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quarta-feira, 3 de outubro de 2018

As Cataratas do Iguaçu - Mito Kaingang


"M'Boi, criatura em forma de cobra, morava no rio Iguaçu. Ele tinha muito poder e vivia zangado. Causava todas as doenças e pragas que atingiam os povos que moravam lá perto. Estragava suas plantações, além de fazer com que os animais ferozes atacassem as aldeias.

Todas as primaveras, para agradar M'Boi e evitar sua fúria, um desses povos, os kaingangs, ofereciam a ele uma bela jovem como esposa. A moça que era selecionada para isso recebia uma grande honra, mas era proibida de amar outra pessoa, pois M'Boi era um noivo muito ciumento.

Certa vez, a escolhida foi Napi, filha de um grande cacique, e dona de grande beleza. Sabendo que traria honra para sua família, a jovem esperava o dia em que se casaria com M'Boi. Haveria uma grande festa, e membros de todas as nações amigas viriam para o casamento. Entre os convidados que começaram a chegar à aldeia, dias antes da festa, estava um guerreiro chamado Tarobá.

Pois quando Tarobá e Naipi se viram pela primeira vez, apaixonaram-se. Esquecida do noivado, Naipi passou a encontrar-se secretamente com ele nas margens do rio Iguaçu. Juntos, sentiam-se felizes: mal sabiam que M'Boi os vira e fora tomado de fúria pela traição da noiva. Ele nada fez, porém. Guardou sua raiva e continuou observando.

Na véspera do casamento, quando se encontraram mais uma vez junto ao rio, os dois tomaram uma decisão: fugir. Naquela noite, começariam as festas, com muita comida e bebida, e Tarobá deixou uma canoa preparada para que, enquanto todos dormissem, após muito dançar e beber, eles embarcariam e sumiriam navegando rio abaixo.

Tudo se fez conforme o plano. Com os moradores da aldeia e os convidados à festa profundamente adormecidos. Naipi foi encontrar o amado às margens do rio. Subiram à canoa e partiram, mas não sabiam que M'Boi os seguia. Já estavam distantes da aldeia quando ele resolveu atacar e vingar-se. Na forma de uma serpente monstruosa, ele saltou para o leito do rio Iguaçu, e abriu uma imensa cratera. As águas escoaram pelos lados da cratera, formando várias cataratas que engoliram a pequena canoa.

Apesar disso, os jovens apaixonados não morreram: Tarobá se transformou em uma palmeira, plantada nas terras junto ao alto da cachoeira. Naipi foi transformada em uma pedra, localizada no meio das águas, lá embaixo. E nessa forma os dois estão até hoje, separados pela vingança de M'Boi.

Dizem que, do alto, o jovem transformado em palmeira vê sua amada sem nunca poder tocá-la. A única coisa que pode fazer é falar de amor quando a brisa sacode seus ramos. A cada primavera, a palmeira dá flor e Tarobá joga as flores para Naipi. Elas então são levadas pelas águas e chegam à escura pedra. Naipi passa o tempo todo banhada por um véu de águas claras, vendo seu amado lá em cima, sem poder jamais chegar perto dele.

Quanto a M'Boi, a vingança não foi suficiente para acalmar a sua fúria. Dizem que ele vive escondido ali perto, numa gruta escura, vigiando os dois apaixonados, e rugindo quando as flores de Tarobá chegam a Naipi. Apenas quando surge um arco-íris é que a palmeira se une à pedra, ligados pelas sete cores. Nesse momento, os dois amantes falam de amor e suas vozes ecoam, entre o rugido eterno das águas das cataratas do Iguaçu."

Fonte: RIOS, Rosana. Volta ao mundo em 80 mitos. Porto Alegre/RS: Artes & Ofícios, 2010, pág. 215-216.