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terça-feira, 1 de agosto de 2006

Histórias Curiosas III

Nos anos 50 e no início dos anos 60, Capão do Leão, embora um distrito pelotense, possuía uma cena política bastante movimentada. Quando haviam eleições as pessoas se mobilizavam e, mesmo no dia-a-dia, identificavam-se tendências ideológicas distintas e presenciavam-se debates acalorados. A vila, aquela época, polarizava-se entre o PTB (do ex-governador Leonel Brizola) e o PSD. Quem não era de um lado, era de outro. E mesmo a pequenez do lugar, não impedia que a política fosse um acontecimento notável. Os mais antigos contam que ocorreram comícios com grandes churrascos, em lugares tão tranqüilos como o Cerro das Almas, que chegavam a agregar cerca de três a quatro centenas de pessoas.
Contudo, embora houvessem muitos brizolistas (petebistas) e peessedistas, haviam as exceções. Sem dúvida, aqueles que não se interessavam por política, porém também um grupo reduzido, mas bem conhecido: os comunistas. Eram numerosos como os "dedos de uma das mãos", mas eram conhecidos pela sua inteligência e articulação. Normalmente, auto-intitulavam-se assim e militavam no PTB, dado que o PCB era ilegal.
Com os acontecimentos que se desenrolaram no Brasil nos primeiros dias de abril de 1964, a situação de muitos petebistas ficou complicada. Em Capão do Leão, houve uma espécie de "caça às bruxas". Muitos receberam intimações para depôr ou foram visitados em suas casas por autoridades militares. Mesmo partidários do PSD passaram por isso. Inclusive, conta-se que na noite do dia Primeiro de Abril, o Exército montou acampamento na área da antiga sub-prefeitura, pois havia o boato que, em Capão do Leão, formar-se-ia um foco de resistência armada ao movimento que se instaurara no centro do país. A versão corrente era que "os brizolistas iriam invadir o paiol da pedreira para roubar munição". Fato mesmo é que muita gente teve que prestar esclarecimentos e alguns sofreram certa perseguição.
Imagine, se a situação era crítica para petebistas e peessedistas, o que dizer daqueles que sempre se denominaram comunistas?
Aconteceu então que um tenente do exército mais alguns soldados foram prender um dos comunistas leonenses. Este era um médico conhecido por seu altruísmo e educação. Seu nome era visado, pois de fato era uma figura brilhante. Entretanto, havia uma questão: conheciam-lhe o nome e a fama, não o rosto.
Logo que chegaram à residência de nosso "médico comunista", encontraram-no à frente da casa, trajando roupas simples. A casa estava fechada. O Tenente o interpelou:
- Sou o Tenente Fulano, estou à procura de uma pessoa e tenho informações que ela mora aqui. Vamos entrar e revistar a casa.
Nosso "médico comunista", calmamente responde:
- Pois não, senhor tenente. O senhor fique à vontade de fazer o que achar melhor, estou à disposição.
- Quero que a casa seja aberta, imediatamente. Caso contrário, iremos arrombá-la.
- Sim, senhor tenente. Aqui está a chave da porta dos fundos e esta daqui é a da frente.
- Muito bem, então abra-a para nós.
- Ah...senhor tenente, isso eu não faço, está aqui a chave se o senhor quiser. - diz o médico.
O tenente surpreso inquire:
- Como?! Por qual razão o senhor não quer abrir? Está escondendo alguma coisa?
Nosso "médico comunista" responde sem pestanejar:
- Ah...tenente, o patrão só deixa eu entrar dentro da casa dele quando ele está aí e convida. Caso contrário, quando ele está viajando, eu não tenho permissão para entrar. Se o senhor e seus soldados quiserem entrar, tudo bem. Eu que não contrario às ordens do patrão.
Resultado: o tenente conclui que estava falando com um simples caseiro, o sujeito em que estava à procura tinha se "mandado" e ali ele não iria conseguir nada. Acaba por ir embora e nem chega a entrar dentro da casa.
Nosso "médico comunista", pelo menos naquele momento, safa-se com brilhante argúcia.