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quinta-feira, 8 de maio de 2008

Santa Tecla: vida & veneração


Existem várias santas católicas com este nome, porém a venerada em Capão do Leão é a “mais famosa”, com culto bastante arraigado na Península Ibérica, Itália, Grécia, Armênia, Síria e partes da América Latina. Embora Santa Tecla tenha nascido em Iconium, por volta do ano 30 da Era Cristã, na região da Licaônia, hoje parte da Turquia. As única fontes sobre sua vida e apostolado são dois escritos apócrifos: Atos de Paulo e Tecla (século II) e Atos de Xantipas, Polyxena e Rebeca (século III).
Tecla teria se convertido ao cristianismo por volta do ano 48, quando da visita e pregação do Apóstolo Paulo à cidade de Iconium. Após devotar-se à virgindade, como marca de sua aceitação à nova fé, desagradara à família e ao noivo que a perseguiram. Depois de passar por muitas provações, decidira acompanhar Paulo em suas viagens missionárias, especialmente a Antioquia da Pisídia e Mira. Morreu em avançada idade na cidade de Isauria, na Síria. Relata-se que quando de sua morte, foram enviados soldados para ultrajá-la, numa gruta em que Tecla vivia como eremita. Segundo a tradição, Tecla orou para livrar-se do novo tormento e permanecer pura. A gruta então desmoronou, deixando somente os dois braços a descoberto. Os seguidores de Tecla recolheram os braços como relíquias e transladaram-nos até a cidade de Seleucia para dar-lhes sepultura. O local logo se converteu em centro de peregrinação de cristãos armênios.
Santa Tecla tornou-se uma das santas mais populares do 1o. milênio da Era Cristã, sobretudo no Oriente, onde várias topografias remetem à mártir. Nas igrejas Armênia e Síria, os Atos de Paulo e Tecla chegaram a fazer parte do cânon bíblico primitivo. No Ocidente, já no século IV registra-se a veneração à santa nas comunidades cristãs da Gália. Mas foi na Península Ibérica que a devoção à Santa Tecla encontrou grande simpatia.
A cidade de Tarragona (Espanha) rendia grande devoção a uma “Beata Thecla Virgine”, desde o século III. Em 1117, o Conde Ramón Berenguer III libertara a cidade dos mouros e doou as terras para a Igreja. Dada a veneração intensa que os tarraconenses rendiam a “Beata Thecla”, resolveram escolhê-la como padroeira. Como não sabiam qual das “Tecla” se tratava, decidiram homenagear Santa Tecla de Iconium – por basearem-se numa antiga tradição que remetia a visita de São Paulo à cidade, supondo-se que a santa o acompanhara.
Em 1319, Dom Raymond de Avignon (nobre local) e um grupo de cônsules de Tarragona embarcaram no porto de Barcelona em direção à Armênia para buscar as relíquias da santa. Munida de uma carta de recomendação do rei Jaime II de Aragão, a comitiva fora negociar com o rei armênio Onsino e, após tratativas, adquiriu as relíquias de Santa Tecla, dando em troca 40 cavalos andaluzes, um trono de ouro, 2000 queijos de Mallorca e outros produtos. Além dos ossos dos dois braços, o rei cedera também à comitiva mais alguns ossos do corpo (os quais se consideravam perdidos). De volta à Espanha, as relíquias são custodiadas ao Mosteiro de Sant Cugat de Vallés. Porém os ossos de um dos braços seguiram até Tarragona, para regozijo da população. Em 1811, durante as guerras napoleônicas, as tropas francesas do Gal. Suchet invadem e destroem Tarragona. A pilhagem que se segue atinge a Igreja de Santa Tecla e a relíquia é perdida. Em 1814, o Mosteiro de Sant Cugat doa à Tarragona a relíquia do outro braço, para que a cidade pudesse seguir com a devoção viva. No fim do século XX, durante escavações em uma casa antiga, encontrou-se, atrás de uma parede, uma pequena arca com ossos de um braço humano. Após averiguações, certificou-se que era a relíquia perdida de Santa Tecla, extraviada durante as guerras napoleônicas. A partir deste momento, a Igreja de Tarragona passou a custodiar “os dois braços” da santa.
Outras cidades que possuem veneração especial à santa: Braga (Portugal), Santo Domingo (Rep. Dominicana), Milão (Itália), Chicago (Estados Unidos), Schamiadzin (Armênia), Maalula ( Síria) e Meryemlik (Turquia).

Personalidades que marcaram...

