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segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Papa-areia e Papa-sebo

Trecho extraído de: SOUZA, Bernardino José de. Dicionário da Terra e da Gente do Brasil. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1939, p. 297.


"Papa-areia: alcunha dada aos habitantes da lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, pelos filhos da cidade de Pelotas, por eles denominados — papa-sebo.
(...)

Papa-sebo: alcunha jocosa que os habitantes das margens da lagoa dos Patos dão aos pelotenses; certamente por motivo das charqueadas (Cornélio Pires — Meu Sambará — pág. 22)."

domingo, 27 de setembro de 2015

Modelo de Brasão do município de Capão do Leão usado entre 1984 e 1988

Usado em documentos oficiais como timbre, percebe-se que ele busca adaptar graficamente os elementos presentes no brasão oficial. Devemos compreender, sobretudo, que naquela época não havia os recursos de desenho gráfico que temos atualmente.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Os doces de Pelotas na mesa de Dom Pedro II

Trecho extraído de: CALMON, Pedro. Princesa Isabel "A Redentora". Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 55.

Nota do autor do blog: curioso registro da presença dos doces pelotenses na visita do Imperador Dom Pedro II à Caçapava, um dos seus destinos de viagem, logo após a eclosão da Guerra do Paraguay, quando sua Majestade Imperial veio ao Rio Grande do Sul. Isso aconteceu em 1865, o que indica que já naquela época os doces produzidos em Pelotas possuíam alguma fama, a ponto de se dizer que "resplandeciam" sobre a mesa farta.


 "Foi em 15 de agosto que chegou a Caçapava, unindo-se ao Imperador.
   O contraste de temperamentos começou aí a definir-se.
   Com a independência de sua observação de forasteiro o príncipe espantava-se dos erros, achava a guerra desordenada, arrepelava-se de surpresas tristes.
   D. Pedro II não tinha tempo para divagações: mandava, concitava, corrigia - de chapéu desabado, o "poncho" agaloado sobre os ombros, de botas altas como um gaúcho loiro e enorme a quem os capitães guascas, de chilenas retinindo na estrada, saudavam com assombro.
   Hospedara-o um deles com fartura de mesa em que resplandeciam os doces de Pelotas, os manjares finos... O Imperador, que tinha fome, pediu feijão e carne. Explodiu a surpresa do súdito: - Que! Pois vossa majestade come carne?! Disseram-me que as pessoas reais só se tratavam a bicos de rouxinol e doces e pasteizinhos... Porque não disse antes, senhor?... Com trezentos diabos!... Ora esta!..." E serviu-lhe o churrasco.
"

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Mapa do município de Pelotas em 1911


No mapa é possível identificar o ex-4o. distrito de Pelotas, hoje município de Capão do Leão.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Rafael Pinto Bandeira e a ocupação das primeiras sesmarias na região sul do Rio Grande do Sul

Trecho extraído de: SANTOS, Corcino Medeiros dos. Economia e sociedade do Rio Grande do Sul - século XVIII. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1983, p. 50-51.


"Uma das principais causas do envolvimento de muitos em contendas e pleitos entre vizinhos confrontantes era o fato de não haver um tombo exato de cada distrito pelo qual se pudesse conhecer o verdadeiro título dos possuidores e as balizas certas das suas possessões. Por isso, o Vice-rei preconiza a existência no Rio Grande de um ministro com disposição e saúde, designado especialmente para fazer o tombamento das terras. A solução foi expressa nos seguintes termos: "... me parece seria muito conveniente que devia atender a todas as terras do Brasil se estabelecesse imediatamente no Rio Grande, despachando Sua Majestade um ministro escolhido, com gênio e saúde própria para este trabalho e com o ordenado e predicamento que for servido para tombar todas as terras daquele continente e assinalar os limites certos de cada um dos possuidores, conforme os títulos que se acharem nas circunstâncias de se poder legitimar, havendo também por devolutas todas as mais que o abuso tivesse introduzido ou o dolo e enganos confirmados na parte com que se acharem".

