Detalhe de uma rocha a descoberto na Pedreira do Cerro do Estado em Capão do Leão (Ano 2010) |
Trecho extraído de: DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 28 de
Outubro de 1910, seção 01, p. 11-13
(...)
Pedreiras. Duas são as pedreiras de onde
a companhia pretende extrahir a pedra necessária para as obras – a pedreira do
Capão do Leão e a pedreira de Monte Bonito – ambas na vizinhança da cidade de
Pelotas.
A pedreira
do Capão do Leão foi adquirida amigavelmente pela companhia; quanto á de Monte
Bonito, a companhia obteve imissão de posse, não tendo sido, porém, concluída a
desapropriação até á data em que nos retirámos do Rio Grande, quando ia se
proceder finalmente ao arbitramento.
Na pedreira
de Monte Bonito a rocha emerge em alguns pontos, mas está geralmente coberta
por uma camada de terra mais ou menos espessa. É um granito de grã fina, de
excelente qualidade, devendo-se notar, porém, que em alguns pontos os trabalhos
de preparação da pedreira puzeram a descoberto algumas bolsas de rocha mais ou
menos decomposta.
Juntamos
cinco photographios (ns. 1 a 5), das quaes três foram tiradas por ocasião de
nossa visita, e que dão uma idea da natureza da rocha e de modo que se
apresentam actualmente as diversas frentes ou côrtes de ataque.
Juntamos
igualmente, sob n. 2, uma planta da pedreira que nos permite apreciar o que a
companhia tem feito em Monte Bonito. Como se vê esta planta, a rocha está a
descoberto, prompta a ser explorada ou já explorada em quatro pontos, nos
côrtes ns. 1 e 2, cujos planos de base estão ambos situados na cota de nível de
80 metros, e nos côrtes ns. 3 e 4, cujas bases estão situadas em planos
superiores, nas cótas respectivas de 98m e de 103,5m. o comprimento total das
linhas de ataque é de cerca de 1.000 metros, subdivindindo-se da seguinte
fôrma:
Corte n.
1................. 210 metros
Corte
n.2..................320 metros
Corte
n.3..................280 metros
Corte
n.4..................150 metros
________
960
metros
A linha principal
de evacuação dos produtos da pedreira tem a sua estação terminal na pedreira,
no nível dos cortes n.1 e n.2. Uma linha de concordância desenvolve-se em
zig-zag e liga os córtes n.3 e n.4 á linha principal.
Passando
pela zona de exploração a estrada municipal que liga a colónia de Cangussú á
cidade de Pelotas, tornou-se necessária a modificação do traçado desta estrada,
levada a efeito pela companhia, por conta própria e em virtude de acordo com a
Intendencia de Pelotas.
Ao longo da
estrada e em volta da pedreira, a companhia creou uma verdadeira villa, com
moradias para o pessoal operário e chefes de serviço, onde fomos encontrar
venda, açougue, padaria, hotel e posto policial, e mais um hospital e uma
enfermaria de isolamento, entregues á direção de um medico, que reside na
localidade.
As
fotografias sob ns. 6 e 7 mostram dous aspectos da povoação creada em Monte
Bonito.
O explosivo
adoptado para a exploração da pedreira é a chedite, para cuja preparação a
companhia montou no local uma fabrica, que se acha funcionando. A chedite é um
explosivo novo, de base de chlorato de potassa, convenientemente misturado com
um óleo especial cuja composição ainda constitue o segredo de seu inventor.
Acham-se
concluídas as modificações destinadas a armazéns, forjas, oficinas, depósitos
de machinas, escriptorios e usina central.
Para
fornecimentos de água ás caldeiras dessa usina central, foi captada uma fonte e
canalisada através de duas pequenas bacias de decantação, para um reservatório
de 25 a 30 mil metros cúbicos de capacidade, creado num talweg apertado por uma
represa de terra, de cinco metros de altura. A instalação da usina central,
está muito adiantada. Esta usina é destinada a produzir o ar comprimido
necessário ao funcionamento dos perfuradores e á corrente electrica continua,
que tem de ser distribuída aos guindastes, motores de oficinas e bombas
centrifugas e utilizada igualmente no serviço de iluminação. A usina dispõe de
649 cavallos de força, subdivididos em dous grupos pneumáticos e dous grupos
electrogéneos. Cada grupo pneumático compõe-se de: uma caldeira Babook-Wilcox
de 81m2 de superfície de aquecimento, trabalhando a oito kilos; um motor
Garnier-Faure-Beaulieu, de 160 cavallos, a expansão Corliss; um compressor
Ingersoll-Raul. Cada grupo electrogéneo comprehende: uma caldeira e um motor,
dos mesmos typos anteriores, e um dynamo gerador de corrente contínua,
trabalhando com a tensão de 500 volts e a intensidade de seis a sete ampéres.