Brigadeiro Rafael Pinto Bandeira (1740-1795): líder militar que se destacou na história do RS nas lutas entre portugueses e espanhóis pela demarcação de fronteiras. Foi Comandante Militar da Fronteira e donatário da Sesmaria do Pavão.
Padre Doutor (1729-1813): Pedro Pereira Fernandes de Mesquita, sacerdote católico, escritor, um dos responsáveis pela criação da freguesia de Pelotas, em 1812. Em sua propriedade no Capão do Leão, construiu o Oratório de N.S. da Conceição por volta de 1780 – o mais antigo templo religioso da região.
Hipólito José da Costa (1774-1823): jornalista, ativista político, bacharel em Direito e Filosofia, criador do 1º. jornal brasileiro: o Correio Braziliense, em 1808. Sobrinho do Padre Doutor, viveu parte de sua infância e adolescência no Capão do Leão. É considerado o PATRONO DA IMPRENSA BRASILEIRA.
Sargento Caldeira (século XIX): militar negro que combateu na Revolução Farroupilha ao lado de Teixeira Nunes e do General Netto, sendo considerado amigo íntimo deste último. Viveu e morreu no Passo das Pedras, embora fosse oriundo do Vale do Taquari.
Barão de Santa Tecla (1830-1900): Joaquim da Silva Tavares era político, estancieiro e militar, tendo desempenhado papel importante durante a época do II Império, inclusive combatendo na Guerra do Paraguay. Estabeleceu-se no Capão do Leão por volta de 1880. Sua esposa, Amélia, foi uma das propugnadoras da construção da igreja centenária homônima.
Florentino Antonio dos Santos (1837 -? ): proprietário da antiga taverna com hospedaria de animais que existia na região do Teodósio e que era ponto de parada de tropeiros que vinham trazer gado às charqueadas pelotenses.
Alexandre Gastaud (? – 1940): telegrafista, influente membro da sociedade pelotense, empreendedor e ativista político, responsável pela construção da Ponte do Teodósio. Promoveu a 1ª. radiografia realizada no Brasil, na Santa Casa de Misericórdia de Pelotas, e foi pioneiro no uso de energia elétrica para iluminação.
Gabriela Gastal (1883-1976): humanista, filantropa, destacou-se como médium espírita e homeopata, alcançando renome nacional. Proprietária das terras que hoje compõem a vila de mesmo nome.
Florisbello Garcia Barcellos (1906-1958): piratinense radicado no Capão do Leão, era barbeiro, mas destacou-se como poeta popular e escritor. Teve três obras publicadas.
Elberto Madruga (1921-1985): 1º. Prefeito leonense, foi tenente do exército e contador da Viação Férrea. Vereador por seis mandatos consecutivos em Pelotas, politicamente identificado com o Capão do Leão. Responsável por grandes conquistas para a nossa terra, entre elas: Usina Elétrica, Represa Municipal e Ginásio Estadual.

Imigração Francesa em Capão do Leão - Parte IV



“Gastaud foi verdadeiro exemplo de trabalho e inventiva”.
(Armindo Beux)