   Com isto pretendia o Vice-rei acabar com a grande desigualdade que vinha acontecendo na distribuição das terras. É que havia moradores que em seu próprio nome ou no de outros se achavam na posse de muitas datas para depois venderem-nas. O Vice-rei Luís de Vasconcelos tomou conhecimento também dessa situação e a denunciou ao ministro Martinho de Melo e Castro, tanto em seu famoso relatório como no documento que vimos citando. Ao tratar deste assunto, o Vice-rei escreve: "Neste gênero de negócio escandalosíssimo, há aí muitos que se têm feito proprietários da maior parte daqueles terrenos e das suas melhores situações, para os poderem vender por alto preço a outras pessoas que vão continuando igualmente na posse ilegítima, por ter sido fantástico e ilusório o primeiro título de sua concessão com que mais é com ela se contentam por ser impraticável entrar neste exame de outro diferente modo pela grande confusão e desordem em que se acham os mesmos terrenos"

   O pior de tudo é que os principais comandantes militares estavam quase sempre envolvidos não só nos negócios desonestos das terras como nos contrabandos. Era esse o caso do coronel Rafael Pinto Bandeira, comandante do continente do Rio Grande. Homem cujos feitos militares enobrecem o seu nome, profundo conhecedor da terra e da gente da região, pôde com muita coragem e bravura defender os interesses luso-brasileiros nas muitas refregas que teve com os espanhóis. Mas não podemos negar que se utilizou de seus conhecimentos não só para participar dos negócios escusos, que então se faziam para a obtenção de sesmarias, como também dos contrabandos de gado e de couros. A esse respeito expressa o Vice-rei: "Um daqueles escandalosíssimos proprietários que têm feito por este estranho modo as maiores usurpações é o coronel Rafael Pinto Bandeira que, fazendo-se absoluto e temido de todos, em razão do autorizado posto que ocupa e aproveitando-se daqueles conhecimentos que tem do país, para fazer a sua escolha livremente, se acha com a sua numerosa parentela ocupando grandes extensões de terrenos e os mais bem situados, estabelecendo com duas largas estâncias para a criação de animais e tirando de outros a utilidade da venda que faz a diversas pessoas. Para poder assim praticar com mais rebuço não lhe tem esquecido o estratagema de requerer as sesmarias em nome de outros supostos que só fazem figura no requerimento sobre o qual talvez ele pode ser ouvido como comandante da fronteira do Rio Grande, mas verdadeiramente é ele que se empossa do terreno, que o desfruta e que vende".


   Como se vê, há um desvirtuamento da instituição das sesmarias. Seus objetivos eram ocupar, povoar a terra e fazê-la produzir. Nestas condições, o sesmeiro havia de possuir algum recurso em dinheiro e escravos para cultivar a terra. Aliás, esta era uma exigência de ordem legal que geralmente não era cumprida no Brasil. Mas no Rio Grande do Sul a posse das terras já estava provocando tamanha confusão que se tomava necessário providências urgentes. Sobre este assunto, dizia o Vice-rei: "Além de se verificarem as condições com que Sua Majestade concede as sesmarias e ser indispensável que os sesmeiros tenham escravos para cultivar as terras como esta última cláusula não pode deixar de faltar em muitos dos pretendentes por nem terem estes sempre trabalhadores próprios, nem naquele país haver semelhante uso em todas as concessões antigas. Seria muito conveniente que todos aqueles sesmeiros fossem obrigados à proporção das suas sesmarias a conservar nelas aquele número de indivíduos que parecesse necessário a cada uma, regulado conforme os diversos serviços da lavoura e da criação de animais".

   Para o cumprimento dessas finalidades, sugeria o Vice-rei que nenhum requerimento fosse aceito sem que primeiro constasse o número de indivíduos que deviam ficar na gleba. Deveriam ser registrados em livro, no qual deviam constar nomes, local de nascimento e filiação. Por outro lado, esses indivíduos deveriam ser matriculados no livro próprio da provedoria: "A onde se deve obrigar o sesmeiro a conservar os mesmos indivíduos e a continuar também o serviço ou da lavoura ou da criação de animais, para o que lhe foram concedidos e assinalados os terrenos nos seus próprios limites e confrontações".

