<<Não sei se o facto que vou narrar-lhe já é conhecido, entretanto, em todo o caso, elle reclama energicas providencias policiaes.
<< Entre Araçariguama e o Bom Jesus de Pirapora, existe um sr. Saturnino, que ha cinco annos é reputado Santo, e a custa de sua industria, vae mansa e pacificamente, passando para a sua, o dinheiro da algibeira dos outros.
<< O sr. Saturnino tem em sua casa uma Nossa Senhora Apparecida, cuja historia, é a seguinte:
<< Fazia elle uma casa á margem do rio, e por diversas vezes via passar por sobre as madeiras do fôrro um anjo. A principio elle não acreditava que um habitante da côrte celeste lhe fizesse visitas, mas estas se reproduziram de tal sorte, que afinal convenceu-se de que não podia enganar-se tantas vezes.
<< Poucos dias depois da ultima apparição, indo elle com seu filho pescar, casualmente olhou para um ponto em que o rio despeja-se por um estreito, e vio um objecto que passava na correnteza, que nesse lugar é impetuosa. Perguntando ao filho que seria aquillo, e como este lhe respondesse que parecia um santo, o sr. Saturnino dirige-se á aquelle ponto e encontra uma imagem de Nossa Senhora! Voltando com ella, perguntou admirado ao filho: - Como eu pude ir até lá?! - Vme., respondeu o filho, caminhou pela flôr d'agua. O sr. Saturnino, nem ao menos tinha os pés molhados, e note-se, chovia nessa occasião.
<< Com este sacro achado, o nosso homem dirige-se a sua casa, quando uma sua preta céga, vem-lhe ao encontro e pergunta: O que traz meu senhor ahi? - Pois tu vês, quando és céga?! - Neste momento, respondeu-lhe: voltou-me a vista.
<< O sr. Saturnino levou a imagem para dentro, collocou-a em um altar; desde então as esmollas chovem, elle arranja, e os tolos o chamam santo.
<< Ha pouco tempo, um pobre quidum ia a Pirapora e levava 100$ rs. de esmola. Apeou-se em casa de S. Saturnino, que leva seu espirito caridoso a pontos de não cobrar a pousada, porque sabe que o passageiro ha de por força comprar alguma cousa em um armazem contiguo. Dizem que ahi elle paga-se de tudo.
<< Contando-lhe o pobre homem o motivo de sua romaria, S. Saturnino, disse-lhe que depozesse o dinheiro sobre o altar de Nossa Senhora, que o Senhor Bom Jesus, vinha todas as noites, as 7 horas tomar-lhe a benção, como poderia verificar.
<< O crente ficou. A hora marcada a cêra do altar estava acesa, esperava-se a visita, notando que os 100$ tambem estavam sobre elle. S. Saturnino teve o cuidado de fechar o crente em um quarto, recommendado-lhe que espreitasse pela fechadura quando ouvisse um pequeno rumor.
<< O nosso heróe despe-se, cinge-se com uma toalha, e com passos graves dirige-se ao altar, e toma a benção a sua mãe.
<< O pobre sugeito não queria ver o Senhor Bom Jesus sem joelhar-se, não alcançava a fechadura, e assim joelhava-se e levanta-se, até que o senhor Bom Jesus desappareceu, levando os 100$ rs. A pouca distancia da casa ha uma encrusilhada, e nesta uma Cruz, em cujos braços acha-se a historia do apparecimento da virgem.
<< A sala tambem acha-se forrada de pinturas representando milagres, além da celebre historia que em horroroso portuguez se acha escripta, e pregada á parede.
<< A pessoa que nos contou este facto e outros muitos, é fidedigna, por isso lhe communicamos, afim de que por meio de seu jornal reclame providencias a respeito."
Fonte: CORREIO PAULISTANO (SP), 15 de Agosto de 1865, pág. 02, col. 01
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