A água de
condensação, depois de resfriada em um refrigerador Zshokke, de 15 metros de
altura, volta novamente aos condensadores. Esse refrigerador, cuja construção
está sendo ultimada, consiste essencialmente em uma torre metallica, com uma
serie de planos inclinados invertidos ou chicanas de madeira, que a agua aquecida
vae atravessando de cima a baixo, em zig-zag, para cahir finalmente resfriada
no deposito inferior de alvenaria, devidamente cimentado. A fotografia n. 8
mostra esse refrigerante ao lado da usina central.
O material
em pregado na pedreira consiste em linhas de serviço, linhas Decauville, linhas
de transporte de energia electrica, canalização de ar comprimido, wagões de
aterro, wagonetes, balanças diversas, guindastes electricos, pás a vapor, etc.
Merecem uma rápida descripção as pás a vapor e os guindastes electricos. Vimos
funcionar uma pá a vapor “Ruston”, utilizada, na ocasião, na abertura de um
corte. Esse aparelho não é mais do que um guindaste a vapor, montado sobre um
wagão, cuja lança suspende uma enorme caçamba de 2 toneladas de capacidade. Essa
caçamba, cuja bôcca, no bordo superior, é armada de quatro possantes dentes,
póde receber todos os movimentos que lhe permitam descer até á base do corte,
avançar enterrando os seus dentes para o interior do massiço de terra e subir
novamente, raspando o talude em profundidade conveniente, enchendo-se, nesse
movimento ascensional, do material excavado que, acompanhando o movimento da
lança, ella irá depois despejar de uma vez nos wagões de aterro.
As
fotografias sob ns. 9, 10 e 11, as duas ultimas tiradas por ocasião de nossa
visita á pedreira, mostram o aspecto geral de interessante e poderoso aparelho.
Os
guindastes electricos, em numero total de 14, todos na pedreira de Monte
Bonito, serão posteriormente divididos entre essa pedreira e a do Capão do
Leão. Cada guindaste, montado sobre o seu truck, póde levantar 10 toneladas a
4,00 m de altura, com o raio de acção de 4,00 m a 8,00 m e é dotado de cinco
movimentos diversos, comandados por seis motores independentes: um motor para
orientação de lança, um para translação do truck, um para suspensão de carga,
um para arrastamento da mesma, permitindo a utilização do guindaste como
guincho, e finalmente dous motores para modificação do raio de acção do
aparelho. As fotografias sob ns. 12 e 13 mostram o estado actual do local onde
estão sendo montados os guindastes electricos.
A pedreira
de Monte Bonito está instalada para uma produção de 2.000 toneladas diárias,
com uma extensão de 1.000 metros de linhas de ataque, e por si só póde muito
provavelmente fornecer toda a pedra necessária ás obras da barra e do porto,
mas a companhia, querendo aparelhar-se para o fornecimento diário de 3.000 a
3.500 toneladas e precaver-se contra qualquer eventualidade, adquiriu uma
pedreira de reforço em Capão do Leão, onde principiou a instalar-se para a
produção de 1.300 toneladas diárias, com uma extensão de 600 metros de linhas
de ataque, que poderá ser augmentada, conforme as necessidades. Na pedreira do
Capão do Leão, a rocha é igualmente um granito de excelente qualidade, mais rica
aparentemente em feldspatho, mas de grã um pouco menos fina do que a rocha de
Monte Bonito. O único trabalho em execução, além de estudos topográficos, é o
de roçada de capoeirinhas para descobrir a pedreira, como se vê pelas
fotografias sob ns. 14 e 16, que juntamos.
Em material
já recebido e a receber, destinado ás suas pedreiras, a companhia já despendeu
a quantia de 2.580.000 francos, sendo que o valor do material recebido eleva-se
a 1.540.000 francos e o do material a receber a 720.000 francos.
Vejamos
agora como a companhia resolveu o problema do transporte da pedra das pedreiras
ao local do emprego.
Transportes da pedra. – Esse transporte
tinha evidentemente de ser feito parte por terra e parte por agua, atendendo á
situação das pedreiras aproveitáveis e á posição dos projectados molhes
separados por largo braço de mar.
Estradas de ferro. – A questão de
transporte terrestre, em estradas de ferro, passou por três phases diferentes.