   O sistema proposto pelo diligente Vice-rei, além de possibilitar maior progresso da lavoura e dos rebanhos, permitia às autoridades um conhecimento perfeito e atualizado da verdadeira situação econômica do Rio Grande. De outro lado, permitia-lhes em caso de urgência resolver com segurança os problemas militares do Continente. Além disso, as sugestões referidas, no contexto da política de fomento ultramarino, tinham em vista promover o giro comercial com a circulação de dinheiro e mercadorias. Se não todas, pelo menos parte das sugestões do Vice-rei foram postas em prática no Rio Grande. Uma delas, de grande alcance, que parece ter sido praticada, foi o tombamento das terras com a respectiva conferência dos títulos de posse. No período de 1784 a 1786, todos os comandantes de distritos fizeram relações de todos os moradores que possuíam terras, bem como dos animais que criavam nelas. Das referidas relações constavam ainda as medidas da sesmaria e também as confrontações. Feito isto, as pessoas que fossem encontradas na posse ilegal de terras, de acordo com o interesse público, seriam despejadas delas."


domingo, 13 de setembro de 2015

As carretas de boi e a importância comercial de Pelotas no século XIX

Trecho extraído de: SOUZA, Bernardino José de. Ciclo dos carros de bois no Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1958.


 "Do Rio Grande do Sul, onde o carro tirado por bois se diz carreta, certo por influência platina, fale o Dr. SEVERINO DE SÁ BRITO em seu precioso volume Trabalhos e Costumes dos Gaúchos. O autor refere-se aos tempos logo após a guerra dos Farrapos (1835- 1845) e escreve: "O comércio do sul da Província dirigia-se para Pelotas que era o entreposto comercial dessa zona. Para lá seguiam carretas em grupos levando os produtos pastoris, couros, lãs, cabelo e voltavam repletas de mercadorias, com viagem redonda de três meses. Também havia um comércio regular para Montevidéu." Historiando a campanha, acrescenta o Dr. SÁ BRITO: "As famílias daquele tempo viajavam em carretilhas de bois, que representavam um pequeno aposento fechado com porta atrás e janelas laterais." Recordando a invasão paraguaia de 1865 nos rumos de São Borja, Itaqui e Uruguaiana, diz o mesmo escritor que, ainda bem na meninice, apreciou o que se passou na estância de seu pai — preparativos de uma retirada com a família em direção ao litoral, para o que se apresentaram na frente da casa os veículos da época — "carretas, carretas, carretilhas, carroças e ao lado a enorme canoa com outras duas menores". (p. 122)


"Por seu turno, F. CONTREIRAS RODRIGUES, escritor e poeta gaúcho, em carta de 17 de agosto de 1943, depois de informar que o uso do jugo domina a região fronteira do sul e sudoeste do estado do Rio Grande do Sul, abaixo de uma linha que, partindo de Pelotas, vai até Uruguaiana, passando por São Gabriel e Alegrete, escreveu: "Os carreteiros dizem que o jugo proporciona um tiro, isto é, a puxada, mais firme." E acrescenta: "o jugo é preso com guascas chatasde três a quatro centímetros de largura sobre o cogote dos bois e enroladas com quatro ou cinco voltas, abarcando o jugo nas duas extremidades e as guampas(chifres) do animal. Assim o animal fica com a cabeça imobilizada. Já vi um estancieiro censurar este sistema do ponto de vista sentimental, achando-o cruel, porque observou que os animais estão sempre rangendo os dentes, produto da dor que sentem. A este sistema de jungir se designa pelo nome de "puxar de cogote"; ao de jungir pela canga se denomina "puxar de encontro", deixando este a cabeça livre. Todavia este sistema há de pisar as tábuas das paletas do animal, determinando menor força na tração." (p. 303)

domingo, 6 de setembro de 2015

Como é fazer faculdade de História (vídeo) - Parte 2


Segundo vídeo  com foco neste assunto do canal Xadrez Verbal no YouTube. Publicamos aqui o primeiro vídeo que aborda sobre o tema no dia 31 de Agosto na postagem a seguir:Como é fazer faculdade de História (vídeo). Vale a pena conferir este vídeo e ou outro. Recomendamos também a inscrição no ótimo canal.

sábado, 5 de setembro de 2015

Companhia Hidráulica Pelotense - Represa Moreira

Fonte da imagem: http://poisonli.blogspot.com.br/2010/12/hidraulica-pelotense-e-pedal-curticeira.html


Trecho extraído de: SILVEIRA, Aline Montagna da. De fontes e aguadeiros à penas d'água: reflexões sobre o sistema de abastecimento de água e as transformações da arquitetura residencial no final do século XIX em Pelotas-RS. São Paulo: Tese de Doutoramento do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da USP (Orientadora: Profa. Dra. Beatriz Mugayar Kühl), 2009, p. 156-158.


