Trecho extraído de: A ALVORADA, 27 de Janeiro de 1918, p.
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“HORAS VAGAS
No Capão do Leão.
A manhã surgiu borrascosa, não
obstante estarmos em pleno verão, a risonha estação apetecível para os passeios
campestres.
O céu conservava se escuro, e
a atmosfera pesada.
Para muitos, que projectaram
de véspera excursionarem para diversos pontos dos districtos próximos, lá
nesses lugarejos onde se ouve o canto alegre da passarada disposta, e se
assiste as scenas dos nosso gaúchos não havia esperança de outro dia, em que se
visse Phebo iluminando a terra com seus raios cor d’oiro e o azul diáfano do
céu...
Mas, como a Natureza,
acompanha hoje a corrupção humana, lá pelas nove horas, quase exgottado o tempo
para se tomar passagem nos comboios da estrada de ferro, foi cessando o
chuvisco, e, com satisfacção de todos surgindo um dia esplendido, convidativo,
para esses recreios.
Havia projectado desde há
muitos dias, ir ao prospero lugar denominado – Capão do Leão – a passeio,
respirar um ar puro e saudável, em baixo das laranjeiras, admirando as
folhagens verdejantes das ameixeiras e dos pessegueiros.
A fraca chuva, de domingo pela
manhã, me desanimava, mas, mesmo assim me dirigi á estação da Estrada de Ferro,
a esperar o comboio que vinha do Rio Grande, o que não demorou muito.
Ao segundo silvo da machina,
uma enorme onda de excursionistas procurava tomar lugar, havendo confusão entre
pessoas de família que ficavam distanciadas umas das outras.
Poucos minutos de espera, e o
comboio punha-se em movimento em direção ao Capão do Leão, por onde passaria
rumo a Bagé, deixando nas estações intermediarias os viajantes.
As dez e pouco chegávamos ao
ponto desejado.
Um movimento era
extraordinário. Muitas famílias aguardavam a sua chegada, com a qual veriam
surgir pessoas de amizade que iriam passar o dia naquele pitoresco local,
talvez um dos mais belos retiros existentes.
Desci. Julgava não encontrar
conhecido algum para, melhormente gozar aquellas horas que ali passaria.
Mas, com alegria, vi junto a
mim, o caro amigo Paulino Cácêres, que após o abraço cordeal, me conduziu até
sua habitação, para o necessário descanço, apezar da viagem ser curta.
Lá deitado ainda, encontrei o
Rozenthal, cançado de um baileco que
fora na véspera.
Após uma rápida palestra, fui
convidado pelo Paulino para fazer uma visita ás pedreiras, o que aceitei, o
mesmo acontecendo com o meu amigo e companheiro de excursão Innocencio
Victoria.
Nos dirigimos ás pedreiras,
admirando aquellas belezas naturaes, enormes pedras, verdadeiras muralhas
cobertas de verdes!
A curiosidade nos levou até á
usina da Companhia Franceza, que fica quase uma légua distante da estação
ferro-viaria, tendo também visitado o 5º. posto policial ali instalado e tendo
como commissario o sr. Felippe Abarahy, com o qual tivemos rápida palestra bem
como o sr. ajudante Osorio, tendo após nos dirigido ao ponto da partida.
Eram doze horas. O amigo
Paulino, se alvorou a mestre Cuca,
auxiliado por mim, e, em breve espaço de tempo, estávamos com a bóia prompta.
Depois da refeição, e de
conversarmos sobre vários assumptos, inclusive o do baile anterior, ali
effectuado, me dirigi eu e o Victoria á residência do humanitário medico dr.
Silveira, que nos recebeu com a alegria habitual, e riso nos lábios.
Após alguns minutos de
palestra com esse digno facultativo que é ali geralmente querido, pelos seus
dotes de coração sempre á pratica do bem, fomos convidados para ver a linda
criação de finas galinhas que possue em sua pitoresca vivenda.
Tem umas duzentas aves, todas
de diversas raças o que constitue uma beleza.
Depois dessa visita á
residência do dr. Silveira, nos dirigimos á choupana dos amigos Paulino e
Rozenthal.
Quando nos entretinhamos em
alegre palestra, ouviu-se ao longe o silvo da locomotiva que nos devia conduzir
a Pelotas.
Não tardou, e ella surgiu
parando na estação que achava-se repleta de excursionistas.
Depois do tempo necessário
para o embarque dos passageiros, a machina dava o respectivo signal de partida.
Ao segundo apito, despedia me
dos amigos Paulino e Rozenthal, trazendo gratas recordações daquela tarde linda
que passei no Capão do Leão, o mais bello lugar para excursão nestes dias
calorosos, devido ao grande numero de bem cuidadas chácaras com enorme
quantidade de arvores fructiferas, onde, debaixo gozava-se a fresca brisa perfumada
e o canto do jurity...
20 – 1 – 1918
Zé da Varzea.
Que beleza de crônica, e muito apropriada no momento em que o IHGCL comemora a ferrovia e o ferroviário com Exposição na Casa de Cultura de Capão do Leão.
ResponderExcluirO trem, a estação ferroviária, o apito, o badalar do sino, a ida e vinda de passageiros, os risos, a oferta de frutas na estação, são lembranças sonoras, musicais, visuais e perfumosas que jamais se apagarão da minha memória!
Ana Maria Victoria Silva