Na primeira phase a companhia, apenas instalada, limitou-se a assignar um
requerimento, onde pedia ao Governo autorização para construção de uma estrada
de ferro de Monte Bonito á Barra do Rio Grande, aceitando dessa fôrma a solução
que o primitivo concessionário, cuja responsabilidade technica fora mantida,
tinha julgado mais conveniente de acordo com o seu colaborador anterior, o
conhecido capitalista e empreiteiro Sr. Pearson. Esse requerimento deu logar ao
decreto n. 7.159, de 29 de outubro de 1908, que autorizou a construção da
estrada com a bitola de 1,44 m e a extensão de 73,516 km de linha e 14 km de
desvios, limitando o seu custo á importância na conta de capital das obras do
porto e reservando o direito do Governo de, concluídas as obras, resgatar a
estrada por quantia igual á metade do custo verificado.
Na segunda
phase da questão, a Companhia procedendo a estudos próprios, reconheceu a
conveniência de reduzir a bitola a 1,00 m, mantendo dessa fórma a desejável
uniformidade na viação férrea do Estado do Rio Grande do Sul, tornando possível
a circulação do seu material rodante sobre as linhas da Compagnie Auxiliaire de Chemins de Fer au Brésil e reduzindo o
custo da estrada projectada, de modo a poder dar-lhe maior desenvolvimento que
julgava necessário. Querendo iniciar a execução de seu plano a companhia, a 23
de fevereiro de 1909, requeria a aprovação de diversas linhas de 1,00 m em
substituição a estrada primitiva de 1,44 m, dando esse requerimento lugar ao
decreto n. 7.411, de 14 de maio de 1909, que fechou a segunda phase da questão,
mantendo por um lado as clausulas do decreto n. 7.159, relativas ao custo
máximo da estrada, ao seu resgate e á porcentagem a ser levada á conta do
capital das obras do porto, e autorizando por outro lado a construção das
seguintes linhas:
1) Uma
linha-tronco de Monte Bonito á margem do Rio São Gonçalo, de acordo com as
plantas apresentadas;
2) Um
ramal ligando essa linha-tronco á Estrada de Ferro do Rio Grande a Bagé, na
vizinhança de Pelotas.
3) Um
ramal entre a cidade do Rio Grande e a Barra, partindo da referida Estrada do
Rio Grande a Bagé.
Na 3ª.
phase da questão, tendo concluído os estudos dos dous ramaes mencionados
no decreto n. 7.411, e chegado
a um acordo com a Compagnie Auxiliaire de
Chemins de Fer au Brésil, arrendatária da Estrada de Ferro do Rio Grande a
Bagé, para a duplicação desta linha, tendo além disso verificado a necessidade
da construção de uma linha entre Cocuruto, na margem leste do Canal do Norte e
o projectado Molhe Léste da Barra, a companhia requeria ao Governo, em data de
11 de dezembro de 1909, a aprovação dos seguintes projectos: 1) projecto de
ramal anteriormente autorizado de juncção entre Pelotas e a linha de Monte
Bonito ao São Gonçalo; 2) projecto de duplicação da linha da Compagnie Auxiliaire entre Pelotas e Rio
Grande; 3) projecto de ramal do Rio Grande á Barra, anteriormente autorizado,
igualmente; 4) projecto da linha do Cocuruto ao Molhe Léste.
No primeiro despacho o Sr. Ministro da Viação deixou
de aprovar os planos e orçamentos apresentados, em consequência de informações
contrarias da Comissão Fiscal das obras da barra e do porto do Rio Grande; mas
posteriormente, atendendo á petição em que a Companhia pedia reconsideração do
despacho dado ao seu requerimento de 11 de dezembro de 1909, o ministro
resolvia favoravelmente a pretensão da Companhia, estipulando, porém, certas
restricções que em nada alteraram o traçado proposto, o que deu logar a
promulgação do decreto n. 8.089, de 7 de junho de 1910, que fechou a 3ª. phase
da questão das estradas de ferro para o transporte da pedra.
O conjunto de linhas aprovadas está representado na
planta geral das obras da barra e do porto, que anexamos sob n. 3, ao presente
relatório.
Nessa planta também figura o traçado projectado da
linha de ligação de Pelotas á nova pedreira do Capão do Leão, que a Companhia
acaba de adquirir. Tivemos ocasião de percorrer o traçado projectado que, em
metade de sua extensão, é a duplicação, além de Pelotas, da linha da Compagnie Auxiliaire e apenas necessita,
quanto a obras de arte, de maior monta, a construccção de duas pontes de madeira
de 50 metros de vão sobre os arroios Capão do Leão e Fragata.
Combinando o traçado, a tinta preta ou amarela, das
estradas de ferro com a indicação a traços vermelhos do transporte marítimo,
compreende-se facilmente o plano geral de transporte que está executando a
Companhia franceza.