"A REPRESA DO MOREIRA 
As obras da represa do arroio Moreira e do encanamento geral e distributivo da cidade foram definidas no contrato firmado entre Hygino Durão e a província. As obras executadas inicialmente consistiram no represamento do arroio, através da execução de uma barreira de retenção de água (com uma bacia de acumulação), e na construção de três tanques destinados ao depósito de água (clarificação), com capacidade para mil metros cúbicos cada. 
A contratação da obra com Durão mostrava avanços em relação aos projetos apresentados anteriormente, como a proposta de Cordeiro e Storry, que previa a construção de uma represa e de três reservatórios na cidade, com capacidade para conter três mil metros cúbicos de água. O plano inicial provavelmente foi alterado levando-se em conta a necessidade de purificação da água pela decantação.
Completavam a obra a rede adutora, o reservatório de ferro, a rede de distribuição e os chafarizes. O sistema fornecia água bruta (in natura), já que a primeira estação de tratamento da cidade foi construída no final da década de 1920. O represamento do arroio foi feito por uma comporta de ferro. As contenções laterais do curso d’água consistiam em muros executados com alvenaria de pedra. 
O viajante Michael Mulhall esteve em Pelotas nesse período e descreveu, em suas percepções sobre a cidade, as obras de abastecimento de água potável. Mulhall destacava que “as ruas são pavimentadas e limpas, e logo que as obras do gás e da água, já iniciadas forem completadas, a cidade terá um aspecto muito respeitável”. Mulhall vai perceber e relatar um dos problemas que há décadas preocupava a Câmara de Vereadores da cidade: a qualidade da água potável. O viajante comentava que “até agora, o mais sério problema tem sido a falta de água pura, pois a única fonte é a água do rio São Gonçalo, retirada um pouco acima das charqueadas, que mesmo assim ainda turvam um pouco o líquido”. Em seu parecer destacava que
 o aqueduto agora em construção tem umas 12 milhas de extensão, trazendo água das colinas que formam um anfiteatro no lado oeste. [...]. O concessionário do suprimento de água é o senhor Durão, que avalia em 50 mil libras esterlinas o custo da obra em execução. O aqueduto consistirá apenas de canos colocados deste ponto até a cidade de Pelotas, a distância sendo declarada invariavelmente entre 12 e 14 milhas. Perto da Cascata, encontramos uns seis homens fazendo cabanas para os trabalhadores encarregados da construção do aqueduto. O capataz [...] espera ele que a água alcance Pelotas em menos de um ano.  
Alguns anos após a passagem de Mulhall as obras já estavam concluídas, e Echague anunciava, em seu relatório de 1876, as novas obras a serem executadas na represa. As obras referiam-se a construção de uma casa para o pessoal responsável pela manutenção da represa e dos tanques e a reposição e reparos dos danos causados pelas águas no terreno contíguo a represa. Ambas foram contratadas por empreitada com Carlos Zanotta.
As obras de manutenção da represa foram uma constante nas administrações posteriores, exigindo intervenções de porte significativo ou, em muitos casos, a conservação dos serviços já executados."   

Companhia Hidráulica Pelotense

Fonte desta imagem: http://www.pelotas.rs.gov.br/sanep/museu-do-saneamento/agua/companhia-hidraulica-pelotense/

Trecho extraído de: SILVEIRA, Aline Montagna da. De fontes e aguadeiros à penas d'água: reflexões sobre o sistema de abastecimento de água e as transformações da arquitetura residencial no final do século XIX em Pelotas-RS. São Paulo: Tese de Doutoramento do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da USP (Orientadora: Profa. Dra. Beatriz Mugayar Kühl), 2009, p. 147-152.


