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segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Antonio Luiz Vizeu


"Antonio Luiz Vizeu

A respeito do triste fim que teve este cidadão, que ha poucos mezes exercia o cargo de thesoureiro da alfandega de Uruguayana, de onde desappareceu, levando avultada somma, facto que relatamos, encontramos a seguinte noticia, em um jornal recebido hoje:

'Nas immediações da estação de Merlo, estrada de ferro de Buenos Ayres, appareceu ha dias o cadaver de um individuo que regulava ter uns 25 annos e que mostrava ter sido assassinado com diversos golpes de arma contundente na cabeça.

Algumas horas antes, isto é, na noite antecedente, esse individuo havia ceiado com um soldado de policia em uma confeitaria e saído ambos em seguida, tendo visitado diversas casas de negocio, inclusive algumas de bebidas.

Logo que teve conhecimento da existencia do cadaver, a auctoridade de Merlo fel-o remover para a commissaria de policia, onde o dr. Lango procedeu ao respectivo exame.

Nos bolsos não se lhe encontrou dinheiro nem objecto algum, mas por baixo da camisa, estreitamente unidos ao corpo por uma faixa, encontraram-se-lhe 397 bilhetes de 200$000 cada um.

Dois brilhantes que tinha na camisa tão pouco lhe haviam sido furtados.

N'um dos bolsos do casaco encontrou-se-lhe um papelzinho sujo e rôto, em cujos pedaços se conseguiu ler com muito trabalho o nome de Pedro A. Marques, Suipacha 577. Nada, porém, indicava o nome nem a procedencia do morto.

Uma das primeiras diligencias feitas pelo commissario de policia foi certificar-se si effectivamente vivia na rua Suipacha 577 o individuo cujo nome apparecera escripto nos pedaços do papel rôto.

Para esse fim mandou, pois, a Buenos Aires o seu secretario, ao qual não foi difficil dar com o sr. Marques, cidadão brasileiro que ha dois annos reside n'aquella capital e effectivamente acha-se domiciliado na casa e rua indicada.

Ouçamos agora o que a respeito refere La Nacion de Buenos Ayres, de 25 do mez findo:

'Segundo a exposição do sr. Marques, a quem vimos de ouvir hontem, depois do seu regresso de Merlo, onde foi reconhecer o cadaver, exposição que coincide perfeitamente com os dados que obtivemos do sr. commissario de policia, o finado é compatriota seu, oriundo de Pelotas, provincia do Rio Grande, e pertencente a uma familia distincta e honrada.

Se chama Antonio Luiz Vizeu e ha desempenhado ultimamente o cargo de thesoureiro da alfandega de Uruguayana, de onde fugiu levando comsigo cerca de 102,000 pesos ouro, dinheiro que lhe estava confiado.

Desde o dia 29 de julho do corrente anno, dia em que commetteu o roubo, que andava errante pelas provincias de Entre Rios, Corrientes e pelas do interior, com o nome de Armando Gracié e fugindo sempre da policia, temendo que esta o prendesse.

Chegou a Buenos Ayres a 11 ou 12 do corrente, onde casualmente encontrou o sr. Pedro A. Marques, a quem conhecia de Pelotas desde menino. Perseguido de perto pela policia da capital, que pretendia prendel-o em virtude, de requisição do ministro brasileiro, Vizeu disfarçou-se e seguiu para Merlo, sem outro fim talvez que fugir da policia.

Segundo o sr. Marques, Vizeu devia ter comsigo 7.000 pesos ouro e mais uma lettra do valor de 1.300 libras á ordem do sr. Martins Salles a 90 dias sobre Londres.

As diligencias feitas pelo commissario de Merlo sobre o assassinato e roubo de Vizeu conservam-se sob a maior reserva.

Foram presos por suspeitos o vigilante que andou com o finado durante a noite e o cocheiro de uma casa particular de Merlo, cuja roupa appareceu com manchas de sangue, sem que pudesse explicar de um modo satisfactorio a origem d'estas.

Esqueciamos accrescentar que o morto usava um brilhante de valor superior a 2.000 pesos e que não ha apparecido."

A FEDERAÇÃO (Porto Alegre/RS), 08 de Janeiro de 1892, pág. 01, col. 04

"Antonio Luiz Vizeu

Ainda sobre este nosso infeliz compatriota, ex-thesoureiro da alfandega de Uruguayana, que fugára, assassinado ultimamente na Estação de Merlo, na Republica Argentina, narras folhas do sul do Estado:

'O CRIME DE MERLO

O official de policia sr. Xisto Lujen, que, como seus companheiros de commissaria, se achava empenhado no descobrimento do crime e captura dos criminosos, deteve horas depois o cocheiro Fernando Villafanhe a que acabava de vêr com a roupa manchada de sangue.

No primeiro momento, nada se pôde adiantar.

Por suspeitas, foi preso Aleixo Gonzales, argentino, homem de 50 annos, ex-sargento do 10o. de linha.

Começou o interrogatorio pelo agente, que nada disse. O cocheiro não póde explicar satisfactoriamente a origem de sua roupa ensanguentada.

O sereno Gonzales disse pertencer o ferro achado junto ao cadaver ás officinas confiadas á sua guarda; protestou, porém, que durante á noite não viu ninguem nas suas officinas.

O vigilante Robles é casado, e foi chamada sua mulher á comissaria. Foi interrogada pelo inspector sr. Alvares.

É provavel que muito tino empregasse este funccionario, pois momentos depois a mulher de Robles o conduziu a um terreno baldio á rua Real, e ali, depois de cavar um pouco, desenterrou e dinheiro que pertencera a Vizeu, dous relogios de ouro, um punhal cabo de prata, um cheque contra o banco de Londres por valor de 1300 sterlinas, dois alfinetes de gravat com brilhantes e o chapéo da victima.

A mulher de Robles, ampliando suas declarações, disse: que seu marido, ao amanhecer do dia 24, a despertára do somno, entregando-lhe todos aquelles objectos e dizendo: 'guarda-os, pois eram de um gringo a quem acabo de matar'. Achava-se acompanhado do cocheiro Villafanhe e do sereno Gonzales.

O vigilante Robles, que tambem é ex-praça de linha, ao ouvir o depoimento de sua mulher, confessou o crime.

Si acredita que uma outra somma de dinheiro que Vizeu trazia comsigo, esteja em poder dos cumplices, porém estes continuam negando ter qualquer participação no crime."

A FEDERAÇÃO (Porto Alegre/RS), 20 de Janeiro de 1892, pág. 01, col. 05

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