A pedra para o Molhe de Oéste e para o porto, virá da
pedreira do Capão do Leão, seguindo os trechos Capão do Leão á Pelotas, Pelotas
a Porto Novo e Porto Novo a Molhe Oéste; ou da pedreira de Monte Bonito,
seguindo os trechos Monte Bonito a Rio S. Gonçalo até a juncção no kilometro
8,87288 m e os trechos Juncção-Pelotas, Pelotas a Porto Novo e Porto Novo a
Molhe Oéste.
A pedra destinada ao Molhe Léste virá da pedreira de
Monte Bonito, seguindo pela linha de Monte Bonito ao Rio S. Gonçalo, sendo dahi
transportada por agua até Cocuruto e dahi novamente por terra, até o respectivo
molhe.
Qual o estado de adiantamento dos serviços em relação
ás estradas de ferro?
A linha do Capão do Leão a Pelotas com 17 kilometros
está em estudos. A linha Monte Bonito ao Rio S. Gonçalo com 21 kilometros está
prompta para o trafego e sobre ella corriam os últimos trens de lastro. A linha
Juncção-Pelotas, com sete quilômetros, está com a sua plataforma prompta em
toda a sua extensão e com trilhos assentados em mais de seis quilômetros entre
a Juncção e o arroio de Santa Barbara, onde está sendo construída uma ponte de
madeira de 56 metros, com dous vãos de 3,625 m e treze vãos de 2,75 m. Uma
fotografia sob n. 17, tirada por ocasião de nossa visita, mostra o bate-estacas
a vapor, em serviço de cravação dos esteios da ponte. A linha Pelotas a Porto
Novo, que é a duplicação da linha da Estrada de Ferro do Rio Grande a Bagé, é
dividida em duas secções separadas pela ponte sobre o Rio S. Gonçalo, onde não
foi possível fazer a duplicação da linha. A segunda secção tem 2,5 kilometros
de extensão e a plataforma está prompta em 1,5 kilometros. Na primeira secção
de 51 kilometros de extensão, a plataforma está prompta entre os quilômetros 8
e 22, 33 e 40, em outros trechos pequenos, em um total de cerca de 22
kilometros, não estando iniciadas as obras de arte, nem assentado os trilhos em
qualquer das duas secções. Na linha Novo Porto a Molhe Oéste, a Companhia tem
cerca de dous quilômetros de linha prompta, o aterro sobre o Sacco da Mangueira
está terminado e já está no local a ponte metallica de 400 metros que vae ser
montada para completar a travessia do referido sacco. O taboleiro dessa ponte
repousará sobre duas linhas de estacas metálicas, cheias, de 0,14m de diâmetro,
armadas inferiores de roscas de ferro fundido para a sua penetração no solo por
torsão, em vez de percursão, até a profundidade de 5,00m. O espaçamento das
estacas entre eixos será de 2,00m no sentido transversal e 6,00m no sentido longitudinal.
O nível dos trilhos fica a 3,30 m acima do zero hydrographico ou 2,50m acima
das aguas máximas. O taboleiro apresenta lateralmente uma saliência de 1,60m de
largura, que será devidamente assoalhada para a passagem de pedestres. A partir
da ponte do Sacco da Mangueira, a continuação dos trabalhos da linha do Novo
Porto a Molhe Oéste está dependendo da desapropriação de terrenos de
propriedade do Dr. Ernesto Otero, antigo chefe da Commisão Fiscal das obras da
barra e do porto do Rio Grande.
A linha de Cocuruto ao Molhe de Léste, tem cerca de
12 kilometros de desenvolvimento; a plataforma está prompta e os trilhos
assentados em mais de 7 kilometros; a plataforma sem os trilhos está prompta em
outros 2 kilometros. A linha é interrompida em dous trechos por terrenos de
propriedade do Dr. Ernesto Otero que teem de ser desapropriados. As fotografias
ns. 18 e 21 mostram o estado actual da estação do Cocuruto com suas linhas,
installacções diversas e depósitos de materiaes. As fotografias ns. 22 e 23 mostram
a linha interrompida no principio e no fim de uma faixa de terreno pertencente
ao Dr. Ernesto Otero e ainda por desapropriar.
Material das
estradas de ferro. – A Companhia já possue no Rio Grande, para serviços de
suas estradas, 3 locomotivas de 30 toneladas, 12 locomotivas de 20 toneladas,
150 wagões de plataforma e 150 caixas para enrocamento, no valor de 1.500.000
francos com a encomenda de 5 locomotivas de 30 toneladas e 5 de 20 toneladas,
250 wagões de plataforma e 250 caixas para enrocamento. Em trilhos, talas de
juncção e mais acessórios e taboleiro metallico do Sacco da Mangueira, a
Companhia gastou 2.300.000 francos, e em dormentes de madeira nacional,
1.200.000, até o fim de junho de 1910.