"A COMPANHIA HIDRÁULICA PELOTENSE

O contrato do abastecimento de água potável de Pelotas foi finalmente efetivado em 1871, com o empresário Hygino Corrêa Durão, comerciante da cidade de Rio Grande. Mas a transição para o novo sistema de abastecimento ocorreu lentamente. Ainda no mês de janeiro deste ano a Câmara Municipal previa despesas com a abertura de cacimbas para o abastecimento de água potável na cidade. Nesse período esteve em Pelotas o viajante Augusto de Pinho que, entre suas impressões do local, destacou o abastecimento de água da cidade. O relato do viajante apontava que “a água de que aí se faz uso é da chuva; conduzida dos telhados e das sotéias, há umas cisternas feitas de tijolo e terra romana a que dão o nome de algibes”. Além disso, Pinho comentava a incorporação de uma companhia, com o objetivo de abastecer a cidade com água potável e citava, ainda, a excelente qualidade da água que serviria à cidade. Esse período coincide com o surgimento da Companhia Hidráulica Pelotense. O relatório da Presidência da Província de 1871 registrava que o contrato para o abastecimento de água de Pelotas fora firmado em dez de maio deste ano, com Hygino Corrêa Durão, que apresentou a proposta mais favorável para a execução do serviço. O relato do Presidente destacava que estava definida “a realização de uma das mais urgentes necessidades daquela importante cidade”. O contrato firmado entre o empresário e a província estabelecia as obrigações do contratante, definindo as diretrizes essenciais para a implantação do sistema de abastecimento de água da cidade. 
As especificações estabelecidas no documento indicavam a execução da canalização em tubos de ferro betuminados, desde o arroio Moreira confluente do arroio Fragata, prolongando o encanamento desde o ponto denominado Cachoeira, situado na chácara de D. Arminda da Cunha, até ao interior da cidade de Pelotas e a construir no supramencionado ponto de partida uma represa e os tanques de depósito necessários, com capacidade para conterem três mil metros cúbicos d’água, e na cidade um ou mais reservatórios com igual capacidade. A escolha do manancial, considerando-se a vazão e a pureza da água, apontava para o mesmo curso d’água desde a proposta apresentada por Cordeiro em 1869. A qualidade da água, límpida antes de entrar no encanamento, era outro requisito do contrato e, por isso, indicava-se a construção dos tanques junto à represa. Além disso, no artigo 2o. estabelecia-se que deveriam ser instalados “quatro chafarizes, que, além de seus respectivos repuchos, tenham cada um quatro torneiras ou bornefontaines, com candelabros para o serviço diário e noturno [...] os chafarizes serão de ferro bronzeado e serão em tudo iguais aos desta capital”. Ainda em relação às obras, o documento determinava que poderiam ser arrendados anéis e penas d’água, edificadas casas de banho (sujeitas à inspeção da polícia) e estabelecidos lavadouros públicos. O contrato definia ainda o preço da água a ser comercializada, regulamentando que o valor máximo para o barril de vinte e cinco litros era vinte réis nos chafarizes, e dez réis nos anéis ou penas. Estabelecia, ainda, o fornecimento de água gratuitamente às repartições e aos edifícios públicos provinciais, gerais e municipais, que se responsabilizariam pelas despesas da canalização e da distribuição interna. Os prazos foram rigorosamente estabelecidos no contrato e seu descumprimento acarretaria futuros problemas à companhia. No documento foram firmados os períodos de seis meses para a apresentação do projeto de execução das obras (sujeito à aprovação do governo) e de oito meses para o início das mesmas, ambos a contar da assinatura do contrato. No caso de ocorrer a incorporação da companhia, fixou-se o prazo de três meses, após a aprovação dos estatutos, para a primeira exigência. O documento previa ainda a conclusão das obras da canalização geral e da colocação dos chafarizes em trinta meses. A transferência do serviço ao poder público era indicada na autorização para a desapropriação da empresa, que só poderia ocorrer trinta anos a contar da data de realização das obras. A Hidráulica Pelotense teve dificuldades em cumprir uma série de prazos estabelecidos no contrato firmado entre Hygino Durão e a Presidência da Província. Esses fatores levaram a atrasos recorrentes no pagamento dos juros de 7% ao ano, pagos semestralmente pelo governo, sobre o capital máximo investido de 500:000$000. 