Além de bascos franceses oriundos do Uruguay e colonos provenientes da Colônia Santo Antônio em Pelotas, observa-se também em Capão do Leão uma imigração francesa de caráter espontâneo, desde muito cedo. Já em 1835 encontra-se a Família Adam na Capela da Buena. Segundo Leandro Ramos Betemps, pelo menos até 1874, a imigração francesa em Pelotas é feita por professores, artistas e comerciantes.
As características do Capão do Leão do fim do século XIX – Estação Ferroviária, indústria extrativista (lenha e pedra), terrenos a preços acessíveis – anteriormente descritas em outro artigo, foram estímulos à fixação de imigrantes das mais diversas localidades no lugar, inclusive indivíduos que vinham não somente por razões econômicas, porém também por causa do perfil campestre da região. Alguns tiveram, adiante, um envolvimento muito importante com a comunidade, contribuindo para o progresso do distrito. Neste ínterim, destacam-se alguns franceses. Vejamos alguns sobrenomes: Recart, Perez (lê-se “Perrê”), Litrez, Gontran, Durand, Larré, Roux, Delaunay, Roquemaure, Lacroix, des Essarts, Gastaud, Rouget Perez, Masseron, etc. Destes imigrantes “espontâneos”, duas personalidades merecem destaque: Dr. João Rouget Perez e Sr. Alexandre Gastaud (ambos nomes de ruas no município).
João Rouget Perez foi professor e diretor da Escola de Agronomia e Veterinária Eliseu Maciel, também fundador do laboratório que leva seu nome. Desenvolveu trabalhos científicos importantes nas áreas de Parasitologia, Bioquímica, Veterinária e Agronomia. Presidiu a Sociedade Agrícola de Pelotas, além de atuar como fundador e diretor da Rádio Pelotense. Viajou à Europa várias vezes para divulgar seus estudos. Sua propriedade no Capão do Leão, datada de 1914, encontra-se localizada no km 18 da BR-293 e atualmente pertence à Família Perez Wrege. A Granja da Cachoeira, como é chamada, tem como prédio principal um “castelo” que imita uma propriedade em Paris observada pelo Dr. Rouget Perez. Aliás, ele considerava o local, por suas paisagens, semelhante à cidade natal de Lannes, França.
Alexandre Gastaud, o qual Armindo Beux em sua obra “Franceses no Rio Grande do Sul” elogia continuamente, foi uma figura ímpar. Foi varredor de escritório e caixeiro e com menos de 20 anos foi trabalhar como limpador da Estação Férrea em Pelotas. Inteligente e curioso, aprendera sozinho a operar o telégrafo, tornando-se mais tarde telegrafista daquela estação. Ascendeu até se tornar telegrafista-chefe na Companhia do Telégrafo Nacional em Pelotas. Exerceu a mesma função, como instrutor do telégrafo, em Rio Grande, na Bahia, em Belém do Pará e em vários outros lugares. Numa época em que não havia eletricidade em Pelotas, mandou buscar na Europa aparelhos e instalou luz elétrica e força na Santa Casa de Misericórdia. Mais tarde fabricou um aparelho de Raio X, realizando a primeira operação em radiografia do Brasil, em 1903. Em Capão do Leão, também fora o pioneiro no uso da eletricidade, pois tinha em sua chácara luz elétrica e água encanada com força eletrodinâmica, numa época que sequer havia um gerador público. Também foi fundador e comunicador da Rádio Pelotense, membro da Liga Operária de Pelotas (a qual sempre trazia os associados para piqueniques no Capão do Leão) e um dos responsáveis diretos pela construção da Ponte do Teodósio, em 1923. Falecera em 1940, com avançada idade. A via que liga o Teodósio à BR-293 recebe honoravelmente seu nome.

Imigração Francesa em Capão do Leão - Parte III


“Não conheço nenhum caso em que uma pessoa com vontade de trabalhar não tivesse encontrado trabalho”.
(Carl Otto Ulrich, ao tratar sobre a zona colonial de Pelotas)

O processo de imigração européia não-portuguesa no Rio Grande do Sul iniciou-se em 1824 com a vinda dos primeiros colonos alemães que se instalaram no Vale do Rio dos Sinos. Até pelo menos meados do século XIX, a imigração não-portuguesa foi feita quase que exclusivamente por alemães. Após este período, teremos a chegada de colonos austríacos, russos, polacos, italianos (sobretudo) e franceses, entre outros. No tocante aos franceses, consta que o Governo da Província criou quatro colônias oficiais: Conde D’Eu e Isabel (em Bento Gonçalves), uma em Montenegro e a Colônia de São Feliciano (atual Dom Feliciano). Entretanto, sem apoio oficial do Governo estas colônias não se desenvolveram e nem permaneceram, sendo abandonadas antes do final do século. Particularmente, no caso da Colônia de São Feliciano, Marines Zandavalli Grando afirma que 88% dos colonos abandonaram-na, rumando para a região de Pelotas em busca de melhores condições de vida. Por volta de 1880, estes franceses estabelecem-se na zona rural pelotense e compõem com alemães a Colônia Santo Antônio – que fora criada por iniciativa privada de João Pinheiro. Esta colônia acaba tendo uma sorte melhor e apresenta uma produção agrícola diversificada: uvas e vinhos (pioneirismo na zona sul), alfafa, milho, feijão, suinocultura, cevada, cereais, verduras, e mais tarde a fruticultura.
Capão do Leão à época (final do século XIX) não registra nenhum tipo de empreendimento governamental ou privado para colonização francesa. Mas possui características que são atrativas para pessoas de qualquer etnia: uma estação ferroviária que garante o transporte dos produtos agrícolas, certo mercado de trabalho na indústria extrativista (pedra e lenha) e uma grande oferta de terrenos a preços razoáveis. O conjunto destes fatores estimulou que franceses da Colônia Santo Antônio, sobretudo os da 2a. geração (filhos) estabelecessem-se no Capão do Leão. O exemplo mais visível dessa micro-migração é a Família Carret. Num documento de 1884, constam os irmãos João Baptista e Vergilino Carret como moradores do Capão do Leão, além de um João Baptista Carret Sobrinho. Num outro de 1909, veremos a compra de “uma chácara no Capão do Leão” de Antônio Júlio de Godoy Moreira, realizada por João Carret. Outro caso é de Aristin Longchamp que saiu da Colônia Santo Antônio para trabalhar nas pedreiras leonenses, na mesma época. Mais exemplos são as famílias Gastal, Carpentier, Cornetet, Ribes, Argout e Arduin. No caso dos Gastal, verifica-se que antes de 1900, já plantavam no Capão do Leão pêssegos e eucaliptos, além de possuírem uma pedreira na região da Serra do Granito. A chácara do Sr. Eduardo Gastal correspondia à atual área do CTG Tropeiros do Sul e sua residência, datada de 1906, ainda encontra-se de pé no mesmo local.
É bem provável que outros descendentes de franceses da Colônia Santo Antônio tenham se fixado em Capão do Leão e permanecido até a década de 1950, quando uma nova crise na agricultura da região fez com que novamente migrassem. Um dado fundamental é observar que as plantações de uvas e o fabrico de vinhos, que também fora uma marca de nossa comunidade na 1a. metade do século XX, iniciara-se na região de Pelotas graças aos franceses, como comprovam várias fontes. Outro elemento que ratifica a presença deste povo em nossa localidade.

