas três grandes firmas construtoras - Daydê & Pillé, Fougerole Frères e Groselier[7] - também com sede em Paris.
Estabeleceu-se uma Comissão Fiscalizadora pelo Ministério de Obras e Viação Pública, à época, para acompanhar as obras.
[1] O termo exato é Pedreira do Capão do Leão (PCL), pois assim consta nos antigos documentos e é como a Superintendência do Porto de Rio Grande reconhece esta reserva mineral. Como a população leonense convencionou chamá-la “Pedreira do Cerro do Estado”, para distingui-la de outras existentes no município, utilizaremos esta denominação.
[2] Embora já houvesse estâncias de gado na região da foz do Rio Mampituba por volta da década de 1720, o 1º. povoado de facto foi Rio Grande.
[3] Poderíamos citar os portos de São José do Norte e Santa Vitória do Palmar, entretanto não desempenham funções tais como o Porto de Rio Grande.
[4] O principal acionário, todavia, foi o Banque de Paris et des Pays Bas, até hoje existente e conhecido hodiernamente como Banque Paribas.
[5] Posteriormente, por não se entender com os planos técnicos dos franceses, Corthell será dispensado da função em 1910.
[6] Foi o maior investidor estrangeiro do Brasil no início do século XX. Dentre seus empreendimentos, destaca-se a construção da Ferrovia Madeira-Mamoré, no norte do País. Farqhuar esteve em visita a Monte Bonito e Capão do Leão em 1912.
[7] Formavam a Enterprise des Travaux Genérale des Oeuvres du Port e de La Barre de Rio Grande – nome oficial do consórcio empresarial. A mais notável destas empresas era a Daydê et Pillé – firma com obras no mundo todo e responsável, entre tantas, pela construção da Torre Eiffel.
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