O contrato de Pelotas estipulava a despesa máxima de dez por cento do valor total do contrato (50:000$000) para investimentos preliminares, que compreendiam levantamentos e correção do projeto hidráulico e seus detalhes (situação que gerou diversos problemas em Porto Alegre), montagem de uma comissão para engajar operários e remuneração ao incorporador da companhia. As facilidades que o governo oferecia à implantação do sistema abrangiam as desapropriações e a isenção do pagamento de taxas. Quanto às primeiras, propunhase a realizar as desapropriações necessárias à realização das obras (à custa da empresa) e em relação à segunda oferecia auxílio na obtenção, junto aos poderes públicos, de isenção de direitos de importação sobre os materiais necessários para a realização das obras. O documento determinava que o projeto de execução fosse fiscalizado por um engenheiro indicado pela província, e que o assentamento da canalização de água deveria incluir as ruas principais e mais povoadas da cidade, entre as que terminam na praça Pedro II e no largo da Igreja. Essa delimitação acabou gerando sérios problemas quanto a definição dos locais destinados aos chafarizes. Entretanto, observa-se que, apesar da canalização não contemplar a zona portuária, a empresa instalou um chafariz na praça Domingos Rodrigues, e outro ao sul, além da praça Pedro II. A contratação de licitantes para a implantação de obras públicas foi um fato recorrente no período, assim como a incorporação das companhias e a transferência dos contratos para empresas privadas. Essas transações consistiam em práticas comuns na época, como se percebe na implantação das Hidráulicas Porto-Alegrense, Pelotense e Rio-Grandense (esta última também incorporada por Hygino Durão, em parceira com João Frick). A facilidade e o conhecimento dos trâmites dos processos de licitação junto à Presidência da Província deveriam contribuir para a permanência dos licitantes (empreiteiros) em cargos das empresas incorporadas. É o que se nota nas hidráulicas de Pelotas e Rio Grande, onde Hygino Durão e João Frick assinaram os contratos para executar o abastecimento de água encanada e ambos permaneceram como gerentes das empresas incorporadas. Hygino Durão foi responsável por outras obras no Estado. Em Rio Grande, esteve envolvido nas licitações para as obras no cais, em junho de 1869. Foi possível identificar, ainda, que a ponte sobre o rio Piratini (conhecida como Ponte do Império), contratada com Durão, foi entregue ao trânsito público em vinte e um de novembro de 1870. Sabe-se também que apresentou proposta ao governo provincial para a execução das pontes sobre os rios Camaquã e Arroio Grande. Além disso, identificou-se um projeto de entroncamento entre a estrada de ferro Rio Grande-Bagé e a linha de Porto Alegre-Uruguaiana, que foi mandado executar por Hygino Durão, sob a direção dos engenheiros A. Primrose, Carlos Alberto Morsing e do chefe de escritório João Frick. Esse documento evidencia que, em 1876, ainda mantinha relações de trabalho com Frick e com Primrose (que trabalhou também nas obras das companhias hidráulicas de Rio Grande e de Pelotas). O viajante Mulhall referiu-se a Hygino Durão, relatando que além do abastecimento de água potável, “o mesmo cavalheiro é concessionário da projetada estrada de ferro de Rio Grande a Pelotas (35 milhas) e deverá em breve ir à Inglaterra para tratar desse assunto”. Comentava ainda que, ao visitar as imediações da Cascata, encontrou um engenheiro alemão encarregado dos estudos e da demarcação da rota para o novo aqueduto da cidade. Weimer cita brevemente a atuação de Hygino Corrêa Durão, referindo-se a ele como arquiteto, envolvido somente com projetos viários e de urbanização. A atuação de Hygino nas obras citadas nos leva a supor que se tratasse de um empresário, empreiteiro de obras de construção civil, já que os projetos que encontramos apresentavam a assinatura de outros profissionais, relacionados diretamente à autoria (projeto) e à construção (execução) das obras. Higyno Durão atuou tanto na implantação da Companhia Hidráulica Pelotense como na Rio-Grandense, ambas no mesmo período: seu trabalho como empresário consistia em participar das licitações abertas pela Presidência da Província, assinar o contrato e adquirir os privilégios da execução dos serviços, comprometendo-se em incorporar a companhia, vendendo seus direitos e obrigações. No caso da Companhia Hidráulica Pelotense, Hygino tornou-se gerente da empresa e empreiteiro das obras. Em 1872, como gerente, viajou para a Europa, provavelmente para tratar de seus empreendimentos (o relatório de junho deste ano citava que desde janeiro encontrava-se no exterior e destacava, ainda, que a execução das obras ficaria a cargo de João Frick, seu sócio na implantação da Hidráulica Rio-Grandense). Os jornais de Pelotas da década de 1870 noticiavam os trabalhos de Durão na Hidráulica Pelotense. Não está de todo concluída essa magnífica obra, porque faltam, ainda algumas chapas, que se esperam brevemente, mas pode-se desde já avaliar da sua incontestável e grande importância. Nunca ninguém se persuadiu que o empresário da Hydraulica Pelotense cumprisse tão satisfatoriamente a condição do seu contrato que se referia à construção do depósito d’água, nem tampouco jamais passou pela idéia de alguém que fizesse uma obra tão gigantesca e admirável. Hoje, ante os fatos, é de rigorosa justiça restituir-lhe os créditos que se haviam posto em dúvida e um dever imprescindível encarecer o seu procedimento. Nós, que fomos sempre os primeiros a censurá-lo quando de censura o considerávamos merecedor, queremos também ser os primeiros, por desencargo de consciência e por amor à verdade, a tecer-lhe os louvores de que se tornou digno pela maneira honrosa e mesmo superior a toda expectativa por que desempenhou aquela parte do seu contrato. Em 1877, o relatório da Companhia Hidráulica Pelotense referia-se a uma negociação entre a empresa e a testamentária de Hygino Corrêa Durão, o que indica o seu falecimento provavelmente neste ano. No mesmo período João Frick relatava que na Hidráulica Rio-Grandense “tem continuado a desempenhar os compromissos a que individualmente ficou obrigado pelo falecimento de seu corresponsável nesta obra, o Sr. Hygino Corrêa Durão”. 

