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quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Histórias de Vida V


Entrevista com a Sra. Hermelina Camacho de Corrêa
Realizada pelo autor em 12-03-2006
Referência: a entrevistada possui 102 anos e mora no interior do município


"A sra. Hermelina nasceu na Coxilha Florida e relata que se criou na 'campanha' até os 16 anos de idade quando foi morar em casa de uma família em Pelotas. Diz que a vida naquela época era muito difícil e lembra que o pai trabalhava muito na roça e várias vezes só tinham em casa angu de farinha para comer. O pai era do interior de Canguçu e ela não sabe dizer porque ele veio para a Coxilha Florida. A mãe era dos Camacho de Jaguarão, que, conforme ela, era daqueles que 'mataram e colocaram no arroio Candiotinha' (Nota do autor: informação inconclusa).

A mãe da sra. Hermelina teve cinco filhos com um sujeito chamado João Pacheco que morreu antes da sra. Hermelina nascer por causa de tuberculose. O pai da sra. Hermelina teve mais seis filhos com a mãe da sra. Hermelina que se chamava Rosalva. Dois irmãos naturais da sra. Hermelina morreram antes dela nascer. Os meio-irmãos por parte de pai, ele cita sem precisar com exatidão o seguinte: o Francisco foi para Piratini logo depois que casou e brigou com o resto da família por causa de uma herança; o José Estanislau morou no Areal, em Pelotas; a Ana ficou em Jaguarão; o Hermelino morreu anos atrás e morava perto dela; o José Venceslau morreu em Pelotas. Os outros quatro irmãos naturais foram: Hermes que morreu em Amaral Ferrador; Hildermina que morava em Pelotas; Hildalina que casou e ela não teve notícia; Hermelana que casou com o 'Quiqui da venda' (Nota do autor: informação inconclusa).

A sra. Hermelina cita várias passagens de sua juventude em Jaguarão (Nota do autor: claramente dá a entender que a sra. Hermelina não é natural da Coxilha Florida, mas de Jaguarão; todavia, seguimos com a informação inicial).

A sra. Hermelina foi com 16 anos para trabalhar numa casa de família em Pelotas na rua Andrade Neves. Lembra que a casa era grande e de uma família importante e ela trabalhou muito como lavadeira na dita casa. Tinha mais duas moças que trabalhavam com ela: uma a Negrinha (informação inconclusa) e a outra a Adelaide, que trabalhava na parte de dentro da casa. Em Pelotas, conheceu o marido, o sr. Dionísio e, depois que casaram, moraram no interior do município em vários locais trabalhando na lavoura e numa diversidade de serviços rurais - extração de lenha, produção de laticínios, produção de doces. Voltou ao Capão do Leão anos depois e sempre viveu na Coxilha Florida, pois parece que seu marido fez um acerto com sua família para adquirir a propriedade.

Ela lembra que continuaram se 'virando' em vários ofícios ligados ao meio rural. O marido fazia um pouco de tudo e trabalhou em lavoura de arroz no tempo 'forte' dos engenhos, mas também vendia lenha, manteiga, leite, queijo e frutas. Passaram muita necessidade com os filhos pequenos, mas conseguiram criar os quatro até se casarem. (Nota pessoal: Por cuidado na entrevista, percebi que ela não quis falar dos filhos, por isso respeitei).

Ela lembra também dos bailes de 'alemão' que ela gostava muito, pois tinha dança e galinha assada. Diz que a família tinha mais ligação com os conhecidos da Micaela e do Santo Amor, porém recorda que o marido vinha ao Capão do Leão para comprar banha e ferramentas. Das pessoas do Capão do Leão, ela lembra do Elberto Madruga, do Viegas e dos Traverssi, isso tempo depois. Enfática, ela afirma que passou uns cinco anos sem sair do sítio em que moravam, indo no máximo no Passo das Pedras ou na Vila Freire quando precisavam. Médico não tinha, curava-se bicheira com toucinho, banho era em bacia ou no arroio. O marido teve um tempo que passou por problemas mentais e escondia-se no mato que 'nem bicho'.

Disse igualmente que, depois de um tempo, as coisas melhoraram um pouco e o marido fez uma reforma na 'casa da frente'. Perguntei a ela acerca dos vizinhos e ela não soube listar com clareza, mas destacou muitas lavouras de trigo, sorgo, arroz e muita criação de gado bovino e ovelhas. Embora esclareça que 'tudo era muito longe'. Citou um sujeito chamado João Pinho que era retratista e que vinha uma vez por mês na casa dos moradores para tirar fotos. 

Ela comentou que se lembra muito da 'guerra' (referência à 2a. Guerra Mundial - nota nossa) e que no Santo Amor tinha um 'alemão carroceiro' que tiraram seus pertences e mandaram o coitado a pé para casa. Falou também que havia muito bandido de gado na região e relembrou vagamente a história dos 'bandoleiros do Cerro das Almas'. 

Diz que tudo melhorou mesmo quando houve a chegada da energia elétrica na região, sem precisar a época. Comprou vários eletrodomésticos e teve várias facilidades com isto. Aliás, entre várias lembranças suas, afirma com convicção que 'tudo hoje é melhor do que era antigamente'."