Imigração Francesa em Capão do Leão - Parte II


“El criollo empezó a comprender y admirar aquellos hombres inmutables que no se arredraban ante el trabajo y los sacrificios, que lo trataba como a um igual, que empezó a vestir como el, a comer como el, porque el basco se fue identificando com el gaucho”.
(Orlando Arbiza)

A boina utilizada por muitos tradicionalistas atualmente é considerada alienígena aos nossos costumes pelo MTG, que a identifica como peça estranha à indumentária gaúcha sul-rio-grandense. O que é deveras discutível, se levarmos em conta que ninguém questiona a propriedade da bombacha. À parte estas considerações, a boina chegou às terras ao norte do Rio Jaguarão provinda do Uruguay. Também não era própria daquele país, porém uma peça que se tornara popular devido a forte presença de imigrantes bascos da Espanha e França em “tierras orientales”.
Os bascos abundaram na região do Prata, principalmente no século XIX, onde foram atraídos pela possibilidade de fazer fortuna fácil. No período 1825-1842, particularmente, o Uruguay foi invadido por bascos provenientes da França, conforme estudos de Marianela Tafernaberry da Silva. Eles vieram para trabalhar com agricultura, pecuária e construção civil, mas sobretudo nos “saladeros” (charqueadas). Deve-se lembrar que a escravidão foi extinta no país vizinho já na década de 1820 (período da independência) e com isso tornou-se necessária mão-de-obra especializada na indústria do charque. Ora, os bascos na Europa conheciam o processo de salgação de carne como nenhum outro, sendo considerados especialistas na arte. Trouxeram, além disso, técnicas novas e dinamizaram os “saladeros” uruguaios. O que isso tem a ver conosco?
Desde a época da Revolução Farroupilha, várias levas de bascos franceses do Uruguay migraram para o Rio Grande do Sul, principalmente para as regiões charqueadoras. Klaus Becker afirma que a partir de 1843 um bom número de franceses chegou à Pelotas, naquele momento uma cidade semi-abandonada devido à guerra. Segundo Fernando Osório, eles teriam organizado, inclusive, a 1a. loja maçônica que se têm notícia na cidade. Estes “franceses”, em sua grande maioria, não vieram diretamente da França, mas do Uruguay sacudido por distúrbios políticos, e eram mormente bascos franceses, de acordo com Otto Guipúzcoa. Ainda na década de 1840, surgem as primeiras charqueadas em Pelotas baseadas no sistema platino (mão-de-obra livre) e que importam “carneadores e peões bascos franceses” do Uruguay. Essa migração não cessará até pelo menos a década de 1880, quando a pecuária gaúcha estará dando sinais de clara estagnação.
Capão do Leão fazia parte de Pelotas e indissociavelmente esteve implicado neste processo. O que prova isto são alguns sobrenomes bascos que se lêem em documentos do final do século XIX e que remetem à nossa localidade: Eztia, Vantorindaguy, Berry, Behocaray, Gardey, Salaberry, Ecosteguy, Etchepary, Etchegaray, etc. É provável que outros tenham passado por aqui, principalmente no Pavão que foi área de charqueada.
O mais notório basco francês de nossa localidade, a que temos notícia, fora João Vantorindaguy, “comissário de tropeadas”, também conhecido como João Ruivo. Sua ocupação consistia comprar lotes de gado bovino para charqueadores, observando “no olho” características como: qualidade do animal, quantidade de gordura por boi, propabilidade do uso de couro e chifre, entre outros. Negociava levando gado dos arredores até à Tablada, em Pelotas.