A INCORPORAÇÃO DA HIDRÁULICA PELOTENSE 
A primeira diretoria da Companhia Hidráulica Pelotense foi composta por personalidades oriundas de famílias influentes da região: formada por João Simões Lopes (visconde da Graça), Antônio José de Azevedo Machado Filho (filho do barão de Azevedo Machado) e Felisberto Ignácio da Cunha (barão de Correntes), teve como seu presidente o primeiro."  


quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Importante estudo sobre a população da paróquia de São Pedro do Rio Grande



Índios paulistas aldeados entre os primeiros moradores de Rio Grande, juntamente com índios tapes e minuanos do Rio Grande do Sul, constituem os elementos étnicos originais da povoação de São Pedro de Rio Grande, juntamente com a grande leva de casais açorianos e gente vinda do Rio de Janeiro. 

O estudo abaixo é revelador sobre as origens étnicas da região sul do Rio Grande do Sul.

Trecho extraído de: QUEIROZ, Maria Luiza Bertulini. Paróquia de São Pedro do Rio Grande: estudo de história demográfica, 1737-1850. Curitiba: Tese de Doutoramento do Curso de Pós-Graduação em História da UFPR, 1992.


"A PARÓQUIA DE SÃO PEDRO DO RIO GRANDE

Criada por provisão de 6 de agosto de 1736, subordinada ao Bispado do Rio de Janeiro, a Paróquia de S. Pedro do Rio Grande compreendia todo o território que se estendia da margem sul do rio Jacuí ao arroio Chuí, conquistado à Espanha seis meses mais tarde, com a fundação do Presídio e Colônia do Rio Grande de S. Pedro, na margem sul do canal de acesso à Lagoa dos Patos. Sua jurisdição abrangia, então, um imenso vazio demográfico denominado "continente" do Rio Grande.


0 processo de expansão da colonização portuguesa sobre essas terras resultou no natural desmembramento de parcelas de seu território para a criação de novas paróquias; em 1765, a de N. Sra. da Conceição do Estreito, em Í773, a de S. Luis de Mostardas, em Í8Í2, a de S. Francisco de Paula de Pelotas, em 1832, a de N. Sra. da Conceição do Taim, e em 1846, a de N. Sra. da Conceição do Povo Novo.

A sede da paróquia era a colônia do Rio Grande, elevada à condição de vila em 1747, e à categoria de cidade em 1835." (p. 01)


"Em inícios de 1738 começaram a chegar os primeiros povoadores civis de origem luso-brasileira. 0 governo do Rio de Janeiro, a que estava subordinada a colônia, desenvolveu intensa atividade objetivando o seu povoamento, deslocando casais, recrutas e mulheres solteiras, colocando em prática o antigo projeto (1735) de povoar as terras desertas do sul do país com o excesso de população da região das Minas e do Rio.


A ação colonizadora teve por base uma "política de casais", que fixava as Famílias à terra e estimulava os casamentos. Aos casais que se deslocavam para a nova colônia era assegurado um trato de terra, cabeças de gado, ferramentas, alqueires de cal e de sal, grãos, lentilhas e feijões, e eram mantidos com farinha até a primeira colheita.


As mulheres solteiras eram atraídas pelas amplas possibilidades de casamento e pela extensão desses incentivos aos casais formados na colônia; elas representavam a solução para a acomodação do expressivo contingente masculino solteiro aquartelado na fortaleza. Quanto a este, o governador era claro em seus projetos: "o importante é que se casem e se vão arraigando na terra, para o que lhes tenho mandado mulheres e lhes irei mandando mais". Em 1742, tendo oportunidade de avaliar os resultados de sua ação colonizadora, em visita à colônia, pôde observar que "quase todas" as mulheres que mandara do Rio, de "vida livre" e "desimpedidas", haviam tido filhos na colônia.

0 governo incentivou, também, a migração de famílias da Colônia do Sacramento para a do Rio Grande, nesses primeiros anos de povoamento, acenando com a sua posição mais segura e com as maiores possibilidades de acesso à terra. Esses povoadores eram, na maioria, da mesma origem dos que chegavam do Rio, resultando que na década de quarenta a população da colônia foi constituída basicamente por cariocas, mineiros, baianos e paulistas.

Os colonos açorianos começaram a chegar por volta de 1750, e constituíram o maior efetivo desse processo de povoamento. A "grande imigração" açoriana, entre 1750 e 1754, resultou na entrada de 423 casais e 409 pessoas adultas solteiras, que vão participar na formação de 259 novas famílias até abril de Í763. A importância dessa imigração para a sustentação demográfica da colônia, que contava a essa época com cerca de cem famílias, apenas, foi excepcional; os batizados de filhos legítimos da população livre passaram dos 289, registrados nos doze anos transcorridos desde a fundação da colônia, para 1.836, nos treze anos compreendidos entre janeiro de 1750 e abril de 1763, dos quais os açorianos respondem por 74,3%, participando de 77,1% dos casamentos celebrados entre 1756 e abril de 1763." (p. 06-07)

"A matriz indígena da população foi constituída, basicamente, por um grupo de índios procedentes de S. Paulo, e por dois grupos pertencentes aos domínios espanhóis, o Tape e o Minuano.

0 grupo indígena de S. Paulo era formado por 102 pessoas das aldeias de Barueri, Espinheiros, S. Miguel e N. Sra. da Escada, e a sua transferência, a chamada "recondução" de João da Tavora, fora ordenada pela Coroa antes mesmo da fundação da colônia, para o trabalho nas fort ificaçoes. Chegaram em setembro de 1737, por terra, e foram alojados no núcleo da povoação; no ano seguinte respondiam por 4 dos 9 batizados registrados pela população livre.

Os Tapes foram incorporados desde a fundação do presídio, apresados durante as incursões militares aos campos. Ao final da década de 1740, desciam em grandes grupos ao litoral, em busca de sobrevivência, pressionados pela expansão da atividade
tropeira sobre seu território. A entrada dos Minuanos na colônia se dá a partir de setembro de 1749, e decorre dessa mesma circunstância. Para os Tapes foi organizada a Aldeia de N. Sra. da Conceição, e os Minuanos foram aldeados na Estancia Real de Bojuru, ambas à margem esquerda do canal, sob a administração religiosa dos padres jesuítas." (p. 08-09)


"A expansão da colonização sobre os territórios interiores da paróquia resulta na sua divisão em três distritos: o da Vila, que correspondia à região ocupada desde a fundação do presídio até a invasão espanhola, e os do Povo Novo e do Cerro Pelado, com terras ocupadas a partir de 1777.

0 resultado mais significativo dessa expansão foi o surgimento de Oratórios; entre 1794 e 1812 seu número alcança a 29, espalhados por toda a paróquia, onde são celebrados 68,9% dos casamentos registrados nesse período." (p. 19)