Imigração Francesa em Capão do Leão - Parte I



“Da época dos franceses, meu pai dizia, que quem pegava mesmo no batente era o pêlo-duro”.
(De um septuagenário leonense)

Inscrita no imaginário da população, a presença de imigrantes franceses em Capão do Leão merece ser analisada devidamente. Atribui-se a estada da Compagnie Française du Port du Rio Grande do Sul, entre 1909 e 1914, na exploração de pedras para as obras dos Molhes da Barra do Porto de Rio Grande, como um fator que explicaria e comprovaria a influência deste povo em terras leonenses. Isso seria perceptível em prédios e construções. Todavia, verificam-se prédios que possuem características francesas que são anteriores a 1909. Dado isto, é necessário compreender que houve franceses em Capão do Leão e que há descendentes seus que aqui ainda residem, porém não são originários da dita companhia. Possivelmente teremos imigrantes franceses em Capão do Leão que se fixaram entre 1830 e 1950 provenientes de três raízes: do Uruguay, principalmente bascos franceses; da Colônia Santo Antônio, em Pelotas; e indivíduos frutos da migração espontânea. Cabe, entretanto, observar, antes de qualquer coisa a presença da Compagnie Française em nosso recanto.
A Compagnie Française, em suma, fora um consórcio internacional especialmente criado para as obras dos Molhes, cujo capital era majoritariamente francês, porém administrado pelos norte-americanos Lawrence Corthel (engenheiro) e Percival Farquhar (investidor). Corthel já era famoso em obras de engenharia, pois participara da fixação da barra do Rio Mississipi nos E.U.A. Farquhar possuía vários negócios no Brasil, dentre eles a construção da ferrovia Madeira-Mamoré, no norte do País. A companhia ainda contava com m corpo técnico formado por engenheiros franceses e belgas, além de burocratas. Em Capão do Leão, a companhia esteve representada pelo Dr. Claude Petitalot (francês), embora a direção dos trabalhos de extração de pedra estivesse a cargo do engenheiro brasileiro Edmundo Castro Lopes. O local escolhido para a atividade mineradora foi o Cerro das Pombas (hoje Cerro do Estado) – zona que, na época, era propriedade da Família Gastal. No entanto, era deserta, sem vias de comunicação. Dizia-se até que bem pouco tempo antes da chegada da companhia, o Cerro das Pombas foi refúgio de indígenas selvagens.
Os trabalhadores, como já apontado em outro artigo, não eram franceses necessariamente, porém brasileiros e imigrantes diversos absorvidos pela oferta abundante de emprego. Não há registros da permanência de engenheiros franceses ou belgas na localidade, após o final das obras dos Molhes da Barra. Esse pessoal estava habituado a trabalhar em vários lugares do mundo, em grandes empreendimentos de engenharia e é pouco provável que se fixasse em locais de suas empresas.
Houve ainda uma empresa estrangeira no Capão do Leão: a belga Compagnie Auxiliaire de Chemins de Fer du Brésil – responsável pela construção da ferrovia destinada a carregar as pedras até o Porto de Rio Grande, que descia do Cerro das Pombas até a sua junção à ferrovia Rio Grande-Cacequi, na altura da Vila Teodósio. Sua permanência fora curta – somente um ano (1910) – tempo necessário para concluir a obra. Com aço da empresa norte-americana S & M, os trilhos deveriam ir, conforme desejo da Compagnie du Port, diretamente até Rio Grande, sem juntar-se à antiga estrada de ferro Rio Grande-Cacequi. Entretanto, o Governo do Estado, na época, avisara às duas companhias que se assim acontecesse, esta « via alternativa » sofreria com impostos mais altos, encarecendo o custo operacional do transporte. De fato, optou-se por utilizar então um caminho já existente : a ferrovia Rio Grande-Cacequi. Contudo, chegou a iniciar-se uma ponte ferroviária sobre o Arroio Padre Doutor, a qual, citam os antigos, ainda se vêem as pilastras às margens, não muito longe da zona urbana.